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Quarta, 18 Dezembro 2019 18:04

JES liderou o processo de transferência dos 500 milhões de dólares - Valter Filipe

O antigo governador do Banco Nacional de Angola (BNA), Valter Filipe, réu no caso "500 milhões", confirmou, hoje (quarta-feira), em tribunal, que o antigo Presidente da República, José Eduardo dos Santos, liderou a comissão das negociações e autorizou a transferência dos USD 500 milhões.

Segundo o réu, José Eduardo dos Santos passou a liderar o grupo de negociações pela parte do governo angolano com um suposto sindicato de bancos internacionais, após o afastamento do ex-ministro das Finanças, Archer Mangueira, que dirigia o processo.

O aludido sindicato negociava um suposto financiamento de 30 mil milhões de euros, mas como garantia Angola teria de desembolsar 500 USD milhões.

No processo, que envolve outros três réus, Valter Filipe é acusado de peculato, branqueamento de capitais e burla por defraudação.

É a Valter Filipe atribuída a responsabilidade da transferência ilegal do BNA para o Banco Credit Suisse, em Londres, como garantia da pretensa obtenção de financiamento de 30 mil milhões euros para a economia angolana.

“O Presidente da República, José Eduardo dos Santos, aprovou o programa e era ele que estava a dirigir todo o trabalho das operações de investimento. Eu (Valter Filipe) era, tão-somente, o coordenador técnico da comissão”, assumiu.

O arguido admitiu ter sido subscritor do contrato de transferência dos USD 500 milhões, a 10 de Agosto de 2017, cumprindo uma ordem do então Chefe de Estado, que pretendia deixar dinheiro para o país, em véspera da sua saída da presidência.  

“Governador Valter, depois desses anos aqui (no cargo), só lhe peço uma coisa: Tenha sucesso nessa missão e reze muito, para dar certo. Esse processo depende de muita oração”, disse o réu ao citar as palavras que lhe foram ditas pelo ex-Presidente, durante as negociações do milionário contrato.

Valter Filipe afirmou que o ex-Presidente conhecia todo o processo, porque era discutido, questionado, e, às vezes, solicitava pareceres jurídicos a sua assessoria.

Missão de risco

A dado momento da audiência, o juiz questionou ao réu se tinha alertado o então Presidente da República sobre os riscos da operação. “O PR tinha essa preocupação. Da minha parte havia a questão da reputação. Era uma missão de risco”, respondeu.

Sobre as circunstâncias em que assumiu o comando técnico das operações das negociações com o aludido sindicato de bancos, afirmou que tudo ocorreu durante uma audiência que solicitou ao então Presidente da República, para emitir um parecer conjunto com o ex-ministro das Finanças, em relação à idoneidade das pessoas e do processo.

“Quando fui ao gabinete presidencial, José Eduardo dos Santos disse-me que o titular das Finanças não podia comparecer à reunião por sobreposição de agenda”, continuou.

Explicou que, nesta ocasião, recebeu orientações do então Chefe do Estado para assumir as negociações, não obstante, ser uma actividade do Governo.

 “Fiquei parado à frente do PR, porque fiquei pasmo, devido a complexidade do processo e por estar fora da órbita do Banco Nacional de Angola”, justificou.

Financiamento evitaria crise cambial pós-eleitoral

Sobre as vantagens do financiamento, considerou que seria promissor por representar uma “grande oportunidade” para Angola, porque o BNA estava numa situação cada vez mais degradante, em termos financeiros.

Em vésperas das eleições (2017), explicou, o país entraria, nos seis meses seguintes, numa grave crise cambial, igual a que vive a Venezuela. Não conseguiria sequer importar produtos básicos, porque “estávamos num período em que o preço do barril do petróleo custava USD 40”, referiu.

Ex-PR queria evitar degradação económica

Valter Filipe informou que a ideia do ex-Presidente era permitir que o governo a sair das eleições de Agosto de 2017, encontrasse dinheiro nos Cofres do Estado, para que  conseguisse recapitalizar a economia e proporcionar o bem-estar da população.

“Isso evitaria culpar-lhe por uma possível degradação económica”, realçou.   

USD 500 milhões foi um processo ultra-secreto

O réu Valter Filipe declarou que o processo de transferência dos USD 500 milhões, por si efectuado a mando de José Eduardo Santos foi lícito, não houve camuflagem, nem foi fraudulento.

Informou que as hipóteses que se levantam de ilegalidade nessa operação se devem ao facto de ter sido um processo ultra-secreto, orientado, nesse sentido, pelo ex-Presidente.

Nessa senda, os detalhes do processo eram conhecidos por José Eduardo dos Santos, Archer Mangueira, Valter Filipe, José Filomeno dos Santos, Jorge Gaudens Sebastião e mais dois quadros do Banco Nacional de Angola.

“Eu estava a perder a confiança de alguns membros do Conselho de Administração do BNA, por vazão à imprensa de informações confidenciais. Depois desse processo eu ia exonerá-los”, afirmou.

Na óptica de Valter Filipe, essa situação levou aos membros do Conselho de Administração do BNA a prestar declarações à PGR, durante a fase de instrução preparatória, com informações fora do contexto, alegando que o processo havido sido ilegal.

Com base nessas declarações, segundo Valter Filipe, a PGR fez uma acusação falsa.

O antigo dirigente do banco central referiu que a transferência dos USD 500 milhões, enquadrada no quesito emissão de títulos de garantia, é de sua competência estatutária, sendo que a operação está registada no departamento de contabilidade, das operações e do fundo do BNA.

“Do ponto de vista operacional, eu tinha competência de transferir os USD 500 milhões”, ressaltou.

Valter Filipe inconsolável

Depois do “sucesso” da operação da transferência, Valter Filipe disse que o BNA, através da Unidade de Informação Financeira (UIF), recebeu um alerta das autoridades financeiras de Londres sobre o movimento decorrido no BNA.

“Isso fez-me bem”, disse, sob lágrimas, afirmando que o alerta demonstrava a licitude do processo.

Declarações do actual governador do BNA

Valter Filipe considerou falsas as declarações do actual governador do BNA, José de Lima Massano, feitas durante a fase de instrução preparatória, segundo as quais a operação de transferência foi registada pela contabilidade apenas em Dezembro de 2017.

“Foi por isso que a PGR pensou que foi uma camuflagem da operação dirigida e orientada pelo PR”, assumiu, lamentando que explicou a Lima Massano, durante a passagem de pastas, sobre esse processo e manifestou-se disponível para mais esclarecimento.

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