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Terça, 28 Mai 2019 13:17

Senhor Presidente, o país está ou não em processo de reconciliação?

Ontem, 27 de Maio, por volta das 21h30 (ao chegar a casa, vindo da Conferência-Mesa Redonda subordinada ao tema «Liberdade e Memória» sobre a tragédia do 27 de Maio de 1977), fui informado que o programa elaborado pelo Governo para a realização do funeral de Estado de Jonas Savimbi – e que que teve sanção da UNITA – foi mudado à última da hora.

O programa estava a ser implementado, e um dos pontos altos foi a realização de uma Missa de Encomendação, ocorrida a 24 de Maio, na Paróquia de São Domingos, acabou por registar um problema que constitui um retrocesso a todos os níveis.

Acontece que foi acordado entre a Delegação do Governo (chefiada pelo General Pedro Sebastião) e a Delegação da UNITA e da Família (chefiada por Ernesto Mulato, Rafael Massanga Savimbi e Kamy Pena respectivamente) que a entrega dos restos mortais teria lugar a 28 Maio, isto é, hoje, terça-feira, no Luena, altura em que o Governo entrega-los-ia à responsabilidade à família.

Entretanto, ontem dia 27 de Maio, o Governo surgiu com um novo programa, com a pretensão expressa de alterar os locais acordados anteriormente, bem como as datas. E com o argumento de que o fundador e primeiro presidente da UNITA 'já não terá o inicialmente programado funeral de Estado, porque nunca foi membro do Governo'!

A presente situação representa um retrocesso grotesco e um desrespeito à Família do fundador e primeiro presidente da UNITA, Jonas Malheiro Savimbi (1934-2002).

Um retrocesso, porque a mudança de última da hora por parte do Governo demonstra claramente que a política de Reconciliação do Presidente João, que teve um começo airoso, sofre um recuo que denuncia movimentações no seio do MPLA e do Governo que comprometem seriamente o processo de reconciliação e põem em cheque a imagem de João Lourenço como o líder que, tendo feito uma interpretação sóbria da História de Angola, compreendeu que o avanço do País depende de serem implementadas medidas de superação das fendas e feridas que prostraram a Alma Angolana durante a guerra fracticida e não só.

Um desrespeito à Família, porque, além de que já vai tarde em o Governo proceder à entrega dos restos mortas de Jonas Malheiro Savimbi, o Governo demonstra estar a gozar com os sentimentos da irmã, dos filhos, netos e bisnetos e outros familiares do fundador e primeiro presidente da UNITA, cujas contribuições para a libertação e fundação e democratização de Angola são irrefutáveis.

Mais do que isso, o Governo e o MPLA demonstram estar incomodados com a mobilização nacional e até mesmo internacional que o funeral de Jonas Savimbi vai causar.

Apesar das décadas de diabolização da sua pessoa, o regime, ao contrário do que esperava, viu o respeito e a deferência à figura de Jonas Savimbi crescerem extraordinariamente nos pós-guerra.

Jonas Savimbi não aceitou dobrar-se. Preferiu encerrar a sua longa luta no local onde fundou a UNITA com Samuel Chiwale, Ernesto Mulato, António Dembo, Miguel Nzau Puna e outras figuras.

Ao longo dos anos seguintes à sua morte, os Angolanos – incluindo muitos dos ferrenhos activistas da sua diabolização (dentro e fora do MPLA) – tiveram tempo, oportunidade e serenidade para reavaliar a figura de Jonas Savimbi. No seio de Angolanos de várias gerações, sobretudo da juventude, ele é alvo de extraordinário respeito e deferência.

A ideia - ainda que fictícia - de Agostinho Neto (cujas responsabilidades na tragédia de 27 de Maio de 1977 têm ficado cada vez mais claras aos Angolanos) e de José Eduardo dos Santos (que levou Angola ao marasmo) não serem páreos à figura Jonas Savimbi em matéria de respeito e deferência nacionais deixa o regime incomodado e não o deixa dormir.

Mas João Lourenço, que tem dado sinais de que não quer deixar um legado qualquer, mas, antes, ser lembrando como o Reformador e o Reconciliador de Angola, sai muito prejudicado de todo este imbróglio. Ao mesmo tempo, não deverá espantar a ninguém se ficar demonstrado que ele mesmo esteja a ser alvo de tremenda pressão por parte dos duros do MPLA, muitos dos quais ficaram incomodados com o recente despacho do Presidente da República, no sentido de o Governo homenagear os Angolanos e as Angolanas mortos nos vários conflitos que o País viveu, incluindo a tragédia de 27 de Maio de 1977, de que foram e continuam a ser responsáveis.

O MPLA fica mal na fotografia.

O Governo fica mal na fotografia.

João Lourenço fica mal na fotografia.

Angola sai a perder.

Por Nuno Álvaro Dala

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Nota: o Governo de Moçambique, país muito parecido com Angola, realizou um funeral de Estado para Afonso Dhlakama, líder histórico da Resistência Nacional de Moçambique (RENAMO). Ora, Afonso Dhlakama - o «Jonas Savimbi de Moçambique - nunca foi membro do Governo daquele País, mas teve funeral de Estado. Moçambique e os moçambicanos saíram a ganhar.

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