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Sexta, 14 Fevereiro 2020 23:58

Isabel dos Santos deve €570 milhões aos bancos portugueses

A banca portuguesa tem uma exposição de, pelo menos, €570 milhões a Isabel dos Santos e às suas empresas. Para evitar surpresas, o Banco de Portugal (BdP) pediu aos bancos uma atualização destes números, segundo informações apuradas pelo Expresso. Além disso, o supervisor quer ter a certeza de que todos os financiamentos estão cobertos por imparidades de forma adequada.

Os créditos bancários do universo empresarial da filha do ex-Presidente de Angola estão repartidos por 13 instituições bancárias, embora mais de metade dos financiamentos esteja concentrada em apenas três bancos. Uma parte significativa do total — €290 milhões — são responsabilidades potenciais, não sendo ainda definitivas.

A grande maioria dos empréstimos deve-se aos investimentos de Isabel dos Santos na Efacec, onde tem uma participação de perto de 70%. Caixa Geral de Depósitos, Banco Montepio, Novo Banco, BPI e BCP foram os bancos envolvidos no financiamento à empresa industrial.

Em termos prudenciais, a exposição da banca portuguesa a Isabel dos Santos representa menos de um ponto percentual do rácio de fundos próprios totais (o menos exigente) dos bancos, com apenas uma exceção.

Por indicação do supervisor, as instituições de crédito terão de reportar a informação atualizada sobre estes financiamentos. E não são os únicos a ter este trabalho, também os seus auditores externos terão de analisar a adequação dos níveis de imparidade sobre estas operações. A Comissão do Mercado de Valores Mobiliá­rios (CMVM) também já tinha pedido informações aos auditores externos de entidades ligadas à empresária para perceber se cumpriram o seu papel no campo da prevenção do branquea­mento de capitais.

De qualquer forma, por ter a empresária como principal acionista, o EuroBic concentra as atenções do supervisor liderado por Carlos Costa no que diz respeito aos efeitos do Luan­da Leaks. A posição de 42,5% está à venda aos espanhóis do Abanca, juntamente com a alienação por outros acionistas, incluindo o sócio da empresária angolana, Fernando Teles (ver texto abaixo).

Para já, o conselho fiscal do EuroBic, presidido por Susana Ribeiro, e os administradores não executivos independentes (que não estão ligados aos acionistas) foram chamados pelo BdP a olhar para o dossiê de créditos a Isabel dos Santos, tendo de perceber o grau de adequação dos procedimentos seguidos pelo banco nas operações em causa.

A avaliação não será apenas sobre entidades detidas por Isabel dos Santos mas também sobre aquelas onde pode exercer influência na gestão e ainda aquelas que se suspeite que possam atuar no interesse da empresária.

ATENÇÃO A DEPÓSITOS E À DELOITTE

O Expresso sabe ainda que no EuroBic está a haver uma monitorização especial da evolução dos depósitos — que acontece quando um banco fica sob maior pressão mediática, o que decorreu do que foi noticiado pelo consórcio de jornalistas ICIJ, integrado pelo Expresso e pela SIC, de que foram feitas transferências suspeitas por parte da Sonangol envolvendo contas na instituição. A Matter Business Solutions, destinatária das transferências, é uma entidade não diretamente associada a Isabel dos Santos, mas a personalidades a si ligadas — Mário Leite Silva, Jorge Brito Pereira e Paula Oliveira.

Nesta atenção específica também estão a ser vigiados os depósitos que pertencem ao universo da empresária, do marido, Sindika Dokolo, e ainda das entidades ligadas ao BIC, o banco angolano cuja estrutura atual é idêntica ao do português EuroBic. Esta semana, a Justiça portuguesa, ao responder a um pedido da Procuradoria-Geral da República angolana, mandou bloquear as contas bancárias em bancos portugueses da empresária angolana, como noticiou o Expresso na sua edição online.

O conselho fiscal e os administradores não executivos do EuroBic terão ainda de dar um parecer sobre a adequação do trabalho seguido pela Deloitte, a auditora externa do EuroBic em 2017 (data das transferências polémicas da Sonangol). O objetivo é perceber a adequação dos procedimentos no capítulo das transações com partes relacionadas. Isabel dos Santos era uma parte relacionada, já que detinha 42,5% do seu capital.

Auditores externos dos bancos terão de realizar uma análise à adequação dos níveis de imparidade dos créditos ao universo de Isabel dos Santos

O caderno de encargos do conselho fiscal é ainda maior, pois também lhe foi pedido pelo BdP que acompanhasse de perto o fecho de contas de 2019, de forma a que seja possível uma divulgação acelerada das mesmas, até para evitar dúvidas sobre o banco.

Em janeiro, após explodir o Luanda Leaks, o BdP anunciou que queria avaliar o modo como o EuroBic “analisou e deu cumprimento aos deveres a que está sujeito em matéria de prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo”, abrindo portas a consequências do ponto de vista prudencial e contraordenacional. Havia já a correr uma outra inspeção para analisar o trabalho feito pelo banco nesta área, desde a inspeção de 2015, que encontrou falhas graves no mecanismo de controlo de riscos.

O próprio banco, dirigido por Fernando Teixeira dos Santos, agora em final de mandato, revelou que iria realizar uma auditoria às operações.

Mas a preocupação é mais extensa, até pelos efeitos reputacionais de mais um problema num banco. O Governo, como o “Jornal Económico” noticiou há duas semanas, também pediu ao BdP e à CMVM “que lhe seja transmitida a informação, a que legalmente possa ter acesso, sobre os procedimentos associados a esta questão nas vertentes de branqueamento de capitais e de supervisão”.

MODELO DE GOVERNAÇÃO

REUNIÃO TENSA EM 2016

Terão sido muitos os alertas do Banco de Portugal (BdP) para arrumar a casa no banco detido por Isabel dos Santos e Fernando Teles, em particular entre 2015 e 2016, depois de o supervisor ter feito uma inspeção ao então BIC que arrasou a gestão e os mecanismos de prevenção de branqueamento de capitais e controlo de risco, praticamente inexistentes. O Expresso sabe que, em 2016, o BdP reuniu-se com os dois maiores acionistas do banco para os afastar dos órgãos sociais, marcando a independência do Banco BIC Português face ao BIC Angola. Objetivo: fortalecer a reputação do banco e impor o reforço dos mecanismo de controlo internos. A reunião foi tensa. Isabel dos Santos refutou o seu afastamento, questionando a legitimidade da recomendação por desconhecer qualquer norma que a impedisse de fazer parte da administração num banco onde era acionista relevante. Terão sido várias as explicações do governador Carlos Costa, que a uma dada altura chegou a ameaçar terminar a reunião devido ao tom “agressivo” da argumentação de Isabel dos Santos. Quase quatro anos depois destes alertas, corre uma nova inspeção, e desta vez a pressão levou a outro tipo de levantamentos no agora EuroBic. EXPRESSO

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