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Segunda, 20 Julho 2020 15:16

Bispos angolanos da IURD acusam liderança brasileira de querer manchar imagem do Governo

Os bispos e pastores angolanos da Comissão de Reforma da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) acusaram hoje a ala brasileira de promover, nas últimas três semanas, campanhas de desinformação para manchar a imagem do Governo de Angola.

Num comunicado distribuído hoje em Luanda, os bispos e pastores angolanos, que desde o passado dia 22 de junho tomaram a direção da IURD em Angola, acusam o bispo brasileiro Honorilton Gonçalves de estar, através da Fé TV, da TV Zimbo (canal televisivo privado angolano) e das redes sociais, a conduzir uma campanha de calúnia e difamação, que afeta também a Televisão Pública de Angola (TPA).

Para os bispos nacionais, com a campanha, que consideram “uma atitude reprovável e condenável” fica exposto “o caráter do bispo Honorilton Gonçalves e da liderança brasileira da IURD-Angola, que tem agido “com falsidade e manifesta má-fé ao povo angolano”.

“Assim sendo, apelamos aos membros, obreiros, pastores e bispos da Igreja Universal do Reino de Deus e à sociedade, em geral, que mantenham a calma e o espírito de irmandade. Reiterando que as ações da Comissão de Reforma têm observado a lei e a dignidade da pessoa humana, em respeito aos princípios da fé cristã e os padrões morais e cívicos da nossa cultura”, refere a nota.

A nota realça que entre os dias 22 e 23 de junho deste ano, os pastores “imbuídos de espírito de fé e bravura decidiram pôr fim às más práticas perpetradas pelo Senhor bispo Honorilton Gonçalves, nomeadamente racismo, arrogância, abuso de poder e de confiança, que culminou com o resgate efetivo dos templos e locais de culto nas 18 províncias de Angola”.

Os religiosos angolanos acusam o bispo Honorilton Gonçalves de disseminar mentiras, “fazendo crer que ex-pastores e ex-obreiros foram os protagonistas dos referidos atos, que considerou de “vandalismo”, e invasão dos locais de culto, usando para o efeito as redes sociais e media controlada pela então liderança brasileira, designadamente a TV Zimbo, Fé TV e Record TV Angola”.

O conflito interno da IURD em Angola tem provocado tensões entre os dois países, com envolvimento direto de ambos os governos.

O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, enviou uma carta ao seu homólogo angolano, João Lourenço, pedindo proteção para os pastores da IURD em Angola, divulgada na segunda-feira passada no Twitter pelo deputado federal e filho do presidente do Brasil, Eduardo Bolsonaro (PSL-SP).

Na missiva dirigida a João Lourenço, Bolsonaro alude aos atos de violência e pede que se evite “que factos dessa ordem voltem a produzir-se ou sejam caracterizados como consequências de ‘disputas internas’”, apelando ainda a uma maior proteção de membros da IURD, “a fim de garantir sua integridade física e material e a restituição de propriedades e moradias, enquanto prosseguem as deliberações nas instâncias pertinentes".

Nesse mesmo dia, o embaixador do Brasil em Luanda, Paulino Franco de Carvalho, foi recebido pelo ministro das Relações Exteriores de Angola, Téte António, que endereçou aos cidadãos brasileiros uma mensagem de tranquilidade.

Segundo o chefe da diplomacia angolana, os incidentes que ocorreram estão a ser tratados em fórum próprio, ou seja, a justiça.

"Vamos deixar a justiça (trabalhar). É dentro de uma igreja, portanto, podia ser a igreja A ou B. Desta vez é esta igreja que está em questão. Vamos deixar a crise ser tratada a este nível e os aspetos que são da competência da justiça, vão ser também tratados a este nível", disse na altura Téte António, salientando que "os brasileiros, como os angolanos no Brasil, sempre se sentiram em casa".

Na sexta-feira, foi a vez de a ministra de Estado para a Área Social, Carolina Cerqueira, levar o assunto ao Parlamento angolano, reconhecendo que a crise pode ter consequências políticas e diplomáticas na relação de Angola com o Brasil.

Durante uma intervenção na Assembleia Nacional, no âmbito da discussão do Orçamento Geral do Estado na especialidade (OGE), Carolina Cerqueira reiterou não haver perseguição e disse que será apresentado brevemente no Parlamento um relatório sobre o conflito.

“Não há qualquer ato de perseguição contra os pastores e bispos angolanos e aqueles angolanos que cometerem alguma responsabilidade vão ser responsabilizados”, afirmou, citada pela imprensa angolana.

Os angolanos acusam os brasileiros de irregularidades e práticas contrárias à religião como a vasectomia, racismo e discriminação e romperam, em novembro do ano passado, com a representação brasileira em Angola encabeçada pelo bispo Honorilton Gonçalves.

Em dezembro de 2019, a Procuradoria-Geral da República angolana instaurou dois processos-crime contra a IURD, tendo como base as denúncias feitas por pelo menos 300 pastores angolanos, subscritores do documento.

A IURD, fundada por Edir Macedo em 1977, tem acumulado polémicas um pouco por todo o mundo, incluindo o envolvimento numa alegada rede ilegal de adoções em Portugal, e noutros países lusófonos, como São Tomé e Príncipe, onde os fiéis se revoltaram contra a detenção de um pastor são-tomense num protesto onde foi morto um jovem.

A organização religiosa já esteve na mira da justiça de vários países, além do Brasil, onde Edir Macedo, que construiu um verdadeiro império empresarial e chegou a ser considerado um dos pastores evangélicos mais ricos do país, foi preso, em 1992, sob acusações de charlatanismo e estelionato (burla), que foram mais tarde anuladas.

Em Angola, a IURD, em 2012, já enfrentou um processo na justiça, no qual seis líderes e responsáveis da igreja foram acusados de 10 crimes de homicídio voluntário, pela morte de 10 pessoas, na denominada vigília "Dia do Fim", em Luanda.

O ato, que resultou ainda no ferimento de mais de 100 fiéis, levou dezenas de milhares de pessoas a concentrarem-se no interior e exterior do Estádio da Cidadela, em Luanda, ultrapassando largamente a lotação do recinto.

Face ao caso, a IURD viu a sua atividade suspensa por 60 dias, e em 2015, o Tribunal Provincial de Luanda absolveu os arguidos por não ter elementos suficientes para afirmar com juízo de certeza que os mesmos terão cometido os crimes dos quais foram acusados e pronunciados.

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