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Quarta, 21 Fevereiro 2018 10:17

As estranhas prioridades da Procuradoria-Geral da República

A 12 de Fevereiro do ano em curso, quando regressava do Governo Provincial de Luanda (onde tinha remetido a carta de comunicação da manifestação de 17 de Fevereiro, que foi realizada com sucesso nas ruas da Vila de Viana), recebi uma ligação de uma escrivã da Décima Terceira Secção dos Crimes Comuns do Tribunal Provincial de Luanda a solicitar que eu me deslocasse ao mesmo ‘para ser notificado’. Deixei claro que eu não iria ao tribunal (veja a nota de conversação no final do texto).

Eu fiquei tranquilo, como sempre, pois já estou habituado a ser alvo de acusações e processos. Só que, afinal, o Hitler também acabou recebendo a mesma ligação. Teve a mesma posição.

Dias depois o activista Benedito Jeremias Dalí, vindo do Moxico, onde conseguiu liderar a manifestação de 15 de Fevereiro, realizada com sucesso na cidade do Luena, recebeu uma ligação a solicitar que se deslocasse ao tribunal para que, lá, fosse notificado da acusação que pesa sobre si. O Dito decidiu não ir.

O processo (presumo) é aquele que foi aberto pela Procuradoria-Geral da República (PGR) no qual, por termos escrito frases de protesto nas camisas do uniforme prisional, esta entendeu que cometemos o “crime de destruição de património público” e o crime de “injúria” – o Processo das Camisas.

Então, quando eu concluí que a PGR regressara à sua nova temporada de palhaçadas, eis que fui informado de mais 2 processos palhaçásticos contra 3 jornalistas, a saber:

1 Rafael Marques de Morais: acusado de crime de injúria à pessoa do antigo e esquecível procurador-geral da república, João Maria de Sousa, por ter publicado no Maka Angola uma série de investigações sobre os negócios e as ilegalidades do então titular da PGR. O julgamento terá início a 5 de Março próximo. Nota: Rafael Marques foi preso em 1999 sob a acusação de ter difamado e caluniado o presidente José Eduardo dos Santos chamando-o de corrupto. Ao longo dos anos foi alvo de outros processos, sendo que um, o de 2015, quase o levou novamente à cadeia, mesmo tendo ficado clara a ausência de crime. Este processo foi movido por um grupo de generais.

2 Graça Campos e Severino Carlos: acusados de crime de injúria à pessoa do Ministro do Interior, Ângelo de Barros da Veiga Tavares. Os referidos jornalistas publicaram no Correio Angolense um texto sobre as arbitrariedades do referido ministro no seu pelouro. Nota: Graça Campos foi preso em 2007 sob acusação de ter difamado e caluniado o antigo ministro Paulo Tjipilica. Ao longo dos anos foi alvo de vários processos.

Só se pode perguntar: com tantas evidências que demonstram que Angola foi e continua a ser gerida por delinquentes, a PGR achou que não tinha mais nada a fazer senão levar avante processos contra os referidos jornalistas? A PGR acha que fica bem continuar a aventura do Processo das Camisas?

Se a PGR fizesse o seu trabalho como deve ser – e não fosse uma mentira – a esta altura Isabel dos Santos, José Filomeno dos Santos, Manuel Vicente e outros tantos delinquentes estariam na prisão a aprender que Angola não é casa das mães deles e que saquear o erário público é crime.

Mas não. A PGR insiste em prosseguir com aventuras judiciais que só a desprestigiam e levam os cidadãos a não acreditarem na mesma como instituição responsável em ser guardiã da legalidade.

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Nota: aqui vai a reprodução da conversa que tive com a secretária da Décima Terceira Secção dos Crimes Comuns do Tribunal Provincial de Luanda:

"Boa tarde, é o sr. Nuno Dala?"

Eu: "afirmativo".

"Daqui é a Secretaria da Décima Terceira Secção dos Crimes Comuns do TPL. O senhor deverá na quinta-feira deslocar-se ao Tribunal, no Golf, a fim de ser notificado".

Eu: "Desde quando é que o cidadão é que tem de ir ao tribunal para ser notificado. Isto é alguma brincadeira?"

"Não. Não é brincadeira. Acontece que não temos o seu endereço"

Eu: "O meu endereço é do conhecimento do tribunal, pois o vosso oficial de diligências tem-no há muito tempo. E mesmo que ele não tivesse o endereço, eu não teria de ir ao tribunal. Que o tribunal mande um oficial ir à minha casa para me notificar. Do contrário, não irei para o tribunal."

"Só que infelizmente, o nosso colega não tem os dados certos. E ele não está aqui."

Eu: "Então é problema vosso. Eu vir aí, na quinta-feira, para ser notificado? Que brincadeira é essa? Se o vosso colega que sabe o endereço afinal não o sabe e que, além disso, ele não está aí, isto é problema vosso".

"Mas pode dar o endereço?"

Eu: "claro, aqui vai: [_________________________] Vila de Viana, Município de Viana".

E a chamada terminou.

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