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Sexta, 17 Junho 2016 08:48

Familiares dos ativistas angolanos vivem "pesadelo" um ano depois das detenções

Um ano depois das detenções dos ativistas angolanos que se reuniam para discutir política, as famílias dos 17 que já cumprem penas de prisão, por rebelião e associação de malfeitores, dizem viver um "pesadelo".

As detenções começaram a 20 de junho, o julgamento, por entre greves de fome e mais de seis meses de prisão de preventiva, arrancou em novembro e ao fim de sucessivos atrasos a condenação chegou a 28 de março, com penas efetivas de prisão entre os dois anos e três meses e os oito anos e meio. Até agora, nem os três diferentes recursos interpostos pela defesa impediram os jovens de já estarem a cumprir pena.

Enquanto isso, mães, mulheres e filhos assistem impotentes, do lado de fora.

"O que é que eles fizeram", questiona, em declarações à Lusa, Júlia de Oliveira, mulher do ativista José Gomes Hata, condenado a quatro anos e seis meses de prisão efetiva, por atos preparatórios para uma rebelião e associação de malfeitores, tal como os restantes.

Desempregada e com três filhos, de três, cinco e 11 anos, conta que está a passar por dificuldades, sobretudo financeiras, mas falta igualmente o apoio moral. "Está a ser difícil a ausência do pai para os meus filhos. Para mim é chocante quando perguntam pelo pai, o maior responde sempre que o pai está no tribunal. Por decisão da família nunca o foram visitar", conta Júlia Oliveira.

Praticamente um ano depois de o "pesadelo" ter começado, admite que o dia da condenação foi o mais difícil: "Foi como se o mundo tivesse acabado", desabafa.

Mais de dois meses depois, os tribunais nada responderam ainda sobre os três recursos, um 'habeas corpus' a pedir a libertação imediata que se arrasta desde abril, recurso para o Supremo e outro para o Constitucional, que a defesa apresentou.

Alheia às questões processuais, Virgínia Micolo é mulher de Nelson Dibango, condenado a quatro anos e três meses, mas diz-se convicta que o marido saia antes do fim da pena. "Perguntam-me se não tenho medo, que possa estar a ser seguida, eu respondo que não, porque não fiz mal a ninguém e o Nelson está onde está, mas não fez mal nenhum", conta, em conversa com a Lusa.

A viver em casa dos sogros com dois filhos, de um e seis anos, os momentos de angústia são mais fortes quando as crianças adoecem e chamam pelo pai. "O mais velho pergunta pelo pai e quer saber quando vai regressar a casa e eu fico sem resposta", lamenta.

Por sua vez, Leonor João, mãe do ativista Afonso Matias 'Mbanza Hanza', garante que a Justiça só será feita quando o seu filho for colocado em liberdade: "Eu quero que ele saia, os que mataram estão livres, por que é que eles não saem", questiona.

Segundo de quatro filhos, Mbanza Hanza era professor até à altura da sua detenção, e com o seu salário ajudava a mãe, igualmente professora do ensino primário.

Agora, tudo mudou: "Agora tudo depende de mim e dos irmãos, o sustento da sua família - dois filhos e a mulher que não trabalha - falta tudo, dinheiro, alimentação", explica.

Leonor João refere que foi cortado, desde janeiro, o salário de Mbanza Hanza, sem qualquer justificação, acrescentando que também não tem apoio familiar por medo de represálias.

"No meu serviço vão lá sempre os 'sinfos' [Serviços de Inteligência e Segurança do Estado], mas nunca vieram falar comigo. As pessoas é que me contam que vão lá perguntar coisas sobre mim, à procura de qualquer irregularidade para me despedirem, eu sei", diz.

Neste processo, 15 dos ativistas estiveram em prisão preventiva entre junho e 18 de dezembro, quando foi revista a medida de coação pelo tribunal, passando então a prisão domiciliária.

As duas jovens também julgadas e condenadas nunca chegaram a ser detidas e aguardaram o desfecho do julgamento, que decorreu entre 16 de novembro e 28 de março, em liberdade.

Lusa

 

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