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Quarta, 02 Julho 2014 11:29

Um debate esclarecedor - José Ribeiro

O Parlamento aprovou, sem votos contra, o relatório da I e VI Comissão que recomenda ao Executivo o fortalecimento do sector público da Comunicação Social, ao mesmo tempo que destaca o papel que tem desempenhado.

Os órgãos de informação da Empresa Edições Novembro foram particularmente elogiados e encorajados a prosseguirem o seu trabalho, sério e honesto, de informar e formar. Há uma recomendação dos deputados que integram as duas comissões que quero destacar: a regulamentação do chamado Pacote Legislativo da Comunicação Social.

Embora tenha servido à UNITA para fomentar divisões no seio da maioria, tentando pôr  a anterior ministra do sector contra o actual, a legislação da Comunicação Social está a fazer muita falta a alguns jornalistas, quanto mais não seja para resolver aquele que consideram um dos mais graves problemas do jornalismo angolano: o estatuto do jornalista e o regulamento da carteira profissional. Eu e alguns jornalistas ao serviço das Edições Novembro, da qual sou primeiro responsável, demos o nosso contributo na produção da legislação, com um espírito construtivo e de colaboração com a tutela. Para quem cumpre as práticas profissionais do jornalismo, de nada serve mais legislação e mais controlo.

Reconheço que nenhum jornalista digno se sente bem quando sabe que a profissão é exercida por gente sem qualificações técnicas e no desconhecimento absoluto dos princípios éticos e deontológicos, o que leva à ausência de deveres básicos. E dou um exemplo que resulta do próprio debate dos deputados na Assembleia Nacional. Uma equipa da “Rádio Despertar”, órgão partidário ao serviço exclusivamente da UNITA, estava a transmitir em directo as intervenções dos deputados sem para isso estar autorizada.

Temos de tudo, nesta profissão. Até aqueles que pensam que são jornalistas só porque um dia viram publicado num jornal um texto de sua autoria. Ou porque deram opiniões avulsas aos microfones de rádios ou ante as câmaras de canais de televisão. Nada mais enganador. Um jornalista é um técnico de comunicação e só atinge esse estatuto quando domina todas as técnicas que fazem dele um profissional. Só pode exercer a profissão quem faça prova desses conhecimentos. Também não é automaticamente jornalista quem ao fim de uns tantos anos conseguiu obter um diploma numa escola média ou superior.

Esse é apenas o ponto de partida para entrar na profissão, e pode nunca chegar lá.

Apesar dos insultos repetidos e das manipulações grosseiras por parte de um deputado da oposição, considero que o debate foi enriquecedor e veio clarificar a situação que se vive na comunicação social.

A partir de agora sabemos quem pugna pela liberdade de imprensa e quem se serve dela para atacar o regime democrático. Ficámos a saber que para alguns deputados da oposição a linguagem jornalística deve ser à medida da “Rádio Despertar”, lançando ódio e instigando a população ao atropelo das leis. Sabemos por alguns deputados da oposição que os insultos ao Chefe de Estado são práticas normais e não são crimes de natureza pública.

Daí que alguns parlamentares  de Espanha, onde estiveram recentemente deputados da Assembleia Nacional, se tenham mostrado intrigados: “os vossos deputados vêm para fora do vosso país falar mal das suas instituições e quando regressam não lhes acontece nada?”

Para esses legisladores sem civismo e mal preparados para uma Casa da Democracia, os insultos e injúrias ao mais alto magistrado da Nação representam apenas o direito à crítica e à liberdade de expressão. Neste aspecto gostava que o debate tivesse sido um pouco mais assertivo. É preciso explicar a alguns deputados que ninguém pode usar direitos e liberdades para atacar a honra e o bom nome seja de quem for e muito menos pôr em causa os fundamentos do Estado de Direito e Democrático.

No debate sobre o papel do sector público da comunicação social no regime democrático faltou definir claramente o papel de cada órgão de soberania num Estado de Direito. Alguns deputados da oposição atacam abertamente o Poder Judicial pondo em causa a sua independência e a competência dos magistrados.  Quando a liberdade de imprensa belisca os interesses dos políticos e os jornalistas revelam factos que alguns gostavam de ver escondidos no esquecimento, o caminho escolhido por esses políticos não é exercer o direito de resposta, mas sim atacar o ministro da Comunicação Social, porque não censura os órgãos de informação sob sua tutela. É uma estranha forma de entender a democracia e a liberdade de imprensa. A UNITA quer que o Executivo censure os jornalistas dos órgãos públicos de comunicação social e lhes imponha uma agenda editorial, em nome de uma política e de uma reconciliação que o partido não está a saber honrar. Mas o padrão que os mesmos deputados usam para a liberdade de imprensa é a propaganda militarista da Rádio Despertar e o lixo dos franco-atiradores das redes sociais que destroem a democracia e o Estado de Direito.

Este debate no Parlamento sobre o papel dos órgãos públicos de comunicação social e o regime democrático foi muito útil e esclarecedor. Confirmámos que a maioria parlamentar defende a liberdade de imprensa e o direito a informar, informar-se e ser informado. E alguns deputados da oposição querem servir-se das liberdades, direitos e garantias para amordaçar os jornalistas e destruir o regime democrático.

Por fim, quero informar os senhores deputados da oposição que em nenhum país do mundo os órgãos de informação de sinal aberto são obrigados a transmitir em directo os debates parlamentares. Alguns países têm um canal próprio dos seus Parlamentos para essa transmissão e quem quer usa as imagens, em directo ou editadas. Em Angola não existe esse modelo, mas como copiamos tudo de maneira acrítica, talvez venha a existir.

Se assim acontecer, vai ser uma vergonha para os angolanos ouvirem um político da UNITA lançar insultos racistas e xenófobos sobre os jornalistas que cá trabalham ou um deputado do PRS revelar a sua homofobia a propósito de um programa de televisão. O racismo, a xenofobia e a homofobia são crimes contra a humanidade. É triste que actos condenáveis sejam praticados por políticos angolanos.

Jornal de angola

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