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Terça, 05 Mai 2020 06:40

“Angola sem petróleo e diamantes teria sido um país melhor”

O presidente da Câmara de Comércio Angola-China pasma-se com os fenómenos que ocorrem no país. A ostracização de potencialidades como o turismo e a agricultura é apenas um dos muitos exemplos

O facto de o desenvolvimento económico do país ter sido assente na exploração e exportação do petróleo e do diamante foi a pior decisão tomada pelas sucessivas equipas gestoras do sector económico da Angola independente. Arnaldo Calado considera “boa decisão” a disponibilização dos fundos anunciados pelo Executivo para mitigar os efeitos nefastos da Covid-19, mas espera para ver a passagem da intenção à prática.

“O Governo foi providencial nas decisões que tomou, mas, ainda que pareçam muitos mil milhões de kwanzas, o dinheiro nunca chegará a ser suficiente para reparar os estragos provocados por esta pandemia”, disse, pessimista, Arnaldo Calado. O empresário acha que o facto de o país ter passado ao largo de potencialidades como o turismo, os recursos florestais, a agricultura e tantos outros, em consequência dos proventos do petróleo e do diamante, terá sido um erro de cálculo que pode custar “esforço ingente” para que Angola possa reerguer-se novamente e continuar a sua marcha.

Um especialista em fiscalidade disse recentemente à agencia noticiosa Lusa que as medidas do Governo angolano destinadas a atenuar o impacto da Covid-19 nas empresas traduzem-se mais num diferimento de prazos do que num verdadeiro alívio fiscal.

“Houve um esforço grande do Governo para implementar medidas para aliviar a tesouraria das empresas e uma capacidade rápida de resposta”, reconheceu o director do departamento fiscal da consultora PwC em Angola, Luís Andrade. Mas, acrescenta, o alcance destas medidas é limitado: “Não são suficientes para salvar negócios, alguns já fragilizados, e que vão sofrer o impacto do confinamento, do estado de emergência e, sobretudo, da queda do preço do petróleo”.

O consultor defende que o Governo angolano poderia ter ido mais longe, adoptando outras medidas com impacto no cash-flow das empresas como a dispensa da liquidação provisória do imposto industrial, bem como um alargamento de prazos “mais ambicioso”. Sugere também que seja prolongado o prazo de reporte dos prejuízos, já que “é esperado que as empresas venham a passar um período complicado”.

O Governo angolano anunciou um pacote de medidas que visa atenuar os efeitos da pandemia, incluindo a disponibilização de mais de Kz 400 mil milhões para a “manutenção mínima dos níveis de actividade das micro, pequenas e médias empresas do sector produtivo” e alargamento dos prazos limite para liquidação de obrigações tributárias. Desde o anúncio a efectivação, vozes já se levantam criticando a continuidade do excesso de burocracia no acesso aos fundos e, logo, factor inibidor de adesão.

Por sua vez, Arnaldo Calado aponta como uma das saídas possíveis a aposta na agricultura familiar e consequente valorização dos produtos do campo, levando a que este segmento produtivo nacional assuma a missão de assegurar a logística para toda a Nação. “É hora de olharmos para o camponês e dar-lhe valor. Comprar o seu produto, de modo a que se sinta valorizado e impelido a produzir mais.

É preciso uma eficaz assistência técnica para que o tomate que dá apenas uma vez ao ano passe a dar pelo menos 3 vezes. Isso é possível com o conhecimento tecnológico que existe”, sugeriu o presidente da Câmara de Comércio Angola-China. Para ele, no campo reside a salvação do país, porque mesmo não estando nos meandros da gestão do erário, conclui que o país tem cada vez menos recursos para sustentar a importação, que foi até agora a principal fonte de bens de consumo para a sobrevivência da população.

Outra saída, na visão de Arnaldo Calado, é o sector do turismo, desde que sejam dedicados saberes a organizar uma verdadeira indústria que dê melhor proveito das potencialidades naturais e históricas. “Você acredita que 40 anos depois não fomos capazes de colocar casas de banho em praias tão atractivas como o Mussulo e Ilha de Luanda?”, Interroga-se Calado.

“Não há turismo do mar quando as pessoas defecam na própria água. Até isso não fomos capazes de mudar, simplesmente porque o ritmo de entrada dos dividendos do petróleo e diamantes eclipsou as outras possíveis fontes mais sustentáveis de que o país é detentor”, disse em guisa conclusiva.

Sobre a retoma de actividade dos filiados na agremiação que dirige, Arnaldo Calado diz que “podem ter acontecido reaberturas tímidas, mas o grosso de filiados ainda está profundamente afectado pelo espetro do medo” e aguarda por melhores sinais para a retoma da actividade. OPAIS

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