Como pano de fundo há ainda os muitos processos em curso na justiça angolana e no exterior contra a filha Isabel dos Santos e o facto de o MPLA ter suspenso o mandato da filha e deputada Welwitschia "Tchizé" dos Santos.
Para o jornalista, historiador e analista político Jonuel Gonçalves, também conhecido por José Gonçalves, o antigo Presidente tem muitos motivos para regressar a Angola, a começar por não querer transmitir a ideia de que fugiu.
“Ele revelou a amigos próximos que ele não queria dar a impressão de que era um Presidente fugitivo”, afirma Gonçalves, lembrando, na conversa com a VOA, que Santos tem alguns problemas por resolver em Angola.
“Um colega sublinhava no outro dia que ele não saiu de Angola enquanto o seu filho esteve preso. O caso do filho vai a julgamento no Supremo e a sua presença pode ajudar bastante, ou ele pessoalmente pode sentir-se mais à vontade junto do filho num momento decisivo”, aponta aquele analista quem acrescenta um segundo motivo para este regresso.
Além de marcar a presença em Angola e marcar presença junto dos sectores da família mais ameaçados, Jonuel Gonçalves admite que “ele pode estar também a abrir caminho para uma solução deste problema dos capitais que estão no exterior porque se a família Santos chegar a um acordo nesta matéria, todos os outros vão ter de chegar a um acordo”.
Imagem do Governo e debate interno sem ameaças
“Do lado do Governo, João Lourenço não pode dar a impressão de que está a espezinhar, a sacudir e a tentar humilhar um ex-Presidente, independente das suspeitas que pairam sobre ele, ou seja, um comportamento institucional, vamos dizer, civilizado, e isto é importante para o MPLA”, acentua aquele analista político angolano.
É que, para Jonuel Gonçalves, o partido no poder passa por uma fase de debate interno, “talvez, em toda a história, o primeiro debate interno que não dá lugar a ameaças repressivas, com alguns participantes desse debate a se expressarem nos órgãos de comunicação e nas redes sociais”.
Quanto a uma eventual influência de José Eduardo dos Santos na política, o historiador considera que “ninguém sabe porque ninguém sabe quem terá a grande influência ou não”, em Angola neste momento.
Gonçalves prefere olhar para o campo político-partidário e realçar que “o Presidente de Angola é talvez um dos casos em que a gente pode dizer que vai ter influência e do, outro lado, poderá ter influência a oposição, mas resta saber se ela vai se articular ou não”.
José Eduardo dos Santos é conhecido por ser um “grande gestor de silêncios”, com os quais, dizem os observadores, transmite muitas mensagens.
Ele não anunciou o regresso a Angola, nem se pronunciou desde que chegou a Luanda.
Desconhece-se também quanto tempo poderá ficar no país, nem se participará no oitavo congresso do MPLA, de 9 a 11 de Dezembro, que vai reconduzir João Lourenço na liderança do partido.
Mais liberdade em Angola
Jonuel Gonçalves não está inclinado a pensar que Santos irá, por exemplo, activar os seus próximos para fazer frente a Lourenço e que não estão contentes com a gestão do actual Presidente.
“Talvez entre a velha guarda, mas nas novas tendências, na área económica, financeira e até na área cultural, José Eduardo não tem assim muito prestigio”, lembra aquele analista quem alerta que o país vive outro ambiente.
“Um facto muito importante é que depois dele sair a liberdade de expressão aumentou muito e este elemento é considerado tão ou mais importante que o combate à corrupção que agora está apenas nas mãos do poder judicial”, aponta Gonçalves que não vê Santos “a ter assim muito peso”.
Entretanto, a presença dele tem um valor simbólico de que “pelo menos neste momento em Angola o debate político não se faz com perseguições, e isto é muito importante”.
“As acusações que eram feitas contra os adversários de José Eduardo dos Santos condenavam-os ao silêncio, a terem de sair do país ou ficavam numa situação de ostracismo. E o Governo actual não quer dar essa imagem”, conclui o historiador e analista político.
Na quinta-feira, 16, a Presidência da República informou que João Lourenço e José Eduardo dos Santos falaram ao telefone, sem avançar detalhes, mas que apenas "se saudaram mutuamente". VOA