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Terça, 02 Agosto 2022 20:09

Eleições 2022: Deficiente organização vai provocar votação injusta e contestação - analistas

A organização das próximas eleições em Angola, em 24 de agosto, “não foi transparente nem respeitou a legislação angolana aplicável”, pelo que “não serão justas, livres nem pacíficas”, concluíram hoje participantes numa videoconferência.

Promovida pelo Instituto de Estudos de Segurança (ISS, na sigla em inglês), da África do Sul, e pela Fundação Hanns Seidel, da Alemanha, a videoconferência pretendia avaliar até que ponto “Serão as eleições em Angola uma disputa justa?" e a resposta foi unânime: não vão ser.

Borges Nhamirre, jurista e pesquisador no Centro de Integridade Pública de Moçambique e consultor do ISS de Pretória – o único não angolano do painel de conferencistas -, antecipou dois cenários.

No primeiro, o MPLA, partido no poder em Angola desde a independência, em 1975, ganha e haverá manifestações de protesto devido à dimensão da fraude que antecedeu o período pré-eleitoral e o processo de transmissão e compilação dos resultados e, no segundo, ganha a UNITA, principal partido da oposição, mas o MPLA recusa uma transição pacífica e haverá manifestações de protesto.

“A Comissão Nacional Eleitoral [CNE], que tem a competência legal de organizar a votação, e o Tribunal Constitucional [TC], que tem as competências de Tribunal Eleitoral e sobre cujas decisões não há recurso, já provaram que não são independentes”, afirmou.

Borges Nhamirre recordou que faltam 22 dias para a votação e que as autoridades angolanas “ainda vão a tempo de levantarem as barreiras que permitiriam a observação eleitoral independente”.

“A Comunidade de Desenvolvimento da África Austral [SADC, na sigla em inglês] devia fazer duas coisas: uma é pressionar o Governo angolano para convidar missões independentes de observação eleitoral e a segunda é falar com os partidos políticos e a coligação [concorrentes às eleições de 24 de agosto] para prevenir a violência pós-eleitoral”, advogou.

Nhamirre referiu que esteve recentemente em Angola e falou com “muita gente”, desde os condutores de táxis a vendedores ambulantes, e a opinião que recolheu é que “as pessoas querem a mudança”.

“Não confiam na CNE nem no TC, o que quer dizer que não confiam nas eleições”, acrescentou.

Outro participante, José Gama, ativista baseado na África do Sul, analista e editor do Club-K, um portal de acompanhamento da situação social e política em Angola, defende que “a credibilidade das eleições está fora de questão” e deu vários exemplos.

O primeiro assenta na impossibilidade de uma eventual contestação aos resultados da votação, designadamente, numa ou várias assembleias de voto.

“A CNE é o único órgão de organização de eleições que não divulga os resultados a nível das assembleias de voto. Dá apenas os resultados a nível municipal e provincial, porque a empresa que continua contratar para a logística eleitoral, a espanhola Indra, e que aluga o ‘software’ em que são registadas essas votações leva-o consigo no final da votação, pelo que nem a CNE nem quem pretenda provar que houve fraude dispõe de resultados para anexar às queixas”, explicou.

Outro exemplo tem a ver com a transmissão das atas de voto, que não dispõem de espaço para registo do número de boletins de voto em cada assembleia de voto e do total de boletins que não foram utilizados.

José Gama deu ainda como exemplo o desrespeito legal da publicação até 30 dias da votação das listas de eleitores e respetivas assembleias de voto.

”Há milhões de eleitores que ainda não sabem onde podem votar e os mortos continuam a figurar na lista de eleitores”, acrescentou.

Por seu lado, Fernando Macedo, professor de Ciência Política e Direito Constitucional na Universidade Lusíada de Angola, corroborou as denúncias dos outros dois conferencistas e acusou a direção do MPLA de “manter pessoas com uma cultura de incompetência, autoritária e sanguinária, que não hesita em eliminar os adversários políticos”.

“Não há vontade de mudança. O MPLA, um verdadeiro partido-Estado, domina o legislativo e o judiciário e a verdadeira cultura política de quem está no poder é a da perpetuação no poder”, frisou.

Mais de 14 milhões de angolanos, incluindo residentes no estrangeiro, estão habilitados a votar em 24 de agosto, na que será a quinta eleição da história de Angola.

Desde que entrou em vigor a Constituição de 2010 que não se realizam eleições presidenciais, sendo o Presidente e o vice-presidente de Angola os dois primeiros nomes da lista do partido mais votado no círculo nacional.

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