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Segunda, 17 Fevereiro 2025 11:35

O dilema da livre circulação de pessoas sem visto em Estados africanos

A proposta de remoção de barreiras à livre circulação de pessoas na África é um sem dúvida passo crucial para a continuidade do processo de integração regional que tem sido adiado por muitos anos, mas enfrenta desafios estruturais e políticos significativos que podem comprometer sua efectivação.

Primeiramente, há que se levar em conta a questão da soberania nacional e segurança. Já é rotineiro a crença de que muitos Estados africanos temem que a abertura das fronteiras possa intensificar problemas como imigração irregular, tráfico de pessoas e circulação de grupos armados, o que tem sido comum no continente mesmo com as fronteiras fechadas. Não é nenhuma novidade a problemática da instabilidade continuidade em regiões como o Sahel e o Chifre da África, onde de facto a insegurança transfronteiriça tem sido frequentemente apontado como um factor que leva governos a resistirem a políticas de livre circulação, uma vez que tal política pode garantir a travessia desses eventos de forma tranquilo aos quatro cantos do continente.

Grupos extremistas como Boko Haram, Al-Shabaab e filiais do Estado Islâmico têm operações em várias regiões africanas, aproveitando-se da porosidade das fronteiras para se deslocarem e recrutarem novos membros

Essa realidade deve ser refletida de forma muito séria antes que se implemente uma utopia idealista em vestes materiais. Logo, acredita-se que o continente não esteja preparado para tal iniciativa

Além disso, existe um desnível econômico significativo entre os países africanos. Na ausência de políticas de harmonização econômica que na verdade deveria ser um dos pilares primários a ser conquistado no quadro da integração continental, países com economias mais robustas podem recear um fluxo descontrolado de migrantes em busca de melhores condições de vida, o que pode eventualmente acabar por gerar elevadas tensões sociais e políticas internas, tal como tem sido visto nos últimos anos no Interior da própria União Europeia.

Apesar dos laços históricos e culturais compartilhados entre várias regiões do continente, devemos reconhecer sem receios que as tensões entre diferentes grupos étnicos e nacionais ainda são elementos que persistem de forma estrutural. Por exemplo, a xenofobia tem sido uma questão preocupante em diversos países, onde migrantes são vistos como concorrentes por empregos e recursos escassos. E isto tem se refletido em diversos episódios de violência contra os estrangeiros, como os ataques a migrantes africanos na África do Sul. Tais eventos ilustram como essas questões podem minar os esforços de integração.

Outro obstáculo relevante é a burocracia e a falta de vontade política que rotineiramente tem sido assistido nos Estados Africanos sobre questões diversas que afectam o continente. Muitos países ainda operam sob sistemas administrativos ineficientes, onde a remoção de barreiras ao visto pode ser vista como uma ameaça ao controle estatal. Além disso, governos podem resistir por receio de perda de receita gerada pelos vistos e taxas alfandegárias.

Temos também a questão do déficit de infraestrutura a nível do próprio continente que pode dificultar a mobilidade no Intra-continental. A integração por si requer grandes investimentos em transporte, tecnologia de controle migratório e coordenação entre diferentes sistemas nacionais, algo que exige comprometimento e cooperação entre Estados muitas vezes divididos por interesses geopolíticos distintos.

Portanto há que uma necessidade de reconhecermos que a efectivação dessa medida dependerá não apenas de boa vontade política dos Estados Africanos, mas de um esforço coordenado para equilibrar interesses nacionais e regionais, garantindo segurança, estabilidade econômica e uma infraestrutura adequada para a livre circulação. Juvenal Quicassa

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