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Sexta, 22 Mai 2020 00:24

Caso Aenergy: Justiça angolana sonega provas apresentadas pelo Tribunal Federal de Nova Iorque

O Tribunal Supremo tem em sua posse, desde Janeiro do corrente, um conjunto de documentos que uma instância judicial federal norte-americana enviou como “provas adicionais” ao propalado processo do arresto de turbinas, numa altura em que a empresa visada, a Aenergy, apresentou uma nova queixa nos Estados Unidos por ter sido “gravemente espoliada nos seus direitos” e sido “objecto de uma campanha difamatória orquestrada”.

Fontes bem posicionadas junto do Tribunal Supremo falam numa alegada tentativa de “sonegação da informação” que foi entregue àquela instância judicial, na ressaca da acção do Tribunal Provincial de Luanda que ditou, em Dezembro de 2019, o arresto de quatro turbinas, no âmbito da rescisão unilateral do contrato por parte do Ministério da Energia e Águas (MINEA) com a Aenergy.

Ao cabo de cinco meses, quer o Tribunal Supremo (TS), quer a Procuradoria-Geral da República (PGR), não esboçaram qualquer iniciativa de notificar as partes envolvidas no processo, ficando-se com a impressão de que todos os documentos e informações tidas como relevantes estejam a ser “deliberadamente ignorados”.

A contenta em território americano

Depois de ter conseguido que o Tribunal Federal de Nova Iorque exigisse a General Electric a entrega de todos os documentos e informações relevantes para o esclarecimento da aquisição das quatro turbinas arrestadas pela Procuradoria-Geral da República, em Dezembro de 2019, a Aenergy voltou, no princípio deste mês, a emitir um sinal indicativo de que não pretende “baixar a guarda” e provar de que lado está a verdade, no âmbito da contenta judicial que a opõe ao MINEA, à multinacional General Electric e ao Governo angolano.

Na nova “frente judicial” aberta em solo norte-americano, a empresa privada de direito angolano — que viu em Agosto de 2019 o Presidente João Lourenço a cancelar os 19 dos contratos que tinha firmado com o MINEA — intentou uma “acção de responsabilidade civil” em que são visados a General Electric Company, a GE Capital, o Governo angolano, o MINEA, o Ministério das Finanças, a Empresa Pública de Produção de Electricidade (ENDE) e a Empresa Nacional de Distribuição de Eletricidade (PRODEL).

Na acção de responsabilidade civil, a Aenergy exige “o pagamento de uma indemnização pelas perdas e danos causados, na sequência da rescisão dos contratos e dos graves actos ilícitos praticados na antecâmara daquela rescisão”.

Segundo um documento entregue à justiça nova-iorquina, a Aenergy espera, com o processo ora intentado, “repor a verdade dos factos, após ter sido gravemente espoliada nos seus direitos e objecto de uma campanha difamatória orquestrada que visou a destruição da sua imagem, reputação e actividade, o que provocou graves prejuízos e a extinção de centenas de postos de trabalho qualificado na empresa em Angola, num verdadeiro atentado às mais elementares regras de um Estado de Direito”.

A acção judicial é uma “segunda vaga processual” em solo norte-americano, depois de, em Novembro de 2019, ter conseguido convencer o Tribunal Federal de Nova Iorque a exigir que a General Electric Company libertasse documentos considerados “relevantes” que ajudariam a esclarecer a verdade material dos factos imputados à Aenergy, por conta da rescisão de contratos e do processo de arresto de turbinas, peças e consumíveis.

Depois de ver frustrada todas as tentativas de entendimento com o Governo de Angola, que rejeitou todos os recursos administrativos e ignorou todas as provas apresentadas, a Aenergy recorreu às instâncias judiciais nova-iorquinas para forçar que a General Electric Company entregasse os documentos que tinha em sua posse, uma vez que alegava “ilegalidade” no acto de arresto de quatro turbinas, consumíveis e peças, determinada pela Procuradoria-Geral da República em Dezembro do ano passado.

