Quarta, 08 de Outubro de 2025
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Quarta, 08 Outubro 2025 16:53

Angola sem “poder judicial verdadeiramente independente” em 50 anos de independência - OAA

O bastonário da Ordem dos Advogados de Angola (OAA) disse hoje, em Luanda, que, em 50 anos de independência, o país ainda não alcançou um “poder judicial verdadeiramente independente”, apelando à coragem para fazer “alterações profundas”.

José Luís Domingos falava à imprensa à margem da II Cimeira dos Conselhos Superiores de Justiça da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), que tem como tema a “Separação de Poderes e a Autonomia Administrativa e Financeira do Poder Judicial” e que conta com a participação de delegações de Portugal, Brasil, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.

Segundo o bastonário da OAA, a autonomia administrativa e financeira do poder judicial, bem como a separação de poderes estão ainda “numa fase muito embrionária”.

Nós ainda temos uma realidade em que os tribunais acabam muito sujeitos a uma dependência financeira do executivo e política, quer pela via da nomeação dos juízes presidentes dos tribunais superiores quer por muitos mecanismos que fragilizam esta independência”, disse.

O bastonário da OAA destacou a oportunidade da partilha de conhecimentos e experiências entre os Estados-membros da CPLP, como os casos de Portugal, Brasil e outros, que “já evoluíram bastante nesse aspeto”.

Por exemplo, nós ainda temos cá um grande problema. Hoje, o presidente do Conselho Superior da Magistratura Judicial ainda é o presidente do Tribunal Supremo, isso indiscutivelmente afeta a independência interna do poder judicial.

Se olharmos para Portugal, Brasil e outras realidades, o presidente do órgão de gestão do poder judicial já não é o mesmo presidente do Tribunal Supremo”, referiu.

No caso do Brasil, acrescentou, é aplicada a presidência rotativa para o Tribunal Supremo, de dois em dois anos, “o que torna cada vez mais a gestão colegial ao invés de ter homens fortes e instituições fracas”.

“Nós ainda temos um modelo em que o presidente do Tribunal Supremo é o mesmo do Conselho Superior da Magistratura e tem um mandato de sete anos. Durante esse período, pensamos que se personifica demais a presidência do Supremo numa só pessoa”, referiu.

Achamos que vamos ter aqui bons exemplos de autonomia financeira dos tribunais, há realidades, por exemplo, que não se permite que alguém que esteja no executivo, do dia para noite passa a ser juiz de um tribunal superior, há um período de nojo que é necessário cumprir”, acrescentou.

Para o bastonário da OAA, o encontro é uma oportunidade para confrontar várias realidades e perceber que a angolana “precisa de dar passos longos para a verdadeira independência”.

“É um percurso, estamos a completar 50 anos de independência, a verdade é que ainda não conseguimos ter o poder judicial verdadeiramente independente e acreditamos que será necessário coragem para fazermos alterações profundas, que requer revisão constitucional, mas, acima de tudo que, mais do que mudar leis, haja um compromisso muito sério de quem governa de que apostar no Estado de direito é o único caminho para termos o país que sonhamos”, frisou.

Presente no encontro como convidada, a OAA vai continuar a incentivar a discussão do que considera fundamental, nomeadamente, dos problemas que “enfermam o poder judicial” no que toca à sua independência e à eficiência.

“Temos que repensar se esse modelo de designação dos juízes presidentes dos tribunais superiores pelo Presidente da República, mesmo que seja uma discricionariedade limitada aos três primeiros escolhidos, se tem produzido o efeito desejável”, enfatizou.

A OAA entende que o poder judicial ainda é muito refém da política financeira do executivo, pois, logo na fase inicial de preparação do Orçamento Geral do Estado, este “tem a liberdade de fazer cortes no orçamento do poder judicial”.

“E mesmo após aprovação do orçamento pelo parlamento a verba (…) aprovada não é desembolsada nem seque a 40%, isso tem criado fortes estrangulamentos à gestão do tribunal e sem dinheiro os tribunais não conseguirão cumprir a sua função constitucional”, disse.

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