Chegar ao Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro, em Luanda, com o passaporte e um visto nas mãos continua a ser o sonho de muitos jovens angolanos que anseiam por emigrar, de preferência, para o continente europeu, na esperança de uma vida melhor.
João Daniel, residente em Menongue, lembra que a emigração de jovens não é algo novo: "Já existe há bastante tempo e, se calhar, nós não tínhamos oportunidades para prestarmos atenção a isso. Muita gente já emigrou, tanto no tempo da guerra como no tempo de paz.
Mas hoje, em função das redes sociais, isso tornou-se mais visível: "Podemos verificar os jovens a saírem [de Angola] à procura de condições de vida", acrescenta.
"É o país que perde"
As constantes saídas de jovens angolanos para outros países, preferencialmente da União Europeia (UE), estão profundamente relacionadas com as condições sociais, políticas e económicas do país, afirma o jornalista Marcolino Chiungue.
"Há uma degradação cada vez mais acentuada do nível de vida. É insustentável continuar a viver em Angola", avalia.
E nota-se um "anseio" de cidadãos em idade ativa de saírem de Angola "para tentarem a vida noutros países que eles julgam oferecer melhores condições de vida, poder de compra e acesso aos diferentes serviços com a qualidade desejada", enumera o jornalista.
O que fazer e que políticas se devem criar para travar a saída, numa altura que os políticos defendem que o país precisa de todos para o seu desenvolvimento?
O autor João Daniel diz que, com esta emigração de angolanos para o exterior, "é o país que perde".
"É necessário criar políticas para aliciar os jovens, sobretudo de emprego, salário, melhores condições de vida, acesso à habitação, a transporte, estudos de qualidade. Estas condições podem contribuir para prender as pessoas", considera.
Dificultar a saída
Em janeiro de 2019, o Executivo subiu o preço da taxa para obtenção do passaporte ordinário, que passou de três mil kwanzas (3 euros) para mais de 30 mil kwanzas (35 euros). A medida, na altura, levou mais de meia centena de angolanos a protestar nas ruas de Luanda.
Nos últimos anos, também não tem sido possível o levantamento do passaporte em 90 dias - há recibos que mostram que há quem fique à espera do documento durante seis meses ou até um ano.
O académico e ativista Cruz de Deus, residente no Huambo, diz que nem estas medidas vão conseguir travar o sonho de muitos jovens.
"Seria bom que o Estado traçasse políticas objetivas para poder travar a saída desta juventude, que se verifica quase todos os meses. Se o Estado não traçar políticas objetivas, se não criar condições para poder enquadrar estes jovens, claro que não vamos conseguir travar esta emigração que, em grande medida, prejudica o país, porque são quadros valiosos que deviam dar o seu contributo à terra de origem", afirma Cruz de Deus.
"Temos amigos e companheiros na Europa que dizem que preferem ficar por lá, não importa que seja como motorista ou trabalhador de limpeza, pois têm um salário condigno", acrescenta.
"Fuga de cérebros"
Marcolino Chiungue sublinha que a chamada "fuga de cérebros" está a prejudicar Angola, porque representa a saída de alguns dos melhores quadros. E não se vislumbrando melhorias, antevê mais emigração no país, que comemora mais de duas décadas de paz.
"Há muita incerteza sobre isso. É preciso melhorar as condições no setor da saúde, com serviços médicos de qualidade; é preciso um salário com o qual o cidadão consiga realmente ter poder de compra e oferecer às pessoas estabilidade financeira, permitindo-lhes fazerem alguma poupança. É preciso ainda um serviço de educação de qualidade que possibilite que as pessoas possam deixar os seus filhos na escola", refere o jornalista.
"Penso que tudo isso poderá ajudar a impedir que estes jovens saiam do país", conclui. DW