Processo sem número

O processo de “assistência judicial” que deu entrada no Tribunal Federal de Nova Iorque, em Novembro de 2019, ajudou a libertar um conjunto de documentos que foram, em Janeiro deste ano, entregues ao Tribunal Supremo, em sede de “recurso de impugnação do acto administrativo de resolução dos contratos pelo MINEA”, aguardando-se que esse tribunal de recurso e a PGR se possam pronunciar sobre a “relevância material” dos dados no processo. Até à data, e ao que se sabe, ao processo instruído pelo Tribunal Supremo não foi ainda atribuída um número que seja do conhecimento público e da empresa litigante, apesar de todos os documentos e provas adicionais enviadas pelo Tribunal Federal de Nova Iorque.

Acção do Tribunal Provincial de Luanda

A 6 de Dezembro de 2019, através de um comunicado de imprensa, a Procuradoria-Geral da República anunciou ter intentado uma providência cautelar de arresto contra a empresa Aenergy, por “indícios de violação de contratos”. Em causa, segundo o documento, estiveram contratos celebrados com o MINEA, através da empresa Prodel, para o fornecimento de turbinas para a produção de energia eléctrica, no âmbito de uma linha de crédito da GE Capital ao Governo angolano no valor de 1.100 milhões de dólares.

Na sequência, foram apreendidas quatro turbinas eléctricas, sob alegação de que estas tinham sido “adquiridas com fundos públicos sem o conhecimento do Ministério de Energia e Águas”.

A acção da PGR permitiu também o arresto de peças e consumíveis decorrentes de um contrato de fornecimento e a assistência técnica de geradores industriais e outros materiais de produção de energia eléctrica celebrado entre a Aenergy e o Ministério da Energia e Águas através da empresa pública ENDE”, no valor de 114 milhões de dólares. Em resposta, a Aenergy veio a terreiro e acusando o Estado angolano de "expropriação ilegal e infundada".

"Esta expropriação chocantemente ilegal e infundada, é apenas mais um episódio da violação grosseira dos princípios elementares do Estado de Direito em Angola, e serve o propósito de encobrir as ações de natureza criminal de terceiros, protegidos pelo ministro da Energia e Águas (MINEA), justificando também uma rescisão ilícita e infundada dos contratos que a Aenergy tinha em vigor com entidades superintendidas pelo MINEA", lia-se na nota da Aenergy.

As “teses” da contenda

Muitas têm sido as teses veiculadas sobre este processo. Uma das quais tem que ver com o impacto dos preços competitivos particaados pela Aenergy em relação a outros actores do mercado, o que teria permitido ao Estado angolano a poupança de mais de 250 milhões de dólares, e uma redução, para cerca de metade, do custo médio de construção e exploração de centrais termoeléctricas, como consequência da redução em 46% do custo médio por MW/instalado, face ao custo médio contratado até então a outras empresas.

À boca pequena, fala-se numa situação que colocou em causa interesses há muito instalados no MINEA, o que veio a desencadear alegadas démarches com intuito de apear a Aenergy do mercado angolano, onde actuou durante sete anos nos sectores da energia e transportes.

Lembrar que no sector da energia, segundo um acordo com a General Electric, a Aenergy tinha o “direito exclusivo”, até Dezembro de 2022 no mercado de Angola, exclusividade que era extensiva aos territórios de Moçambique e Camarões.

Desde 2012, a Aenergy executou mais de 20 contratos de concepção, engenharia, construção, serviços de assistência técnica e fornecimentos de peças e equipamentos, tendo actuado não como uma empresa intermediária, mas investindo em recursos especializados e infraestruturas que contribuíram para formalizar acordos comerciais em parceria com várias entidades internacionais, entre as quais a multinacional de norte-americana General Electric, para as áreas da energia e transportes.

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