Embora tenha negado que tenha prosperado como empresário à sombra do partido governante, onde militou durante várias décadas, Francisco Viana confirmou há poucos dias o que muitos já suspeitavam: abandonou a bancada parlamentar dos " maninhos" e decidiu caminhar pelo seu próprio pé, declarando-se "deputado independente".
Em entrevista ao NJ na segunda-feira, 18, numa das salas do seu amplo e luxuoso restaurante, no município satélite de Viana (que coincidência de nomes!), Francisco Viana explica os motivos que o levaram a bater com a porta do Grupo Parlamentar, confirma que já teve negócios com o Parlamento e que está pronto a abandonar o hemiciclo, "se a UNITA assim o desejar".
Quais são as razões que o levaram a abandonar a bancada parlamentar do maior partido da Oposição para se assumir como deputado independente?
Não me sentia confortável no Parlamento pelo facto do meu nome ser sempre associado ao partido do Galo Negro, mesmo sabendo-se que não sou militante dessa formação política.
Quando, em 2022, aderi à Frente Patriótica Unida (FPU), em resposta a um convite que me foi feito pela direcção da UNITA, fiz questão de dizer que estava na condição de independente, em prol da sociedade civil.
Foi nessa condição que, por via da FPU, concorremos às eleições, nas quais saímos vencedores, mas nos roubaram os votos.
Depois, fomos remetidos para fazer uma luta, dentro e fora do Parlamento.
Acontece que que eu, Francisco Viana, quando digo qualquer coisa sou logo conectado à UNITA. Ora, isso fragiliza a minha posição e dificulta o meu trabalho como independente.
Sou deputado do Grupo Parlamentar da UNITA, mas independente". Essa é a verdade que eles não escrevem ou ocultam...
Quando sai do MPLA por discordar, dentre outras coisas, a questão das autarquias e do gradualismo, não me filei em mais nenhum partido político, pelo que fiquei só independente e membro da sociedade civil.
De acordo com a Lei Eleitoral, ninguém pode chegar a deputado sem que seja filiado a um partido político. Significa que subscreveu as teses da UNITA?
Não é bem assim. Como sabe, dentro da FPU existem as teses da UNITA, do Bloco Democrático (BD) e do PRA-JA Servir-Angola e da sociedade civil.
Em Angola, já houve situações de deputados que se tornaram independentes por não se sentirem confortáveis com as bancadas parlamentares dos seus partidos políticos.
Em algumas ocasiões, já manifestei o desejo de sair do Parlamento, mas os meus camaradas de bancada disseram-me sempre para que ficasse, para que aguentasse mais um pouco. Não sai para não defraudar às expectativas dos que me ajudaram a eleger no cargo de deputado.
Nós precisamos de uma concertação no seio da FPU, mas não me devem obrigar a usar o "chapéu partidário". Não me sinto confortável com o chapéu partidário, visto que aderi à FPU em nome da sociedade civil.
Por só agora está a levantar essa questão do "chapéu partidário"?
Todas às vezes que falava com os membros da FPU, antes das eleições, disse-lhes sempre que era independente. Sobre isso nunca houve dúvidas. Tanto assim que só uma semana ou 15 dias antes da apresentação das listas de deputados apresentei a minha carta de demissão ao MPLA.
Em nenhum momento, foi levantada a hipótese de eu ingressar no partido UNITA.
Mas subscreveu o programa eleitoral da UNITA...
Subscrevi o programa da FPU e não da UNI- TA. Acontece que o programa e a metodologia não foram bem detalhados.
O meu objectivo era alternância e não estava nos meus planos ser deputado, aceitei ser depois de a UNITA ter colocado o meu nome na lista.
Então foi contra a sua vontade?
Não, porque não faço nada contra a minha vontade.
Reafirmo que não era minha intenção ser eleito deputado, porque sou empresário e tenho mais coisas para fazer. Confesso que ser deputado "mexeu" muito com a minha vida empresarial.
