O jurista angolano falava à Lusa um dia depois de a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), maior partido da oposição angolana, anunciar que vai impugnar, junto do Tribunal Constitucional, a resolução que aprovou a eleição do segundo vice-presidente da Assembleia Nacional, indicado e “imposto” pelo Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA, no poder).
Segundo o grupo parlamentar da UNITA, a pretensão surge em protesto contra a “imposição” pelo MPLA de um segundo vice-presidente da Assembleia Nacional, que “viola” o princípio da representação proporcional.
Para Inglês Pinto, as atuais divergências entre o MPLA e a UNITA, que entraram em rota de colisão na sexta-feira, dia da tomada de posse dos deputados da nova legislatura, reavivam a necessidade de uma revisão profunda da Constituição.
“Temos de pensar numa revisão profunda da Constituição por já não corresponder ao momento do país”, frisou.
A Constituição “cria situações de instabilidade e os constitucionalistas, de forma desapaixonada, devem analisar essa situação”, defendeu o também ex-bastonário da Ordem dos Advogados de Angola.
Inglês Pinto recomendou ao MPLA e à UNITA, que manifestam posições contrárias sobre a nomeação do segundo vice-presidente do órgão, que façam concessões e não sejam “extremamente legalistas”.
“Como foram eleitos pelo povo, em princípio refletem a posição do povo, e o eleitor deve ser respeitado, daí que deve haver concessões recíprocas, sem violar a lei, é claro”, afirmou hoje à Lusa o jurista, sublinhando que técnicos ligados ao direito constitucional e administrativo em Angola também estão “curiosamente” a fazer “interpretações divergentes” sobre o assunto.
A reunião constitutiva da Assembleia Nacional de Angola, para a legislatura 2022-2027, aprovou na passada sexta-feira uma resolução que elegeu o deputado Américo Cuononoca (MPLA) como primeiro vice-presidente do órgão e o deputado Raul Lima (MLPA) segundo vice-presidente do parlamento.
A eleição do segundo vice-presidente do parlamento angolano, indicado pelo MPLA, levou os deputados da UNITA a abandonarem em bloco a sala do plenário, queixando-se de que o partido no poder havia “quebrado o compromisso político”.
Segundo o líder da bancada parlamentar da UNITA, Liberty Chiyaka, na sequência de concertações entre delegações dos deputados dos dois maiores partidos, as partes acordaram que à luz da representação parlamentar (124 deputados do MPLA e 90 da UNITA), o segundo vice-presidente do órgão seria a deputada Arlete Chimbinda (UNITA), “mas essa concertação foi quebrada”.
O presidente do grupo parlamentar do MPLA, Virgílio de Fontes Pereira, citado pela imprensa angolana, negou qualquer acordo a propósito referindo que a UNITA fez “má interpretação de uma reunião informal”.
A agência Lusa procurou obter mais esclarecimentos junto de Virgílio Fontes Pereira, sem sucesso.
Para Inglês Pinto, o MPLA e a UNITA “têm de se habituar” a fazer concessões, “sobretudo olhando para aquilo que foi o nível de abstenção” nas eleições de 24 de agosto.
“Porque uma situação de instabilidade política pode levar à instabilidade social, é isso que me preocupa, daí que é necessário buscar consensos”, sublinhou.
O jurista considerou, no entanto, “normal” a pretensão de UNITA de impugnar a referida resolução.
“Tem direito de o fazer, mas não se pode abusar dos direitos no seu exercício”, notou.
“É necessário sensatez para fazer concessões sem vergar alguns princípios, sob pena de se criar desânimo a nível da população, após as eleições gerais”, concluiu Inglês Pinto.