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Sábado, 01 Fevereiro 2020 23:42

EuroBic protege Isabel dos Santos e marido de investigação reforçada

Banco não identificou angolana e Sindika Dokolo como Pessoas Politicamente Expostas (PEP), em 2015, nos termos da legislação.

O EuroBic não considerou Isabel dos Santos e Sindika Dokolo, seu marido, como Pessoas Politicamente Expostas (PEP). Por serem filha e genro do então presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, o banco tinha de considerar o casal como PEP e sujeitar as suas operações a mecanismos de controlo mais apertados, como determina a lei da prevenção e combate ao branqueamento de capitais. O que não aconteceu, segundo o relatório da inspeção do Banco de Portugal (BdP) ao EuroBic em 2015. Em resposta a questões do CM, o EuroBic escusou comentar pessoas ou casos e garantiu que, "neste momento, todas as PEP são cuidadosamente identificadas."

O relatório da inspeção do BdP ao EuroBic, no âmbito da prevenção do branqueamento de capitais, refere que "foram identificados vários casos de pessoas politicamente expostas que não eram consideradas como tendo essa qualidade perante a instituição, impossibilitando assim que a mesma cumprisse com as exigências legais impostas pelo artigo 37 do Aviso nº 5/2013 [do BdP]." E indica os exemplos de PEP nessa situação: "Sindika Dokolo, João Santos Lino, Ana Conceição dos Santos, António Pitra Costa Neto e Isabel dos Santos."

Ao que o CM apurou, estes eram os nomes mais sonantes de uma lista enorme de PEP que, na altura da inspeção do BdP, não estavam identificadas nessa qualidade pelo EuroBic. Por essa via, as operações financeiras dessas pessoas com relações próximas a políticos ou gestores públicos, por exemplo, escaparam ao controlo reforçado no âmbito das regras de prevenção e combate ao branqueamento de capitais.

O documento do BdP sublinha ainda que o EuroBic "não acionou mecanismos de diligência reforçada no decurso da relação de negócio em 87,5% (14/16) dos casos considerados como elegíveis a tal". Nestes casos, acrescenta o relatório do BdP, "a análise foi efetuada pela equipa de inspeção tendo em conta apenas os clientes que, sem margem de dúvida, se encontram sujeitos a diligência reforçada por serem PEP ou por serem provenientes de uma jurisdição de risco elevado, dado o Bic não atribuir um perfil de risco aos clientes."

A inspeção do BdP ao EuroBic foi realizada em 2015. Nessa altura, o EuroBic tinha como presidente-executivo Luís Mira Amaral. Desde 2016, o presidente-executivo desse banco é Fernando Teixeira dos Santos, ex-ministro das Finanças.

Como consequência dessa inspeção ao EuroBic, o BdP emitiu 52 determinações específicas e recomendações a esse banco, uma das quais relativa ao cumprimento das regras relacionadas com os PEP. Ao que o Correio da Manhã apurou, o EuroBic já cumpriu quase todas essas determinações, inclusive a específica para os PEP.

Quanto às deficiências detetadas pelo BdP ao nível do controlo do branqueamento de capitais, o EuroBic respondeu: "Quase todas as deficiências estão corrigidas e, com o apoio do BdP, estamos a corrigir os poucos pontos ainda não concluídos." E acrescentou: "O compliance [gabinete responsável por fazer cumprir a lei em matéria de branqueamento de capitais] foi dotado de ferramentas informáticas adequadas e o quadro de pessoal, devidamente formado, passou a ser de mais de 20 pessoas - o que compara com sete à altura —, estando em fase de formação mais nove."

O EuroBic recorda ainda que na altura da inspeção do BdP, em 2015, estava em fase de reestruturação.

Inspeção ditou afastamento da empresária
Isabel dos Santos saiu do conselho de administração do Banco EuroBic, em 2016, por força da inspeção sobre branqueamento de capitais que o Banco de Portugal fez àquele banco, em 2015. Os resultados dessa inspeção do BdP ditaram também o afastamento dos então administradores Jaime Pereira e Carlos Traguelho.

No centro da saída da empresária angolana e dos restantes gestores da administração do EuroBic esteve a avaliação muito crítica do BdP sobre o cumprimento das regras de prevenção e combate ao branqueamento de capitais.

Mandatos não renovados
O próprio BdP, em resposta a questões do CM, esclareceu que "já depois da inspeção em causa [ao EuroBic, em 2015] e no que respeita à composição dos conselhos de administração e de supervisão do EuroBic para o mandato 2016/2019, verificou-se uma significativa diminuição do número de membros relacionados com os acionistas qualificados do EuroBic e um aumento significativo dos membros independentes." E adiantou o BdP: "Com efeito, o mandato de diversos membros do conselho de administração com ligações aos acionistas qualificados não foi renovado em 2016, como é o caso da engenheira Isabel dos Santos."

Depois da inspeção realizada em 2015, o BdP acompanhou de forma progressiva a implementação das suas determinações, resultantes dessa inspeção, no EuroBic. O objetivo era verificar se o banco cumpria as exigências em matéria de normas relativas ao branqueamento de capitais. Em outubro de 2019, antes de surgir o Luanda Leaks, o BdP iniciou uma nova inspeção ao EuroBic para avaliar como foram implementadas as determinações que resultaram da inspeção de 2015.

Teles recebeu 26 milhões de Angola
Fernando Teles, um dos principais acionistas do EuroBic, recebeu 26 milhões de dólares de Angola (23,6 milhões de euros, ao câmbio atual), no prazo de seis meses. As transferências de Angola, de que Teles é um exemplo, mereceram reparos no relatório de inspeção do BdP.

PORMENORES
Determinação específica
Na inspeção de 2015, o BdP emitiu uma determinação específica ao EuroBic em matéria de PEP: "Criar procedimentos que garantam a não movimentação de contas subsequente ao depósito inicial, sem que tenha previamente ocorrido uma filtragem contra listas de PEP."

Garantir mais controlo
A determinação específica em matéria de PEP tinha por objetivo "possibilitar a execução de medidas de diligência reforçada aquando do estabelecimento da relação do negócio".

Operações com o Dubai
O EuroBic vai entregar ao BdP a documentação sobre as transferências de 57 milhões de dólares da conta da Sonangol, em Lisboa, para a conta da Matter, no Dubai, em novembro de 2017. Nessa altura, Isabel dos Santos estava de saída da Sonangol.

Isabel vende EuroBic
Na sequência do Luanda Leaks, Isabel dos Santos pôs à venda a participação de 42,5% que tem no EuroBic. Já existem vários interessados em comprar.  

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