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Sábado, 04 Janeiro 2020 14:30

"Nesta guerra não haverá vencedores", avisa Manuel Vicente

Isabel dos Santos ameaça expor operações da Sonangol. Manuel Vicente diz que “ninguém sai vencedor” desta guerra iniciada após a saída de José Eduardo dos Santos do poder, há dois anos, a guerra que desde o fim do ano opõe no Tribunal Provincial de Luanda o Presidente João Lourenço à filha do seu antecessor parece configurar a morte anunciada do império de Isabel dos Santos.

Em contrapartida, a resposta que está a preparar poderá vir a ter o efeito de uma verdadeira bomba atómica nas hostes do regime. Munida de documentos confidenciais extraídos durante a sua passagem pela Sonangol, Isabel dos Santos, segundo apurou o Expresso, prepara-se para destapar movimentos financeiros comprometedores que terão servido de suporte à campanha que conduziu à vitória de João Lourenço, em 2017.

“Tenho pena que, perante o que se está a passar neste momento em Angola, ela não entenda que, nesta guerra, não haverá vencedores”, disse ao Expresso Manuel Vicente, antigo vice-presidente de José Eduardo dos Santos. Mas Isabel dos Santos não parece disposta a olhar a meios para atingir os fins. E, por isso, fez saber em privado que poderá, em breve, pôr na rua alegadas operações ilegais de financiamento feitas na Sonangol comprometendo Manuel Vicente, Gaspar Martins (o atual presidente do conselho de administração) e outros altos responsáveis da petrolífera angolana e do MPLA.

“Nunca usei dinheiros da Sonangol, usei sim o network que me permitiu crescer e estar à altura de contribuir para o desenvolvimento do nosso país”, garantiu Vicente.

O soar do gongo foi dado na segunda-feira pelo Tribunal Provincial de Luanda ao decretar o arresto das participações sociais em nove empresas e o congelamento das contas bancárias domiciliadas em Angola de Isabel dos Santos, do marido, o congolês Sindika Dokolo, e do gestor português Mário Silva. “A providência cautelar foi a melhor via judicial escolhida e é mais justa e menos onerosa do que a compra das ações ou a pancadaria que se tem registado ao nível das assembleias-gerais da Unitel”, disse ao Expresso Abdul Santos, responsável da Angola Telecom.

Diante desta primeira investida da Justiça angolana, a filha do antigo Presidente, acusada de ter causado prejuízos ao Estado no valor de 1.136.996.825,56 dólares (cerca de €1015 milhões), está, pela primeira vez, na iminência de ver ruir o seu vasto império.

“Do ponto de vista político é um torpedo arrasador para Eduardo dos Santos”, concluiu um dirigente do MPLA. Do ponto de vista jurídico este processo pode ferir o direito “ao dar como factos provados, informações de inteligência e com base nelas, serem tomadas decisões judiciais”, dizem alguns advogados contactados pelo Expresso.

Menos de 24 horas depois de conhecer as acusações, Isabel dos Santos veio a terreiro contrapor os argumentos do Ministério Público, alegando não ter sido “notificada pela Procuradoria-Geral da República” ao mesmo tempo que qualifica como “falsas” e eivadas de “motivações políticas” as conclusões do Tribunal.

O general Leopoldino Nascimento, sócio de Isabel dos Santos na Unitel, negou também ao Expresso qualquer envolvimento pessoal numa alegada transferência financeira para a Rússia a favor da empresária. “Não fui intercetado por nenhuma polícia”, disse aquele que é considerado o mais fiel dos antigos colaboradores de Eduardo dos Santos.

Até agora tinham sido apenas pequenas provocações e arranhões mas, num contra-ataque fulminante feito através do Twitter, Isabel dos Santos denuncia João Lourenço por estar “a perseguir a família e a mascarar uma política económica falhada”. E responsabiliza ainda o Presidente por atirar “milhares de famílias da classe média para a pobreza” e por construir um presente que “não aponta um futuro brilhante para o Estado de direito em Angola” .

Neste clima de alta tensão, escritórios de advogados em Angola e Portugal preparam-se para uma longa batalha judicial que, segundo apurou o Expresso, conhecerá em março o afiar das facas quando a ação principal der entrada no tribunal. Como um ‘leão ferido’, João Lourenço tem ainda na manga o processo-crime desencadeado pelo antigo Presidente da Sonangol, Carlos Saturnino, contra Isabel dos Santos, no qual esta é acusada de, em vésperas de abandonar o cargo, ter usado recursos da companhia para fazer transferências ilegais para uma conta particular no exterior de Angola.

Contrariando os argumentos avançados pela filha do antigo Presidente, o jurista Paulo Rangel esclarece que “tratando-se de uma ação de providência cautelar, Isabel dos Santos não tinha de ser notificada já que o juiz não é obrigado a ouvir o requerido”. E uma fonte da Justiça angolana garante que o congelamento das ações de Isabel dos Santos e do marido não levará à paralisação de nenhuma das empresas que, agora, estão sob custódia do Estado.

Na solidão do seu refúgio espanhol, a decisão do Tribunal de Luanda provocou ondas de choque também em Barcelona onde José Eduardo dos Santos, perante este caso e o julgamento em curso do filho José Filomeno dos Santos, está a viver um dos piores momentos da sua vida. Não espanta, por isso, que o antigo Presidente angolano tenha mandado a filha adquirir uma vivenda em Barcelona. “Isso é sinal de que, tendo noção de que a filha não tem razão substantiva e o ambiente nacional e internacional é-lhe desfavorável, não voltará ao país”, admitiu um antigo membro do seu gabinete, que pediu anonimato. EXPRESSO

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