A Trafigura reagia assim à decisão da Procuradoria-Geral (PG) suíça de levar a tribunal um antigo político angolano e dois ex-dirigentes da gigante multinacional de comércio de matérias-primas, salientando que está, há anos, a tentar resolver problemas relacionados com pagamentos feitos a intermediários e que resultaram em processos das autoridades brasileiras, suíças e norte-americanas.
Num comunicado enviado à Lusa, a Trafigura destaca que as investigações resultam, em parte, das declarações do seu ex-funcionário Mariano Marcondes Ferraz, no âmbito de um acordo judicial após ser condenado no Brasil.
No Brasil, a multinacional continua envolvida num processo cível.
Adianta ainda que pretende resolver, em breve, o processo aberto pelo Departamento de Justiça norte-americano sobre os pagamentos indevidos feitos no Brasil, tendo já constituído uma provisão de 127 milhões de dólares (117,6 milhões de euros) para a resolução deste caso.
Já no que diz respeito à Suíça, apesar da vontade da Trafigura (Trafigura BEHHER BV) de resolver o caso por vias extra-judiciais, este vai ser mesmo levado a tribunal.
Segundo a acusação divulgada no site da PG suíça, “um antigo responsável angolano é acusado de ter aceitado, entre abril de 2009 e outubro de 2011, subornos de mais de 4,3 milhões de euros e 604 mil dólares [559,5 mil euros], do grupo Trafigura, relacionado com as suas atividades na indústria do petróleo em Angola".
O processo envolve também o ex-diretor executivo da Trafigura Mike Wainwright e um antigo consultor do Grupo DT (uma joint venture na qual a empresa suíça detinha uma participação).
Citado no comunicado, o presidente executivo e CEO da Trafigura, Jeremy Weir, lamentou os “incidentes” que “violaram o código de conduta da Trafigura” e sublinha os esforços feitos para “incutir uma cultura de conduta responsável” na empresa.
Salienta também que, desde esse período (há mais de dez anos), a Trafigura pôs em prática programas de melhoria de ‘compliance’, incluindo formação obrigatória para todos os funcionários e proibição do recurso a intermediários para fazer negócios.
“Esses incidentes históricos não representam de forma alguma a empresa que somos hoje”, refere ainda no documento enviado à Lusa, acrescentando que as políticas e procedimentos de conformidade foram auditados externamente, considerando-se que atendem aos requisitos legais e aos padrões internacionais de boas práticas.
Na explicação da acusação, a PG afirma que abriu uma investigação contra desconhecidos em julho de 2020 devido a suspeitas de corrupção de autoridades estrangeiras e de lavagem de dinheiro relacionada com potenciais pagamentos corruptos a pessoas com responsabilidades públicas em Angola, mas explica que acabou por deixar cair a acusação de lavagem de dinheiro.
"Em agosto de 2021, a investigação foi alargada para incluir o primeiro réu, o antigo presidente executivo [Chief Executive Officer, no original em inglês] e membro executivo da Sonangol Distribuidora, uma subsidiária da companhia petrolífera angolana Sociedade Nacional de Combustíveis de Angola (Sonangol), por suspeitas de corrupção de autoridades estrangeiras", lê-se na nota.
Depois, entre janeiro e março de 2023, "a investigação criminal foi novamente alargada para incluir o segundo réu, um antigo intermediário do grupo Trafigura em Angola, e o terceiro réu, o antigo diretor executivo de operações [Chief Operating Officer, no original em inglês] e membro do conselho de administração da Trafigura BEHEER, ambos por suspeita de corrupção de autoridades estrangeiras, bem como a Trafigura BEHEER por suspeitas de corrupção de autoridades estrangeiras".
Na acusação, as autoridades judiciais suíças dizem que o esquema de corrupção que envolve a Trafigura em Angola poderá ter beneficiado a companhia suíça em 143,7 milhões de dólares (133,1 milhões de euros), por ter ganhado indevidamente contratos de frete e abastecimento de navios entre junho de 2009 e julho de 2010.
No período a que se refere a acusação, o presidente da Sonangol era Manuel Vicente.