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Segunda, 15 Agosto 2016 12:20

Em busca das divisas evaporadas... nas redes sociais

Há pelo menos quatro anos que Angola vive uma profunda crise de divisas. As transferências de verbas para o exterior através da banca comercial são pouco mais que inexistentes... 

Estão reunidos os ingredientes para o surgimento do "desenrascanço". E as redes sociais são um dos seus palcos maiores. A maior parte são pequenos truques para acorrer a uma emergência. Mas cresce, no entanto, o espaço para os agiotas. O perigo espreita nos aparentemente inofensivos grupos do Facebook.

"Olá. Preciso com urgência de 500 euros ou 700 dólares. Alguém tem? Pago o preço da rua e dou mais 20 kwanzas!". É desespero ou aceitar as regras do mercado? Provavelmente ambas. Mas as redes sociais estão cheias de angolanos e estrangeiros com propostas deste género. E, quando as coisas estão neste estado, lá aparecem os agiotas a oferecer empréstimos "extraordinários" para poder ir de férias, pagar a propina dos filhos ou ir tratar da saúde ao exterior.

Os grupos no Facebook dedicados ou dirigidos especialmente aos chamados expatriados não servem apenas para desenrascar um contacto ou saber onde comer o melhor hambúrguer de Luanda ou do Lubango...

Nos últimos dois, três anos, têm serviço muito para encontrar divisas. Há mesmo quem, no limite da fadiga de procurar, ofereça valores superiores ao câmbio praticado no mercado informal.

Todo este cenário é propício ao surgimento de outros aproveitadores das crises: os agiotas. Basta percorrer por uns minutos esses grupos nas redes sociais para se verificar que há, quase sempre, umas senhoras com bom aspecto ou uns senhores com ar de avozinho a oferecer, "de forma honesta e cheia de bondade" os seus préstimos como... agiotas.

E um agiota é o que é: um indivíduo que empresta dinheiro fora do sistema legal com taxas de juro muito superiores às do sistema bancário.

Serviços estes que, como engodo, apresentam taxas de juro aparentemente vantajosas para o tomador do empréstimos mas que, depois, por artimanhas que superam em muito a capacidade de compreensão de pessoas pouco habituadas a estes descaminhos, estas são envolvidas numa teia que as deixa indefesas, muitas vezes sob ameaça directa à sua integridade física.

Por exemplo, esta oferta num desses grupos: "Olá/Senhor, Senhora. Eu sou um ex-advogado, aconselho-te para seus pedidos de empréstimo de dinheiro entre individuais você contatar o Senhor (nome de um indivíduo), este grande homem é generoso e ajudar as pessoas que estão em necessidade, testemunhar a seu favor porque ajudou a minha irmã que está em necessidade, a fim de pagar um novo lar, então ela falou com ele, e este senhor fez um empréstimo de 98.000euro ,com uma taxa de juros de 2%, então recomendo que você entrar em contato com o seu empréstimo de dinheiro entre aplicativos individuais".

E, como este, há dezenas ou centenas de "generosas" ofertas de empréstimos. Acontece que estas histórias, provocadas por situações de desespero ou de ignorância, se transformam em dificuldades com que as pessoas nunca... sonharam. Por exemplo: aqueles 2% de juros descritos no parágrafo de cima, não o dizendo, pode significar 2% ao mês, o que resulta em 24% ao ano, o que dá, em cima de cem mil euros, cerca de 24 mil euros a pagar ao ano.

Entre amigos

Mas nem tudo tem este lado pesado e, por vezes, até perigoso. Os grupos das redes sociais também são utilizados para verdadeiramente encontrar solução para pequenos problemas de momento, como desenrascar umas centenas de dólares ou euros para ir de férias ou para ocorrer a uma qualquer emergência, seja de angolanos com familiares no exterior, seja de expatriados a precisar de divisas para pagar a prestação da casa ao banco...

E pedir informação sobre o câmbio em vigor na rua num determinado momento, como este pedido apanhado aleatoriamente pelo Novo Jornal Online num desses grupos de Facebook, "Alguém pode por favor dizer-me como está o câmbio do euro e do dólar?"

E a resposta não se fez esperar: "100 euro custa 63.000.00 Akz E 100 Usd varia de 50 a 55.000.00 Akz. No mercado paralelo ou informal se preferir. Boa tarde". Para quem está há alguns anos em Angola, esta informação pode parecer supérflua, mas quem está há pouco no país, pode ser muito importante. Só faltou informar que é ilegal adquirir divisas no mercado paralelo.

Outros pedidos são de semelhante utilidade na resposta e sem ferir quaisquer leis do país. Por exemplo, este: "Gostaria de saber se sabem quais os bancos que estão a emitir novos cartões Visa e a carregá-los. Obrigado". Só que, aqui, a primeira resposta foi: "Isso é miragem!".

O que não é ficção são os avisos recorrentes das autoridades, tanto em Angola como no resto do mundo onde este fenómeno ocorre, normalmente em países assolados por crises financeiras, como o caso de Angola, para os riscos envolvidos no recurso a empréstimos oferecidos na internet bem como para o recurso ao mercado paralelo para se obter divisas.

E Angola, depois de rebentar a crise com origem na queda abrupta do preço do petróleo nos mercados internacionais - um boa imagem para este problema é a curva do preço entre Junho de 2008, quando o barril chegou aos 147 dólares, a Fevereiro deste ano, onde caiu para a casa dos vinte, viu as divisas evaporarem da banca comercial, primeiro, e, depois, também do mercado paralelo, embora este nunca tenha secado por completo.

O fenómeno da busca de soluções nas redes sociais para a falta de divisas teve, no entanto, em Angola um forte crescimento a partir de 2012, ano em que o barril desceu dos 100 USD, iniciando uma vertiginosa descida até aos 27 USD de Janeiro desde ano. Actualmente está na casa dos 40 USD.

Mas há esperança. O Banco Nacional de Angola disponibilizou na última semana 29 milhões de euros para salários dos expatriados, num total de 770 milhões de dólares distribuídos por diversos sectores, nomeadamente a importação de alimentos.

NJ

 

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