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Quarta, 25 Setembro 2019 22:07

Sobreviventes do 27 de Maio contestam proposta de reconciliação feita pelo PR

Os sobreviventes do 27 de Maio de 1977, em Angola, criticaram hoje a proposta de reconciliação nacional feita pelo Presidente angolano, acusando João Lourenço de não distinguir as vítimas da guerra civil das execuções dentro do partido no poder.

Em comunicado, associações representativas dos sobreviventes do 27 de Maio de 1977 (data de um alegado golpe falhado contra Agostinho Neto -- primeiro Presidente do país - que levou a milhares de mortos em execuções extrajudiciais, segundo vários analistas) reclamam a entrega dos corpos das vítimas às famílias e contestam o silêncio de João Lourenço quanto a esta matéria.

Em abril, João Lourenço ordenou a criação de uma Comissão para a Reconciliação, que "não distingue as vítimas de conflitos políticos que resultaram do conflito armado, das vítimas de conflitos políticos como foi o caso de 27 de Maio de 1977", refere o documento.

"Ao mesmo tempo, o Estado não procedeu à entrega dos corpos às famílias, para o enterro a que teriam direito, nem emitiu as certidões de óbito para que os familiares dos desaparecidos continuassem com as suas vidas", queixam-se as três associações signatárias do comunicado, enviado à Lusa.

Entre as vítimas da direção do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) estavam opositores internos como Nito Alves, a portuguesa Sita Valles e o seu marido José Van-Dunem, irmão da atual ministra portuguesa da Justiça, Francisca Van Dunem.

As perseguições internas dentro do MPLA contra a corrente "fracionista" terão causado a morte de milhares de quadros do partido e, para os sobreviventes e filhos das vítimas, o atual executivo deve reconhecer esse episódio da História e pedir desculpa pelo que se passou.

As palavras "reconciliação e perdão adquirem contornos diferentes para as vítimas e sobreviventes: reconciliação pressupõe a admissão de que foram cometidos crimes, a emissão de certidões de óbito e a localização e devolução dos corpos", ou seja, "um verdadeiro processo de reconhecimento", com "ações concretas em busca da verdade", refere o comunicado.

"A reconciliação nacional é um processo e não um destino. Leva tempo e exige uma preparação na qual se procura envolver quantos atores sociais for possível, com a intenção de alargar a base participativa", consideram os subscritores, pelo que o 27 de Maio "deve ser tratado em separado dos restantes conflitos, igualmente geradores de vítimas", tendo por base "as orientações da União Africana sobre justiça transicional".

Trata-se de um processo que "precisa de ser encarado e implementado com seriedade, mostrando ao mundo uma sociedade comprometida em construir uma nação alicerçada em bases democráticas, com confiança e tolerância, inserindo-se com credibilidade crescente na sociedade das nações", concluem ainda os subscritores.

Em abril, segundo uma nota da Casa Civil do Presidente enviada à agência Lusa, João Lourenço anunciou a criação de uma comissão para elaborar um plano geral de homenagem às vítimas dos conflitos no país, entre os quais a "intentona golpista do `27 de Maio` [de 1977] ou eventuais crimes cometidos por movimentos ou partidos políticos no quadro do conflito armado".

João Lourenço justificou a decisão como um "imperativo político e cívico do Estado" para "prestar condigna homenagem à memória de todos os cidadãos que tenham sido vítimas de atos de violência, resultantes dos conflitos políticos".

Convém "instituir um mecanismo para a promoção da auscultação e de um diálogo convergente, no sentido de se assegurar a paz espiritual da sociedade, face a episódios do passado na convivência nacional que possam perturbar a unidade e o sentimento de fraternidade entre os angolanos", salientou então o chefe de Estado angolano.

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