Quarta, 24 de Julho de 2024
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Domingo, 21 Julho 2024 14:32

Aos alegados ultraconservadores de Muangai

Adalberto Costa Júnior e Isaías Samakuva deixaram-se fotografar sorridentes e com um aperto de mão, na reunião do Comité Permanente da Comissão Política da Unita, esta terça-feira. A mensagem que se precipita do gesto parece óbvia. Aparentemente, os dois terão optado pela conciliação, após os eventos que destaparam o grave distanciamento entre ambos na última semana.

Foi por iniciativa própria de cada um? Não é de todo improvável? Terão sido aconselhados para essa aproximação? É possível. O gesto encerra uma verdadeira reconciliação? Não é de todo credível. Porquê? Porque os sinais que denunciam o afastamento de Samakuva, face a Adalberto Costa Júnior, são excessivamente profundos para serem resolvidos com um simples aperto de mão. Basta revisitarmos os factos mais densos que se tornaram públicos em apenas uma semana.

 Samakuva abriu as hostilidades com uma campanha em vários órgãos de comunicação social a contestar vivamente o caminho pelo qual Adalberto Costa Júnior conduz ‘os maninhos’. Criticou os dividendos para a Unita subtraídos da Frente Patriótica Unida; avaliou a actual liderança como sendo incapaz de capitalizar o cansaço dos angolanos e apear o MPLA do poder; acusou dirigentes da Unita de promoverem campanhas de difamação contra si; elogiou a sua relação de amizade com João Lourenço e, por fim, não descartou a hipótese de concorrer novamente à liderança da Unita.

Mais um detalhe não menos relevante: a primeira vez em que Samakuva decidiu sair à rua para lançar pesadas críticas à liderança da Unita não foi um dia qualquer. Foi justamente no dia em que Adalberto Costa Júnior juntou os rostos da Frente Patriótica Unida para, mais uma vez, denunciar o Estado autoritário e o caos económico e social para o qual João Lourenço arrastou o país.

Ainda sobre os factos, após o rodízio de entrevistas de Samakuva, vieram as respostas da Unita. Primeiro, Adalberto Costa Júnior classificou as declarações do seu antecessor como sendo "estranhas" e avisou que a Fundação Jonas Malheiro Savimbi (FJMS) não devia servir como arma de arremesso contra a Unita. Depois, mais profundo, o secretário-geral da Unita, Álvaro Daniel, denunciou que Samakuva não participava das reuniões da Comissão Política e do Comité Permanente para dar a conhecer os passos de materialização da Fundação cuja ideia nasceu no partido. E foi mais longe.

Álvaro Daniel revelou que alguns subscritores da Fundação respondem a processos disciplinares internos, enquanto outros tantos são pessoas expulsas do partido. Agora sob o comando de Samakuva na FJMS, segundo Álvaro Daniel, trata-se de indivíduos que não só intenta- ram um processo que conduziu à anulação do Congresso de 2019 da Unita, como apelaram ao voto con- tra o partido nas eleições de 2022.

Naturalmente, tudo isso revela discordâncias profundas que, mais uma vez, não se resolvem com um aperto de mão e uma troca de sor- risos entre Adalberto e Samakuva. Sendo a única alternativa realista de alternância do poder, a Unita terá de fazer mais para provar que percebe profundamente o que a sociedade espera dela. Os ressen- timentos e as ambições pessoais de Samakuva valem zero nas cau- sas de fundo que movem hoje os angolanos. E a Unita, por muita importância que tenha, é apenas um instrumento com o qual os angolanos contam para as trans- formações que se impõem.

Vamos dizê-lo de outra forma mais clara e directa. O que o país persegue hoje vale muito mais do que a soma de todas as partes de cada angolano, de cada partido. Se a democratização e a instauração de um verdadeiro Estado de Direito exigirem, como sacrifício, a perda da identidade da Unita, Angola ficará necessariamente agradecida. É isso o que Samakuva e os supos- tos ultraconservadores de Muan- gai têm de perceber. Valor Económico

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