Ao longo do Corredor do Lobito, em províncias como Benguela, Huambo e Bié, começam a surgir investimentos europeus inseridos no projeto ferroviário que visa ligar Angola à República Democrática do Congo (RDC) e à Zâmbia. O comboio já transporta diversos produtos agrícolas angolanos e exporta minerais através do corredor é uma realidade.
No entanto, Angola e as comunidades locais ainda não colhem grandes benefícios dos investimentos, conforme reconhecem representantes da sociedade civil e a própria União Europeia (UE).
Moisés Festos, da organização não-governamental (ONG) Development Workshop (DW), recomenda que a prioridade seja dada aos membros das comunidades locais relativamente às oportunidades de emprego que envolvam mão de obra não especializada.
Segundo Festos, apenas quando houver necessidade de trabalhadores qualificados se deve contratar mão de obra fora das comunidades. "Aí sim poderá recorrer-se fora das comunidades. Mas aquilo que estamos a defender – a mão de obra que existe localmente – deve ser considerada em primeiro lugar nas comunidades diretamente afetadas”, afirma.
Maior divulgação
Moisés Festos também defende uma maior divulgação dos benefícios do Corredor do Lobito às populações locais e manifesta preocupação com o futuro das terras comunitárias ao longo da linha férrea. "Nós, como sociedade civil, ainda não vimos nenhum impacto significativo a favor das comunidades ao longo do Corredor do Lobito", alerta.
João Misselo da Silva, consultor da Câmara de Comércio e Indústria de Angola, também reconhece que ainda não há resultados palpáveis, mas destaca a vontade política do Governo e dos seus parceiros internacionais, nomeadamente a União Europeia e os Estados Unidos, em atrair investimentos para o projeto.
"As comunidades devem ser envolvidas, tanto na conceção como no desenvolvimento de políticas voltadas aos diferentes tipos de investimentos" diz o consultor, acrescentando que é também necessário promover um diálogo mais articulado e coordenado entre todos os atores, para que se promova a boa governação e a defesa dos direitos humanos.
Certificação internacional
Os produtores nacionais ainda não começaram a exportar para fora do continente. A exportação de bens produzidos em Angola através do Corredor do Lobito deverá ser uma realidade em breve, mas há preocupações com a certificação exigida pelos mercados internacionais.
O empresário angolano Luís Assis, que produz milho em grande escala, pede apoio da UE nesse processo. "Estamos a caminhar para uma fase em que, num futuro próximo, vamos querer exportar, e a UE tem exigências em termos de certificação", lembra. Por isso, solicita o apoio do bloco na facilitação desse processo "para que os produtos angolanos atendam aos requisitos europeus", precisa.
Durante uma visita ao Corredor do Lobito nas províncias do Huambo e Bié, a embaixadora da União Europeia em Angola, Rosário Bento Pais, garantiu que o abacate angolano não precisa de certificação para entrar na Europa,embora demais produtos, sim. A embaixadora deu conta que um laboratório já foi instalado em Luanda para esse fim.
Rosário espera que o processo de certificação se inicie ainda este ano. Sobre os ganhos já alcançados, a embaixadora frisou que o projeto está apenas a começar. Atualmente, o corredor transporta mercadorias para o porto do Lobito e enxofre para o Congo.
"O investimento da União Europeia é um projeto de desenvolvimento económico. A ideia é criar bases para que as comunidades tenham emprego, formação e competências, para que possam ser absorvidas pelas empresas que aqui se instalarem", explicou Bento Pais. "Isso é o que representa o projeto europeu para o Corredor do Lobito.”
A representante diplomática sublinhou ainda que a União Europeia está a trabalhar para atrair mais investidores privados ao longo do corredor.
Primeira exportação de abacate
"O Corredor do Lobito não se constrói de um dia para o outro”, avisou, referindo que neste momento, o projeto funciona como infraestrutura de transporte. "A concessão foi atribuída a um consórcio europeu formado por empresas de Portugal, Bélgica e Suíça. O porto do Lobito, por sua vez, está a ser gerido por uma empresa franco-italiana. Esses investimentos mostram o compromisso europeu com o desenvolvimento da região, em parceria com o Executivo angolano e as comunidades locais", adiantou a diplomata europeia.
Já o secretário de Estado angolano para os Transportes Terrestres, Jorge Bengue, aponta como ganho a possibilidade de os agricultores escoarem os seus produtos por via-férrea, evitando perdas provocadas pela falta de estradas. Bengue destaca ainda a preparação da primeira grande exportação de abacate angolano para os Países Baixos.
"Temos ganhos concretos. Naturalmente, ainda é prematuro fazer uma análise profunda, mas as primeiras impressões são exatamente aquilo que estamos a constatar", afirma. "Hoje, quando visitamos o Corredor, não vemos apenas mapas e intenções. Vemos coisas concretas", precisa. DW Africa