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Sábado, 20 Junho 2020 21:16

Portugal: Casa de Isabel dos Santos e carros de luxo entre os 68 alvos da PJ

A Polícia Judiciária de Portugal já confiscou mais de 300 milhões de euros que acredita pertencerem a Isabel dos Santos. As buscas levadas a cabo esta semana abrangeram também outras sociedades que a investigação considera serem património da esfera da empresária angolana.

São oito processos autónomos em que se investigam crimes de branqueamento de capitais através do Eurobic. O ponto de partida é o dinheiro do Estado angolano alegadamente colocado em contas nacionais tituladas por várias entidades controladas por familiares de José Eduardo dos Santos e para seu benefício pessoal. É esta a informação, a que a TVI teve acesso, que sustenta as 68 buscas levadas a cabo pela Unidade Nacional de Combate à Corrupção da Polícia Judiciária (PJ) entre quarta e quinta-feira.

Os visados são o casal Isabel dos Santos, filha do ex-presidente de Angola, e o marido Sindika Dokolo, a quem a investigação portuguesa já congelou mais de 300 milhões de euros que circulavam em contas nacionais, além do arresto de um vasto património. Nesta última operação, procurava-se documentação bancária e contabilística, agendas, notas pessoais e de pagamentos, computadores, ipads, tablets, pens e cópias de emails.

O objetivo era apreender estes objetos e eventuais indícios que consolidem as provas de que a família Dos Santos lava grande parte da sua fortuna, alegadamente obtida de forma ilícita, no nosso país. A PJ avançou assim do Porto ao Algarve, tendo feito buscas numa casa de luxo na Quinta do Lago, que se presume ser do casal. Sindika Dokolo, que tal como Isabel dos Santos está fora do país, foi também alvo de buscas num edifício de 11 andares que detém em Rio de Mouro, concelho de Sintra, tal como no interior de um Porsche Panamera que ali tem estacionado.

O processo refere cerca de 40 entidades alegadamente relacionadas com Sindika. Sociedades que a PJ acredita serem veículos utilitários ao branqueamento de capitais.

Foi alvo de buscas a advogada Raquel Lourenço, com escritório no número 190 da Avenida da Liberdade, o mesmo edifício onde têm sede as sociedades H33 e Fidequity, geridas por Vasco Pires Rites e Nuno Moreira Frutuoso, que pertencem à família Dos Santos. Os dois gestores foram alvo de buscas nas suas casas, no Porto, assim como nos seus carros de luxo - um Mercedes CLS, um BMW Série 5 e um Range Rover. Muitas outras sociedades foram visitadas pelos inspetores, nas 68 buscas, sobretudo no Porto, assim como cofres bancários numa agência do Novo Banco naquela cidade.

Quanto a protagonistas, entre outras pessoas, a PJ avançou para as casas e escritórios de três que são próximos de Isabel dos Santos: Mário Leite Silva, presidente da Fidequity e diretor da Grisogono, que até o seu Porsche Boxster viu ser vasculhado, o advogado Jorge Brito Pereira e Paula Oliveira, amiga da empresária angolana.

Os crimes precedentes para as suspeitas de branqueamento de capitais estão em Angola, que colabora na participação de crimes como corrupção ou peculato, e, nos processos que estão a ser acompanhados pelo juiz Carlos Alexandre. Os próximos passos da investigação podem implicar a emissão de mandados de captura internacionais.

Desvio para o Dubai é peça-chave para o Ministério Público de Portugal

Dos vários inquéritos-crime abertos sobre Isabel dos Santos, o mais importante é sobre as transferências de mais de 100 milhões de dólares da Sonangol em 2017 para a Matter, no Dubai

A história principal dos Luanda Leaks revelada pelo Expresso e pela SIC a 19 de janeiro de 2020, em parceria com o ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação), converteu-se no maior da meia dúzia de inquéritos-crimes entretanto abertos pelo Ministério Público (MP) em Portugal sobre o universo de Isabel dos Santos.

