"Já ouvimos oito dos dez réus, que se declaram inocentes, e estamos sempre a falar de generalidades [acusações], de pessoas que estão aqui por que pertenciam à igreja. Por isso não espero muito da audição do senhor Kalupeteka", admitiu o advogado David Mendes, que lidera a equipa de defesa.
O julgamento arrancou na segunda-feira, no tribunal do Huambo, e deverá concluir a audição dos arguidos - seguem-se os declarantes - na quinta-feira, sobretudo na expectativa de ouvir o líder da seita, José Julino Kalupeteka.
Kalupeteka, nome pelo qual também é conhecida a seita "A luz do mundo", está detido preventivamente na sequência dos confrontos na Caála, província do Huambo, que levaram à morte, segundo a versão oficial, de nove polícias e 13 fiéis, a 16 de abril.
Em causa estão os confrontos entre os fiéis e a polícia, cujos agentes tentavam dar cumprimento a um mandado de captura - na sequência de outro caso de violência na província vizinha do Bié e que também está a ser julgado - de Kalupeteka e outros dirigentes e alguns dos seguidores que estavam concentrados no acampamento daquela igreja, no monte Sumi.
A oposição angolana denunciou na altura a existência de centenas de mortos entre os populares e pediu uma investigação internacional, acusações e pretensão negadas pelo Governo.
"Ele [líder da seita], logo em abril, já era uma pessoa condenada na praça pública, mas acho que as coisas já não estão a correr exatamente assim. Também é certo que há sempre surpresas nestes processos", disse ainda David Mendes, também dirigente da associação Mãos Livres, de defesa dos direitos humanos, que se prontificou para assegurar a defesa destes elementos.
A acusação deduzida pelo Ministério Público (MP) do Huambo contra os homens, com idades entre os 18 e os 54 anos, manteve-se inalterada no despacho de pronúncia.
O MP do Huambo refere que as mortes dos agentes da polícia resultaram essencialmente de agressões com objetos contundentes, inclusive paus, punhais e catanas, às quais alguns polícias responderam com disparos.
Neste processo, Kalupeteka - de 46 anos e detido preventivamente desde abril - é o principal visado e está indiciado pela coautoria material de nove crimes de homicídio qualificado consumado, crimes de homicídio qualificado frustrado e ainda de desobediência, resistência e posse ilegal de arma de fogo.
Os restantes elementos são visados igualmente por crimes de homicídio qualificado consumado e frustrado.
O julgamento decorre sob forte aparato mediático e policial, este último considerado "exagerado" pela defesa.
A seita em causa, não reconhecida pelo Estado angolano, era conhecida por advogar o fim do mundo em 2015 e não permitir a alfabetização ou vacinação dos fiéis, tendo sido criada por José Julino Kalupeteka em 2006, depois de este ter sido expulso da Igreja Adventista do Sétimo Dia.
Lusa