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Sexta, 17 Mai 2024 13:10

Portugal “sem expressão” para travar “guerra desenfreada” entre potências em África – analista

Um analista angolano disse hoje à Lusa que China, EUA e Rússia estão numa “guerra desenfreada” pelo espaço de influência militar em África, incluindo países lusófonos, onde Portugal “não tem expressão político-militar” para contrapor.

Com a China, Estados Unidos (EUA) e Rússia em “competição normal” no continente africano, o especialista em relações internacionais Osvaldo Mboco recordou que os russos prestaram apoio militar a alguns movimentos de libertação como o MPLA (no poder, em Angola) e a Frelimo, em Moçambique.

“É notável que hoje os russos continuam a manter uma presença muito ativa no continente africano sempre na dimensão militar, ou seja, apoiam alguns governos e, principalmente, aqueles países onde existiram golpes de Estado recentemente, no Mali, Burkina Faso, Níger, com a entrada do Grupo Wagner”, disse o analista à Lusa.

Para Osvaldo Mboco, a Rússia está a recuperar uma presença acentuada do ponto de vista armamentista a nível de África e concorre neste segmento com os EUA, cuja administração do Presidente, Joe Biden, faz agora uma “inversão” na política externa face a África, contrária à posição do antecessor, Donald Trump.

Existe uma “guerra desenfreada entre as três grandes potências, que se fundamenta em dois pilares: a procura de espaço de influência a nível do continente africano e também a tendência de reduzir ao máximo o campo de atuação de cada uma”, apontou.

“Se os EUA têm uma corrida armamentista com a Rússia a nível do continente africano, os EUA têm uma corrida comercial com a China (…), e é normal que a Rússia nesta competição entre os Estados procure maximizar o seu espaço de atuação”, argumentou.

Mboco recordou o recente acordo entre São Tomé e Príncipe e Rússia no domínio da defesa, observando que a Rússia ainda não perdeu, do ponto vista prático, esta sua posição em Angola, que já manifestou intenção de modernizar o exército com material bélico norte-americano.

“É um sinal de mudança de paradigma daquilo que é a cooperação militar do Estado angolano com a Rússia, ainda assim não é uma rotura (…), porque temos de sublinhar que, basicamente, o equipamento militar que Angola usa é do Pacto de Varsóvia”, notou.

De acordo com Osvaldo Mboco, neste posicionamento das referidas potências, sobretudo na África lusófona, Portugal “infelizmente” não tem expressão política ou militar para contrapor a estas potências, tal como França, Reino Unido ou Bélgica tiveram nas antigas colónias.

Mesmo a nível da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), Portugal “teria galvanizado melhor esta organização para ser um espaço de influência da sua atuação com as antigas colónias, mas a fraca capacidade industrial, económica e também comercial faz com que Portugal não tenha uma grande influência sobre esses países”, referiu.

“Então, não vejo Portugal a ser apartado daquilo que é a cooperação militar, porque também pouco ou nada tem para dar aos países da CPLP do ponto de vista militar”, concluiu.

João Gonçalves, também especialista em relações internacionais, sinalizou igualmente que a presença russa em África, sobretudo em Angola, já data desde o período da ex-União Soviética, alertando os países africanos a “abrirem os olhos” ante as posições geoestratégicas das grandes potências.

Entende que países africanos devem buscar dividendos políticos e económicos, perante a “apetência” da China, Rússia e os EUA, exortando as autoridades angolanas a “negociarem com seriedade” a construção do Corredor do Lobito, infraestrutura ferroviária que atravessa Angola ligando o Porto do Lobito, na costa atlântica, à fronteira com a República Democrática do Congo e Zâmbia e que conta com financiamento norte-americano.

Angola “deveria aproveitar a luta entre China, Rússia e EUA para ter um posicionamento que deve passar por negociar com muita seriedade com esses países para tirar dividendos”, salientou o analista de assuntos africanos.

“Eles é que precisam de nós”, frisou, referindo que os norte-americanos estão muito interessados no Corredor do Lobito devido aos minerais críticos aí existentes, sobretudo no chamado “Copperbelt” (cinturão de cobre da África Central) que possui “todo o coração do futuro do mundo”.

“Então, Angola [é] que deve ver quais são os seus benefícios, ler e reler os acordos que se vão assinar para depois não se vir a lamentar. Precisamos de investimentos russos, americanos e chineses, mas no sentido de não nos neocolonizar, no sentido de parceria 'win-win'”, rematou João Gonçalves.

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