A iniciativa visou atender a um pedido que a PGR angolana endereçou à sua congénere portuguesa, através de uma carta rogatória, ao que esta instituição encaminhou à Polícia Judiciária (PJ) para dar o devido tratamento, dado que o cidadão em causa se encontra a residir neste país europeu há anos.
As declarações de Paulo Cascão, que foi ouvido na condição de declarante, já se encontram em posse da juíza-presidente da causa, Anabela Vanlente, que conduz o julgamento envolvendo o antigo ministro de Estado e Chefe da Casa Militar do então Presidente da República e o antigo consultor deste órgão, e vão ser lidas na audiência agendada para o dia 30 do corrente mês.
Paulo Cascão tornou-se uma peça fundamental deste processo pelo facto de o Ministério Público (MP) ter apontado que a empresa que dirigia, a Delta Imobiliária, participou de um esquema “de contrato de reembolso” que terá possibilitado um desfalque de mais de 200 milhões de dólares ao Estado, por via da Sonangol Imobiliária, subsidiária da petrolífera nacional.
De acordo com a acusação, a empresa Delta Imobiliária é propriedade do engenheiro Manuel Vicente e dos generais Kopelipa e Dino, através do grupo A4, em que são representados pelo cidadão Isménio Coelho Macedo, e a mesma tinha como administrador único Paulo Cascão.
Diz ainda a acusação que o esquema começou com a passagem da titularidade dos imóveis, alegadamente construídos com fundos públicos, à empresa Chi na Internacional Fund. (CIF) Hong Kong, representada no acto pela empresa Delta Imobiliária, por orientação de Manuel Vicente, em prejuízo do Estado angolano.
O referido contrato passava assim a propriedade, a coordenação e a gestão do projecto habitacional à referida empresa. Este foi o primeiro acordo celebrado pelas duas entidades, envolvendo a empresa Sonip, que lesou o Estado.
Contratos de reembolso e os desfalques
"O contrato atesta falsamente que a China Internacional Found Hong Kong, em nome da Sonip limitada, construiu os seis edifícios com fundos próprios, no valor de 207 milhões, e que esta devia devolver os fundos gastos, ao qual atribuíram o nome do contrato de reembolso", lê se no documento.
No entanto, conforme consta na peça processual que sustenta o julgamento, o Estado pagou o valor que lhe estava a ser exigi do à CIF Hong Kong que, por sua vez, transferiu a referida propriedade à Sonip limitada, já na base do citado contrato de reembolso, no ano 2011. Neste mesmo ano, as partes voltaram a sentar à mesma mesa para celebrar um novo contrato envolvendo os mesmos edifícios e comum preço ligeiramente mais elevado: 268 milhões, 347 mil e 200 dólares.
Conforme o MP, este segundo contrato consistia no reembolso dos custos pela construção de 18 edifícios, com um total de 216 apartamentos, equipamento social e infraestrutura pública, concretamente, dois clubes, quatro piscinas e espaços para estacionamentos. Essa situação fez com que, em 2013, quando a Delta Imobiliária comercializou ao público em geral os apartamentos nas centralidades do Sequel, Kilamba, do Km 44 e do Zango 0, existisse alguma diferença nodestinodos fundos arrecadados. Pois, os apartamentos comercializados no Zango 0 não eram os do Estado, mas sim da CIF Hong Kong.
"A empresa CIF Limited apropriou-se dos 24 edifícios do Estado, construídos pela empresa Guangxi, na centralidade do Zango 0, contratou a empresa Delta Imobiliária, que os vendeu à Sonangol EP, através da Sonip limitada, mediante orientação do engenheiro Manuel Vicente, pelo valor global de 475 milhões, 347 mil e 200 dólares", detalha a acusação.
General Kopelipa e Manuel Vicente em sua defesa
O general Kopelipa, antigo ministro de Estado e Chefe da Casa Militar do então Presidente da Repùblica, confirmou, aquando do seu interrogatório, em tribunal, ser acionista da empresa A4 Internacional que, por conseguinte, era sócia maioritária da Delta Imobiliária. Entretanto, atestou que não participou em nenhuma assembleia de sócios em que foi aprovado o estabelecimento de algum vinculo entre esta e a Sonip.
"Enquanto acionista da A4, não tive contacto nem assinei contrato de reembolso entre a CIF e a Delta Imobiliária", frisou, salientando que este processo resultou de uma decisão do administrador da Delta com o então PCA da Sonangol, Manuel Vicente.
O general Kopelipa afirmou também que desconhecia esse acordo celebrado entre a Delta e a Sonip e que em momento algum lhe foi informado a respeito, pelo que só tomou conhecimento do mesmo ao consultar os autos do processo em julgamento.
Por outro lado, assegurou que nenhum pagamento foi feito na conta da Delta Imobiliária, dado que, apesar de ter sido intermediária, os pagamentos foram feitos directamente entre a empresa Sonip e a CIF Hong Kong.
Já Manuel Vicente, antigo coordenador da Comissão de Negociação entre Angola e o grupo CIF Hong Kong, refutou também a acusação do Ministério Público (MP), segundo a qual ele e os generais Kopelipa e Dino engendraram tal plano para desfalcar avultadas somas monetárias ao Estado, envolvendo o projecto habitacional Vida Pacífica.
Conforme assumiu nas declarações feitas à Direcção Nacional de Investigação e Acção Penal (DNIAP), órgão da Procuradoria-Geral da República (PGR), em Agosto e Novembro de 2020, foi ele, enquanto PCA da Sonangol, quem autorizou a Sonip a adquirir, à CIF, 24 edificios para alojar os seus funcionários.
Porém, diz que nunca teve conhecimento de que os edificios vendidos na Vida Pacifica à Sonangol são os mesmos que a petrolífera estatal terá financiado para a construção do Zango 0, tal como refere o MP. OPAIS