Ao responder o questionário enviado pelo Jornal de Angola, Ivone Teixeira explicou que "o alegado valor supostamente doado à igreja nunca foi transferido, e que a IURD está à disposição da justiça para esclarecer a situação e repor a verdade”.
Ivone Teixeira disse que a Igreja solidariza-se com o lesado e sobretudo as crianças expostas, mas não reconhece a transferência do montante anunciado pelo lesado. A porta-voz da IURD lembrou que, em 2017, Adriano Gaspar doou, à Igreja Universal do Reino de Deus, em época de "Fogueira Santa”, uma vivenda com vários compartimentos e uma piscina, no município de Viana, em Luanda, bem como uma viatura de marca Land Cruizer, que a Igreja já restituiu.
Questionada sobre o que terá falhado para que as súplicas do crente não produzissem os resultados desejados, explicou que a Igreja não apregoa a propagação de milagres, mas sim, o evangelho da salvação e mudança de vida, através da prática da palavra de Deus.
Em declarações ao Jornal de Angola, Adriano Gaspar explicou que, em Setembro de 2020, endereçou uma carta à Igreja Universal do Reino de Deus, para reaver pelo menos dez por cento dos 700 milhões, e não obteve qualquer resposta positiva. "Na altura, queríamos que a Igreja Universal do Reino Deus nos devolvesse pelo menos 70 milhões de kwanzas, para retomar os negócios, mas não tive sucesso”, contou.
Ordem dos Pastores Evangélicos de Angola
O Bastonário da Ordem dos Pastores Evangélicos de Angola, Acúrcio Estevão, afirmou que o diferendo entre a Igreja Universal do Reino de Deus e o seu crente, Adriano Gaspar, não pode levianamente invocar a restituição dos valores, tão-pouco a existência da prática de algum crime de burla.
De acordo com o responsável, à luz da doutrina, quer do Direito, quer da religião, remete-nos à conclusão de que não obstante os recorrentes actos de exploração dos seus fiéis, bem como os crimes de que a confissão religiosa vem sendo acusada, que se pode pensar assim. "Foi o lesado que procurou pela confissão religiosa e passou a frequentá-la”, disse.
Para o responsável, tratando-se de uma divindade e espiritualidade, a fé torna-se por isso mesmo um elemento de ligação entre o que é perene e divino (Hebreus capítulo 11 versículos 1 até 6), e tendo em consideração as alíneas J) e K) do artigo 3º da lei 12/19 de 14 de Maio, o aludido património fora alocado no altar da Igreja Universal do Reino de Deus, como acto de fé e sacrifício, pelo que não se pode levianamente invocar a sua restituição e prática de algum crime de burla.
Acúrcio Estevão lembrou que o Código Penal Angolano, nos termos dos artigos 450º, 451º, 452º e 454º, refere que só se está diante de um crime de burla se confirmada a existência de um bem objecto de transacção ou acordo entre o suposto agente de crime e o lesado, não sendo possível a fruição dos direitos adquiridos por força do já referido acordo, facto que em razão da matéria não se consegue provar.
"As circunstâncias revelam a execução de um acto de fé, protagonizado de forma consciente e por um período mais do que suficiente, para que um cidadão, em pleno gozo das suas faculdades mentais, pudesse determinar a continuidade ou cessação das oferendas a favor da parte acusada”, sustentou.
A Ordem dos Pastores Evangélicos lamenta a condição sócio económica da família em causa, porém "não vemos nenhum respaldo legal que obrigue a parte acusada de restituir o aludido património, salvo se apresentados factos probatórios que sustentem a acusação, uma vez que, segundo o comunicado da Igreja Universal do Reino de Deus, trata-se de um cidadão por eles desconhecido”.
Processos na PGR
O porta-voz da Procuradoria-geral da República, Álvaro João, disse que existe uma investigação a decorrer contra a Igreja Universal do Reino de Deus em Angola. De acordo com o responsável, existem três processos em curso, abertos por ex-fiéis da IURD, mas não confirmou se está incluído o caso dos 700 milhões de kwanzas entregues à igreja, em troca da transformação espiritual de Adriano Gaspar.
Questionado se até que ponto a PGR pode investigar uma denúncia pública, o responsável explicou que é necessário que o ofendido apresente uma queixa-crime, assim como uma participação no piquete da referida instituição.
"Ao que me parece, os factos não constituem indícios de ilícito penal de natureza pública, pois nos crimes semi-públicos, o ofendido deve apresentar queixa-crime, porque o Ministério Público não tem legitimidade para abrir o processo de forma oficiosa, mesmo que os factos sejam expostos publicamente”, esclareceu.
Segundo Álvaro João, nestas situações o critério legal é a natureza pública do crime e não a exteriorização dos factos à sociedade.