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Quinta, 30 Janeiro 2020 10:36

Luanda Leaks. Sonangol não reclamou das transferências no EuroBic

A petrolífera podia ter questionado o EuroBic quanto às transferências que estão no centro do Luanda Leaks, mas não o fez. Nem mesmo depois da denúncia de Carlos Saturnino, em 2018.

O Luanda Leaks expôs um conjunto de transferências de vários milhões entre a conta da Sonangol no EuroBic, em Lisboa, e o Dubai. Movimentos que não suscitaram dúvidas ao banco, mas que também não levaram a petrolífera a questionar a instituição financeira liderada por Teixeira dos Santos, apurou o Negócios. Um passo que ainda pode ser dado.

A investigação realizada pelo consórcio internacional de jornalistas mostrou que a conta da Sonangol no EuroBic terá sido "esvaziada", em 2017, em menos de 24 horas. Passou de ter 57 milhões de dólares para um saldo negativo de 450 mil, isto através de várias transferências para a Matter Business Consulting, uma companhia "offshore" controlada por Jorge Brito Pereira, então advogado de Isabel dos Santos, com sede no Dubai.

Uma das transferências, de 38 milhões, levou à abertura de um inquérito-crime pelo Ministério Público de Angola, por suspeitas de ter sido ordenada já depois de Isabel dos Santos e do seu administrador financeiro, Sarju Raikundalia, terem sido afastados da Sonangol. Mas levou também o então presidente da Sonangol, Carlos Saturnino, a denunciar, no início de 2018, a realização de "transferências monetárias irregulares ordenadas pela anterior administração".

Apesar disto, o responsável não chegou a questionar o EuroBic sobre estas mesmas transferências. Ao que o Negócios apurou, a petrolífera teria um limite de 60 dias para o fazer depois de receber o extrato em dezembro de 2017, mas nunca chegou qualquer denúncia à instituição financeira. Algo que ainda poderá vir a acontecer, apesar de o prazo ter já expirado. A Sonangol mantém-se cliente do EuroBic e a sua conta continua a movimentar milhões.

Transferências não suscitaram dúvidas no banco

Apesar de a petrolífera estatal não ter questionado, a equipa de "compliance" do EuroBic deu início a uma análise à transferência de 38 milhões depois das declarações de Saturnino. O objetivo era identificar a origem e o destino dos fundos. Concluído o processo, este movimento não terá suscitado dúvidas ao banco.

Por um lado, porque a Sonangol era um cliente conhecido e que tinha sido escrutinado, à data, pelo Banco Central Europeu (BCE). Por outro lado, porque o que estava em causa era um contrato de prestação de serviços para um projeto de reestruturação da petrolífera em que a Matter era uma espécie de gestora, explicou fonte ao Negócios, adiantando ainda que o dinheiro acabou por ser usado para pagar às consultoras envolvidas.

Esta foi apenas uma de várias transferências realizadas nessa altura e que levaram à saída de vários milhões da conta da Sonangol. Uma saída de dinheiro que não fez disparar o "alarme" dentro do banco porque a movimentação de valores elevados, de 10 ou 15 milhões, seria habitual no caso da petrolífera, havendo registo de transferências anteriores para o Dubai. E porque a conta em causa tinha duas componentes, uma em dólares e outra em euros. Conforme apurou o Negócios, ao mesmo tempo que foi dada a ordem de pagamento, que levou à saída deste dinheiro, houve um depósito de 67 milhões de euros.

Além disso, estava em causa uma entidade não sancionada. Ou seja, que não está sujeita a escrutínio prévio.

O Consórcio Internacional de Jornalismo de Investigação (ICIJ) revelou no dia de 19 de janeiro mais de 715 mil ficheiros, sob o nome de Luanda Leaks, que detalham esquemas financeiros de Isabel dos Santos e do marido, Sindika Dokolo, suspeitos de terem permitido retirar dinheiro do erário público angolano, utilizando paraísos fiscais.

Esta investigação levou o EuroBic a "cortar" de imediato relações comerciais com entidades ligadas a Isabel dos Santos. Mas também a empresária angolana a pôr à venda a sua posição de 42,5% no banco, assim como abdicar de imediato dos direitos de voto. A filha do ex-presidente de Angola vai também sair do capital da Efacec. Já Mário Leite Silva, gestor de Isabel dos Santos, renunciou à presidência do BFA, mas também saiu da Nos, assim como outros dois administradores não executivos.

 

 

Compliance com 27 colaboradores

O EuroBic foi, em 2015, alvo de uma inspeção por parte do Banco de Portugal. O regulador concluiu que havia graves deficiências na prevenção do branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo. "Foram emitidas 52 determinações específicas na sequência da ação de inspeção de 2015, e de acordo com a última avaliação efetuada pelo BdP estão por cumprir nove", afirmou fonte oficial do supervisor ao Expresso. Neste período, a equipa de "compliance" contava com apenas sete colaboradores, sabe o Negócios. Hoje, são 20 as pessoas envolvidas nestes processos e, a partir da próxima semana, a equipa vai aumentar para 27 funcionários.  Jornal de Negocios

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