O Serviço de Migração e Estrangeiros (SME) de Angola refuta as acusações, enquanto um funcionário da Imigração da RDC diz ter havido conversas sobre dezenas de estupros em ambos os lados da fronteira.
A Organização Internacional de Migração (OIM), agência da ONU, diz desconhecer os números da mais recente deportação por parte das autoridades angolanas, mas cerca de 12 mil trabalhadores passaram pela fronteira perto da cidade congolesa de Kamako nos últimos seis meses.
Um relatório preliminar da OIM, a que a agência de notícias Reuters teve acesso, indica que “meninas e mulheres são presas onde quer que estejam, sem as necessidades necessárias, detidas e depois separadas de seus filhos e maridos, submetidas a tratamentos desumanos e degradantes, às vezes estupradas”.
O documento não especifica quantos casos de abusos foram registados, mas um médico em Kamoko citado revela que as clínicas da região registaram 122 casos de violações sexuais neste ano e, pelo menos, 14 deles foram cometidos pelas forças de segurança angolanas.
“São mulheres ou raparigas expulsas de Angola, algumas delas com menos de 10 anos, sem meios de subsistência e muito vulneráveis a este tipo de violência”, revela aquele medico, lembrando que "casos de estupro colectivo causaram complicações médicas".
Angola nega violações
A agência acrescenta que um médico que trabalha na região responsabilizou civis da RDC e forças de segurança de Angola pelos abusos.
O porta-voz do Serviço de Migração e Estrangeiros (SME) de Angola, Simão Milagres, reconhece ter havido um aumento de expulsões nas últimas semanas, mas nega que estupros e outros abusos tenham ocorrido.
"Isso não é verdade, posso garantir que não existe uma atitude institucional que promova a violência contra os migrantes”, assegura Milagres, citado pela Reuters.
Um funcionário de Imigração da RDC que falou à Reuters sob condição de anonimato por não estar autorizado a prestar declarações à imprensa, afirma que nas reuniões as autoridades falaram sobre dezenas de estupros em ambos os lados da fronteira.
Por seu lado, o governador da região de Kasai, no sul da RDC, Dieudonne Pieme Tutokot, diz estar ciente dos casos de estupro e que, por isso, abriu uma investigação.
Procura por diamantes
A região de Lunda Norde, em Angola, rica em diamantes, atrai há muito tempo milhares de trabalhadores migrantes da região Sul, isolada e pobre, da RDC.
Muitos viajam para lá ilegalmente, como mostra o relatório da ONU ao indicar que apenas 20% dos deportados tinham autorização para trabalhar.
Kamako tornou-se um "campo de migrantes ao ar livre", diz o chefe da missão da OIM na RDC, Fabien Sambussy.
Por seu lado, Trudon Keshilemba, presidente de um grupo de organizações da sociedade civil em Kamako, afirma que os congoleses acabam por ocupar aldeias inteiras em Angola e os angolanos sentem que vão desaparecer”.
A propósito, o porta-voz SME, Simão Milagres, explica que a repressão a trabalhadores ilegais ocorre quando o Luanda procura promover a migração legal através de um processo de solicitação de visto online.
Deportações em massa de congoleses de Angola têm acontecido de tempos em tempos.
A maior, em 2018, levou à expulsão de 330 mil trabalhadores.
Antes, a ONU estimou que ao longo de dois meses em 2010 mais de 650 pessoas sofreram violência sexual durante as expulsões de Angola.
O funcionário de Imigração da RDC, que falou sob anonimato, conclui que "estamos a testemunhar isso sem poder fazer nada por falta de recursos". VOA