Diz que "mexeu" muito com a sua vida empresarial. Foi alvo de alguma chantagem ou os seus negócios foram prejudicados em função das suas opções políticas?
Não fui alvo de chantagem política, mas "mexeu" com a minha vida empresarial.
Diz que "mexeu" muito com a sua vida empresarial. Foi alvo de alguma chantagem ou os seus negócios foram prejudicados em função das suas opções políticas?
Não fui alvo de chantagem política, mas "mexeu" com a minha vida empresarial. Agora, tenho de ir ao Parlamento todos os dias para cumprir com as minhas obrigações de deputado.
Como sabe, os empresários estão a atra- vessar uma grave crise económica e financeira, daí a necessidade de acompanhar as minhas pequenas empresas. Não sou "marimbondo".
Neste país, nenhum empresário prosperou sem a sombra protectora do MPLA. Teve alguma ajuda nesse sentido?
Nunca recebi nenhuma ajuda do MPLA para singrar como empresário. Está a es- quecer-se de que sou Francisco Viana, o "menino rebelde" do MPLA ou, por outra, o «revu do MPLA"?
Não se esqueça que fui o organizador do congresso dos quadros angolanos em Portugal e estive três vezes na Jamba. [O antigo bastião da UNITA].
O MPLA deu-me oportunidades de negócios que eu não agarrei, mas nunca se virou contra mim.
Estive três vezes na Jamba e fui em igual número de vezes recebido pelo ex-PR, José Eduardo dos Santos.
Tem alguma consistência as informações segundo as quais, as suas empresas prestam serviços à Assembleia Nacional?
Sim, já prestei serviços à AN. Uma das vezes fui contactado para prestar serviços por via de uma empresa minha de sinalética, que procedeu à exposição de fotografias num stand que lá havia sido montado. Foi um pequeno trabalho sem grande expressão.
Isso aconteceu antes de ser deputado, e a AN levou muito tempo a pagar-me o trabalho, que estava orçado em dois mil dólares [americanos].
As suas empresas continuam a prestar ainda serviços ao Parlamento?
Como disse, uma das minhas empresas prestou pequenos serviços ao Parlamento, antes de ser deputado. Presentemente, não presto nenhum tipo de serviços, mas se for contactado, não hesitarei, pois antes de tudo sou empresário.
A presidente da AN enganou-se quando disse que eu tinha empresas a prestar ser- viços ao Parlamento.
Não nego que já fiz negócios com a AN, foi passado, mas não foram grandes negócios como, por exemplo, o de vender carros
Diz que foi sempre visto como "revu" do MPLA, mas apoiou João Lourenço no início do seu consulado. Não acha um contraste?
Sim, ajudei a campanha eleitoral do presidente João Lourenço. Depois da sua eleição, apoiei no início do seu mandato, sobretudo na questão que tinha a ver com a bicefalia. Não vejo nisso um contraste.
No entanto, deixei de apoiá-lo devido à forma como estava a conduzir as políticas económicas, sobretudo quando prometeu constituir o Conselho de Concertação Económico e Social em que as associações empresariais iriam nomear os seus representantes para negociar com o Governo.
O PR não honrou com a sua palavra, aca- bando de indicar pessoas da sua conveniência para o referido Conselho em detrimento dos representantes das associações empresariais.
Mudou em distintas ocasiões de Comissão no seio do Parlamento, por supostamente não aceitar ser manipulado pelo MPLA. Por que não renuncia ao seu cargo de deputado por uma questão de honra e dignidade?
Em distintas ocasiões, manifestei a minha vontade de abandonar o Parlamento, mas fui aconselhado por pessoas ligadas à UNITA e ao MPLA para que ficasse. Agora, cheguei à conclusão que não podia continuar nesse grupo parlamentar pelas razões que já evoquei.
Todo mundo pediu-me para aguentar mais um pouco, porque saiba que não estava confortável na Assembleia Nacional. Mas se for desejo da UNITA, estou pronto para abandonar o Parlamento, bastando para o efeito que a sua direcção me comunique a sua decisão.
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