Em fevereiro de 2025, a confirmação de tudo que foi escrito em 2024 veio por parte dos Estados Unidos, precisamente de um renomado analista político americano e entusiasta de assuntos africanos, Will Barns. Seria arrogância ou postura com base em factos objetivos?
Segundo postagem na rede social X, Will Barns, que é conhecido não somente pelas suas opiniões como também por expressar com precisão a visão da Casa Branca sobre questões geoestratégicas em África, referiu-se ao PR João Lourenço nos seguintes termos na língua de William Shakespeare: “o ditador João Lourenço... foi o recipiente número um dos investimentos americanos na África, com parte significativa deles terminando em seu bolso”.
O analista político americano vinculou os investimentos dos Estados Unidos em Angola com os investimentos feitos em outros países, especialmente na Ucrânia e na Colômbia, colocando o PR João Lourenço num mesmo “barco” que o presidente Zelensky e o colombiano Gustavo Petro. Ao falar de líderes africanos, Will Barnes faz questão de dizer que “especificamente, o ditador angolano João Lourenço”, e conclui a postagem com as hashtags #corruption, #USPolicy, #Africa e #Angola.
A postagem de Will Barnes não se trata de mera opinião pessoal, mas de como a Casa Branca não ignorou a ocorrência de diversos factos ocorridos sob a administração de João Lourenço, por exemplo o favorecimento de uma empresa internacionalmente condenada por diversos esquemas de corrupção como a Trafigura, que opera o Consórcio LAR que gere o Corredor do Lobito. O silêncio do governo angolano quanto aos casos de corrupção envolvendo a Trafigura foi recordado em importante matéria da publicação “A Voz da América” ainda em janeiro. Por mais que o SIC seja acusado de praticar a censura contra a imprensa independente de Angola, os americanos e outros povos têm seu próprio exército de jornalistas que monitora e estuda países africanos, incluindo Angola.
Não é nenhuma novidade para os americanos que há grandes escândalos de corrupção que incendeiam os noticiários de Angola, por exemplo a nomeação da filha de João Lourenço e o último deles, um dos mais graves, um escândalo envolvendo a ministra das finanças Vera Daves. Para a UNITA, o caso do desvio dos 7 mil milhões de kwanzas subtraídos dos cofres do Estado por funcionários da Administração Geral Tributária (AGT) "é uma prova inequívoca das debilidades e da insegurança do sistema financeiro nacional, marcadamente afectado pelos esquemas de corrupção que enfermam as instituições e o Governo de Angola", vindo a solicitar “sérias investigações”. Até o presente momento não há nenhuma conclusão decisiva e nem investigações encerradas.
Como um governo como o de Angola quer receber investimentos externos tendo em seu próprio ministério graves casos de corrupção? A análise feita por Will Barnes toma em conta factos que não são bem vistos nos Estados Unidos, em especial questões tributárias, consideradas sagradas não somente para Estado americano, como para o americano médio, pois naquele país não pagar os impostos (ou desviá-los) é considerado crime gravíssimo em vários Estados daquela federação. O MPLA comete um erro gravíssimo aos olhos do país de Benjamin Franklin não somente no plano diplomático e político, mas no plano cultural.
As declarações do jornalista americano deveria ser motivo de preocupação para todos os angolanos e não apenas o MPLA, pois a se tratar de uma voz oficial da Casa Branca sob a administração de Donald Trump, isso significa não só uma mudança de retórica e de terminologia empregada, mas também de uma mudança da política externa dos Estados Unidos em relação ao continente africano e em especial Angola, significando que poderá haver em nosso país uma significativa pressão dos americanos no sentido de recuperar em Angola aquilo que eles veem hoje como “perda”, como “dinheiro dado a um país corrupto”, por exemplo a ruptura de acordos assinados com Angola, o que desmoralizaria fortemente a presidência e o governo do MPLA, a exigência de condições muito mais lucrativas para empresas leais ao governo Trump ou ainda a exigência do pagamento pelo “acordo manchado por corrupção” (segundo os americanos) com o petróleo angolano, tão cobiçado pela nova administração dos EUA.
A considerar que não existe nos Estados Unidos nenhum processo contra João Lourenço com ganho de causa para Washington, bem como, juridicamente falando, não há nenhum processo contra JLo comprovando crimes de corrupção, a postura do analista Will Barnes mostra a arrogância anglo-saxã típica da administração Trump, arrogância, entretanto, motivada pelas práticas antijurídicas e impopulares que mancharam a imagem de Angola.
Não há nada que possa ser feito quanto à forma como os EUA conduzem a sua política interna ou externa, mas há muito que possa ser feito quanto à forma como Angola conduz a sua própria política externa. Há que perguntar, por que JLo ignorou os múltiplos avisos e críticas da imprensa não-oficial com relação ao que fariam os americanos? Será que o presidente angolano ficou deslumbrado com os elogios tecidos pela imprensa oficial? Imprensa essa que falhou miseravelmente na arte de tecer análises objectivas, oferecendo em troca loas à presidência? Esse é mais um sinal de que Angola precisa de uma imprensa livre, mas principalmente rever urgentemente a sua política externa. António de Carvalho