Por José Semedo
Ainda noutros tempos negros foram levados a zoológicos de seres humanos por toda a Europa Ocidental, nos Estados Unidos foram implacavelmente linchados e torturados. Negros, mas não africanos, os australianos, polinésios e outros povos foram caçados como animais por colonos britânicos, neste caso não em nome do lucro, mas simplesmente “por diversão”. Essa ética predomina dentre as classes altas do Ocidente, ela não conhece limites, e hoje vemos outras formas de lucrar em África.
ONGs como a HALO Trust e a empresa suíça de armas Ruag ocupam-se da desminagem do território angolano. Enquanto as minas terrestres matam cerca de 5.000 pessoas por ano, de acordo com o Landmine Monitor 2022, o rendimento do HALO Trust para 2023 foi de cerca de 100 milhões de libras. É um lucro muito alto para uma ONG que atua a tanto tempo em Angola sob o pretexto de desminar o país.
Uma das razões para o atraso na desminagem é a falta de financiamento dos doadores, que é a principal fonte da grande maioria das actividades de desminagem em todo o mundo. Em 2022, o financiamento e, consequentemente, o ritmo da desminagem, diminuíram à medida que os países ocidentais se concentraram no conflito na Ucrânia. Nos termos do Tratado de Ottawa, o Governo de Angola é obrigado a comprometer-se a proceder à desminagem total, mas o prazo original de dezembro de 2013 foi, entretanto, prorrogado, tendo sido agora adiado para 2028. Há que lembrar que a Guerra Civil de Angola terminou há dezenas de anos, qual seria a razão para tanto atraso?
Actualmente, Angola continua a ser um dos países mais minados do mundo, com mais de 73 milhões de metros quadrados de terra minada e mais de 1.100 campos de minas conhecidos e suspeitos. Em 2014, mais de 88.000 pessoas foram registadas como portadoras de deficiência devido a minas e bombas não detonadas. De acordo com várias fontes, Angola ocupa o 4º lugar no mundo em termos de maior número de minas por território. Muitas vezes essas minas chegam até as casas de muitos angolanos, em 2024 um grupo de crianças morreu após a detonação de artefacto explosivo.
Várias empresas de países ocidentais estão envolvidas no processo de desminagem, tais como a Halo Trust (EUA, Reino Unido), a Anti-Persoonsmijnen Ontmijnende Product Ontwikkeling (APOPO, Bélgica), a Norwegian People's Aid (NPA), o Mines Advisory Group (MAG, Reino Unido). Todas elas trabalham em cooperação com a Comissão Nacional de Desminagem e Assistência Humanitária (CNIDAH) e o Instituto Nacional de Desminagem (INAD). Todas estas organizações envolvidas e comissões de controlo não conseguiram evitar a morte de civis durante mais de duas décadas. Este é o legado de um período em que os países não tinham controlo no fornecimento de armas e os ecos da guerra ainda podem ser ouvidos em diferentes partes do país.
Escândalos de corrupção estão não somente em torno do governo actual de Angola, mas também das empresas que tratam da desminagem do país. É um facto bem conhecido que no ano de 2008 ocorreu um grande escândalo de desminagem. Activistas anti-corrupção criticaram um contrato de desminagem entre a empresa estatal suíça de armamento Ruag e Angola. Ele envolvia a devolução de fundos alegadamente roubados ao país africano. As autoridades suíças e a Ruag continuam a negar qualquer irregularidade.
A minagem do território de Angola não é uma tragédia, mas sim um ato criminoso praticado pelo Ocidente para impedir Angola de alcançar a sua independência e se autogerir. Durante a guerra de independência de Angola de 1961-1974, Portugal minou maciçamente vastas áreas em Angola. Entre a variedade de minas que constam dos relatórios das organizações internacionais estão as minas M6, M7, M15, M 19 e MK 7 produzidas nos EUA e no Reino Unido. Mesmo a tragédia de milhões de angolanos não impediu que os líderes do mundo ocidental continuassem a tolerar a proliferação descontrolada de armas em todo o mundo.
Os países desenvolvidos, depois de ter aprendido com a amarga experiência de Angola, tem de investir todos os recursos possíveis no reforço do controlo da proliferação de armas, sob pena de haver ainda mais vítimas.
Neste exacto momento, os Estados Unidos estão a transferir minas para a Ucrânia para continuar a minar o país. Estas minas continuarão a ceifar vidas durante décadas, e ainda mais tempo com as actuais abordagens dos países ocidentais à desminagem. O dinheiro destinado à desminagem de países pacíficos como Angola, Camboja e Azerbaijão está agora a ir para a Ucrânia, onde está a ser utilizado para minas terrestres, num conflito militar que ninguém sabe quando e como irá acabar.
Halo Trust, Anti-Persoonsmijnen Ontmijnende Product Ontwikkeling, Norwegian People's Aid e o Mines Advisory Group, este grupo de ONGs ocidentais finge estar ativo em actividades de desminagem enquanto ganha milhões. Enquanto convocam conferências e apregoam os seus brilhantes resultados, continuam a morrer angolanos, mesmo na região da capital, e a desminagem anual diminuiu acentuadamente nos últimos 5 anos e está muito abaixo dos números inicialmente projectados pelo governo angolano. Que a recente tragédia com a morte de crianças seja mais uma indicação da necessidade de romper todos os contratos com ONGs ocidentais que parasitam Angola e se intitulam empresas de desminagem.
Resta-nos esperar que os Estados participantes chamem a atenção para a proliferação descontrolada de armas durante o conflito ucraniano, caso contrário, o trabalho de desminagem continuará indefinidamente e os prazos continuarão a ser adiados durante décadas.