O processo-crime relacionado com o desvio de mais de 100 milhões de dólares da Sonangol para uma companhia offshore no Dubai, a Matter Business Solutions, quando a filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos estava à frente da petrolífera estatal angolana, tornou-se a peça-chave das investigações judiciais em Portugal, estando em causa um conjunto alargado de crimes: branqueamento de capitais, burla qualificada, falsificação de documentos, peculato e abuso de confiança.

Estão em causa crimes de peculato, branqueamento, burla, falsificação de documentos e abuso de confiança

Segundo o que o Expresso apurou, a equipa do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) coordenada pelo procurador Jorge Rosário Teixeira, a quem os inquéritos-crimes foram distribuídos, tem investido nas suas linhas próprias de investigação, com o objetivo de ir além de uma mera resposta ao pedido de cooperação judiciário apresentado em janeiro pelo procurador-geral da República angolano. Isso foi reforçado pela colaboração oferecida às autoridades portugueses por Rui Pinto, o whistleblower detrás da fuga de informação do Luanda Leaks.

A relevância para Portugal do caso sobre a transferência de dinheiros públicos angolanos para o Dubai em 2017 tem a ver com o facto dos alegados crimes terem um envolvimento grande por parte de suspeitos portugueses que são muito próximos de Isabel dos Santos: o seu principal gestor de negócios, Mário Leite da Silva; o seu principal advogado, Jorge Brito Pereira; e uma amiga e sócia em vários negócios, Paula Oliveira. Além destes, há ainda um quarto português sob suspeita: Sarju Raikundalia, que foi administrador financeiro da Sonangol e quem assinou, com Isabel dos Santos, as ordens de transferência para o Dubai. Todos eles foram alvo de uma operação alargada de buscas feita esta semana pelo DCIAP e pela Polícia Judiciária.

O Mistério Burgate

Um dos locais que foram vasculhados pelas autoridades durante os dois dias de buscas foi uma propriedade de três milhões de euros no resort de luxo da Quinta do Lago, no Algarve, que já tinha sido identificada pelo Expresso em 2017 durante o Malta Files, um projeto de investigação do EIC (European Investigative Collaborations), como sendo de Isabel dos Santos. Atualmente, essa propriedade aparece ligada à mulher de Mário Leite da Silva, Paula Leite da Silva. A casa é detida através de uma companhia registada originalmente em Delaware, a Burgate Properties, que por sua vez é controlada por uma companhia em Malta, a Soho Global Management Solutions, que tem como beneficiário efetivo Paula Leite da Silva.

Mas nem sempre foi assim. Durante anos, a casa da Quinta do Lago esteve escondida na mesma estrutura complexa que foi montada para esconder o património pessoal de Isabel dos Santos. A propriedade, com uma área de 1845 metros quadrados, está desabitada e o DCIAP não afasta a hipótese de pertencer na verdade à empresária angolana.

O caso Burgate faz parte de um dos inquéritos-crime em curso, sobre investimentos imobiliários. Quando o Expresso revelou em junho de 2017, no âmbito do projeto Malta Files, o universo de empresas em Malta usadas pela filha de José Eduardo dos Santos, a Soho Global era controlada por uma outra companhia maltesa, a Piccadilly Holdings, cuja dona era uma sociedade portuguesa, a Odyssey Investments SGPS. Esta última empresa foi criada em 2010 e na escritura de constituição houve cinco advogados do escritório da PLJM que se declararam como seus acionistas, com um deles a surgir com 99,9% do capital social: o principal advogado de Isabel dos Santos. Brito Pereira já tinha sido confrontado com estes factos em 2017, mas questionado novamente pelo Expresso esta semana, o advogado negou que alguma vez tenha sido dono da Odyssey, da Burgate ou da casa da Quinta do Lago.

Brito Pereira, que segundo fontes próximas da investigação judicial, já foi constituído arguido pelo DCIAP, tinha uma procuração com plenos poderes para movimentar as contas bancárias no Dubai. De acordo com o Luanda Leaks, foi o advogado e Leite da Silva que criaram a Matter, para onde foram transferidos os mais 100 milhões de dólares, com uma parte desse dinheiro a sair de uma conta da Sonangol no Eurobic, em Lisboa. e um Porsche Panamera que ali tem estacionado. TVI24 / Expresso

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