Sábado, 02 de Agosto de 2025
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Sexta, 01 Agosto 2025 14:58

ONG angolanas criticam “atuação desproporcional” da polícia e pedem responsabilização

Defensores dos direitos humanos em Angola criticaram hoje os “excessos” e a “atuação desproporcional” da polícia contra “pessoas indefesas”, nos tumultos em Luanda, pediram responsabilização criminal dos agentes pelas mortes e condenaram as declarações do comandante-geral.

“Em relação à atuação da polícia nacional, não restam dúvidas de que houve uso excessivo da força que resultou no assassinato até de pessoas indefesas. As autoridades precisam de entender que as expressões legítimas que relatam a indignação da população não devem ser transformadas em argumento para a polícia assassinar pessoas indefesas”, disse hoje o presidente da Associação Mãos Livres, Guilherme Neves.

Em declarações à Lusa, o líder das Mãos Livres, organização não-governamental angolana promotora dos direitos humanos, disse que o que aconteceu entre segunda e quarta-feira, em Luanda e noutras províncias angolanas, foi uma “violação grave do direito à vida”.

“É obrigação do Estado respeitar e proteger a vida da pessoa humana, que é um bem maior e inviolável, protegido nos termos da Constituição angolana e na Declaração Universal dos Direitos Humanos”, referiu.

Pelo menos 30 pessoas morreram e 277 ficaram feridas em consequência dos tumultos registados em Luanda, Benguela, Icolo e Bengo, Bengo, Huíla, Malanje, Huambo e Lunda Norte, entre segunda e quarta-feira, após a greve convocada por taxistas, anunciaram as autoridades policiais.

O Comandante-Geral da Polícia Nacional angolana, Francisco da Silva, confirmou na quinta-feira que a mulher que fugia com o filho durante os tumultos, no bairro da CAOP B, município de Viana em Luanda, foi morta pelas autoridades, alegando que foi necessário garantir a integridade física dos agentes.

Francisco Silva salientou que a mulher, Silvi Mubiala, estaria em situação migratória ilegal e participava nas pilhagens, frisando que a polícia utilizou meios proporcionais para garantir a integridade física dos agentes, “em primeira instância, e repor a ordem” no país.

Para o jurista Hermenegildo Teotónio, membro da KUTAKESA – Movimento de Defensores dos Direitos Humanos em Angola – as declarações do comandante-geral da polícia angolana sobre a mulher morta em Viana apenas provam "quão maléfica" tem sido a polícia angolana.

“Uma justificação como essa só prova o quão maléfico tem sido a nossa polícia, que não está para pôr ordem, não está para garantir a liberdade do cidadão, não está para garantir o direito à vida e a integridade dos cidadãos”, referiu o advogado, salientando que Silvi Mubiala foi alvejada pelas costas.

Teotónio lamentou e reprovou episódios de vandalismos, pilhagens e aproveitamentos no decurso da greve dos taxistas, referindo, no entanto, que a polícia teve uma atuação excessiva por ter, alegadamente, recebido ordem para atirar contra a população.

“E essa informação tem de der passada. A verdade é que a polícia nacional está a usar excessos, foram dadas ordens aos agentes para atirar a matar à população.

Então, todo e qualquer cidadão que se encontrasse nas imediações de uma loja era dada ordem para alvejar”, disse ainda. Falando à Lusa, o também defensor do ativista Serrote José Oliveira “General Nila”, detido “arbitrariamente e alvejado numa das pernas pela polícia”, por alegado envolvimento nas cenas de vandalismo, pediu “responsabilização criminal” da polícia pelas mortes e outros danos contra os cidadãos indefesos.

Rafael Morais, presidente da Associação Cívica UYELE, também condenou a “atuação desproporcional” da polícia durante os protestos: “É claro que não foi boa [a postura da polícia], porque foi desproporcional, uma vez que estavam a enfrentar pessoas desarmadas e que não constituíam ameaça”.

A polícia “não deveria usar balas reais para poder afugentar as pessoas. O que aconteceu foi consequência, exatamente, de um silêncio das próprias autoridades, tendo em conta a situação da fome em que o povo angolano se encontra, principalmente a juventude”, apontou.

O líder da UYELE considerou, por outro lado, que “não colhem” os argumentos do comandante-geral da polícia sobre a utilização de meios proporcionais, quando, observou, os cidadãos, a exemplo da mulher baleada em Viana, “estavam desarmados e não constituíam perigo”.

“A sociedade civil vem alertando o Governo, há bastante tempo, muitos artigos foram escritos a classificar Luanda ou Angola como um barril de pólvora que poderia explodir, tendo em conta a situação social que o povo vive”, concluiu Rafael Morais.

Guilherme Neves disse ainda que combater a instabilidade social “não se faz com uso da força de armas”, mas sim com o “fortalecimento da proteção social, na garantia e proteção de empregos e renda mínima, bem como na segurança alimentar, pois que a fome não espera”.

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