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Sábado, 07 Abril 2018 11:03

A PGR e o antes e depois no combate à impunidade

Filomeno Manaças antigo director adjunto do Jornal de Angola Filomeno Manaças antigo director adjunto do Jornal de Angola

Agora que assentou a poeira em torno das falhas da Procuradoria-Geral da República na notificação de arguidos envolvidos em processos-crime com fortes indícios de visarem defraudar o Estado angolano em avultadas somas em dinheiro, agora que os ânimos parecem estar mais serenados, afigura-se apropriado voltar à vaca fria em relação ao assunto.

Por Filomeno Manaças

De tanto não estarmos habituados a que figuras com notoriedade pública fossem constituídas arguidas, nalguns círculos transpareceu mesmo a ideia de que era uma heresia o que estava a acontecer, de que se estava a violar o segredo de justiça. Não faltou quem olhasse para as falhas na notificação como um motivo suficiente para conduzir ao arquivamento dos processos. Diga-se de passagem que foram, esses raciocínios, interessantes de seguir, mas ao mesmo tempo contrários aos princípios do direito processual penal. E um desses princípios, que é nuclear, tem a ver com a procura da verdade material e objectiva, afinal o seu propósito cimeiro.

No calor das discussões muitas das intervenções desviaram-se do cerne da questão. E o cerne do problema tem a ver com o combate à corrupção, à impunidade e ao nepotismo.

É óbvio que as falhas nas diligências na formação do corpo de delito deviam e são de evitar. Todavia não é razoável e é contra o bom senso tratar essas falhas, oportunamente assumidas pelo Procurador-Geral da República (ipso facto aceite o princípio da correcção), como se elas tivessem a dimensão da eventual monumental fraude financeira que o Estado provavelmente poderia vir a sofrer. Durante a cerimónia de abertura do ano judicial, a 13 de Março, o Presidente João Lourenço tratou de reafirmar que “o combate à corrupção e à impunidade em Angola é um caminho a seguir sem recuo, quer pelos servidores públicos quer pela sociedade em geral”.

O Presidente da República fez questão de sublinhar que encara o sistema de justiça como uma cadeia de instituições que concorrem para a prevenção, a educação e o combate aos crimes de natureza económica e conexos. E não deixou de realçar o papel que a acção da justiça, se for célere, imparcial e eficaz, pode ter na moralização do sistema social, político e económico, por forma a combater com firmeza a corrupção, a impunidade e o nepotismo, que têm não só causado elevados prejuízos ao povo, mas têm também contribuído para agravar a imagem de Angola no exterior.

Diante dos reiterados pronunciamentos do Chefe de Estado para que os servidores públicos estabeleçam um virar de página no paradigma da criação de riqueza pessoal, outra actuação não seria de esperar do Ministério Público.

Falhas à parte na fase de instrução e constituição dos arguidos, a intervenção da Procuradoria-Geral da República marca claramente um antes e depois. Já em relação ao segredo de justiça, só haveria violação se a PGR fosse para além do estrito dever de informar. Atendendo à notoriedade pública das pessoas envolvidas nos processos-crime, dar parte à sociedade de que foram constituídos arguidos é sempre o mínimo recomendável. E foi isso o que aconteceu e nada mais.

Reza a doutrina que só na fase da audiência de discussão e julgamento (em tribunal, portanto) pode ter lugar a divulgação massiva pela media dos factos e outros elementos relacionados com os processos-crime. É o chamado campo da aplicação do princípio da publicidade. Tanto quanto é bom desfazer aqui o equívoco de que a PGR esteja contra os generais, também é importante referir que quer o arguido quer o réu não são, à partida, pessoas já condenadas pelo tribunal, embora racaia sobre as mesmas fortes suspeitas de terem incorrido em infracção penal.

Num outro ângulo de abordagem impõe-se dizer que o MPLA não tem outra escolha senão dar um combate sério à corrupção, sob pena de, não o fazendo, perder o estatuto de “locomotiva” das transformações político-económicas que o país tem vindo a conhecer ao longo dos anos e, consequentemente, o espaço de força política maioritária, que pode bem ser aproveitado por outras formações partidárias.

A luta contra a corrupção é um combate político que exige reformas profundas. E nesse combate não pode haver meias vitórias. Ou há um engajamento sério e inequívoco e se inaugura realmente um novo ciclo político de combate permanente à práticas que no passado conduziram o Estado à falência em que hoje nos encontramos, ou veremos cair em saco roto as promessas de construir uma nova realidade para o país. JA

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