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Quarta, 11 Dezembro 2019 15:25

"Zenu" dos Santos diz ter recebido autorização de JES

José Filomeno do Santos "Zenu" confirmou esta manhã em tribunal ter sido ele a entregar ao seu pai a carta com a proposta de financiamento para um fundo de garantia ao Estado angolano, a pedido do seu amigo Jorge Gaudens Sebastião, tendo recebido autorização por parte do ex-Presidente da República José Eduardo dos Santos (JES), para participar, enquanto responsável pelo Fundo Soberano de Angola, nas reuniões que se seguiram.

Essa tem sido, de resto, a tese do advogado de defesa oficioso do antigo presidente do Fundo Soberano de Angola, António Simão, que disse ao tribunal que o seu constituinte apenas serviu de intermediário entre o Executivo e os promotores, atribuindo a condução do processo a Valter Filipe.

O causídico defende que "Zenu" dos Santos esteve sempre à margem das decisões respeitantes ao processo que culminou na transferência de 500 milhões de dólares para o Credit Suisse, em Londres.

António Simão reconhece que o filho do antigo Presidente esteve presente em várias reuniões, que tinha uma relação de amizade com Jorge Gaudens (que está também a ser julgado e foi ouvido ontem), mas rejeita a sua participação numa teia internacional de branqueamento de capitais, que visava, alegadamente, extorquir o Estado angolano.

Esta manhã, Zenu voltou a afirmar que nunca foi sócio ou representante das empresas a quem o BNA transferiu fundos e pagamentos suspeitos.

Zenu dos Santos diz estar a ser julgado por ser filho do ex-Presidente da República

O antigo presidente do Fundo Soberano de Angola, José Filomeno dos Santos "Zenu", disse no tribunal que só está a ser julgado neste processo por ser filho do ex-Presidente da República, José Eduardo dos Santos, pois não fez nada de anormal para estar sentado no banco dos réus.

"Se não fosse filho do ex-Presidente da República não estaria aqui a ser julgado por vós. Foram os senhores quem me colocaram nessa condição", disse, durante a sua fase interrogatória no julgamento do caso 500 milhões USD.

Explicou que o seu papel nesse processo foi, sempre, o de emitir sugestões, mercê da experiência de cinco anos que acumulava na gestão do Fundo Soberano de Angola.

A sessão de hoje ficou marcada por vários protestos da defesa, que chegou a recorrer a uma citação de Camões para “amenizar” as intervenções, considerando que o interrogatório estava a ser mais uma aula de professor para aluno, quando o juiz pediu ao réu para definir o que era uma empresa fantasma ou de fachada.

Em declarações à imprensa, António Gentil, advogado oficioso de “Zenu”, disse que teve que intervir várias vezes, porque “houve ocasiões em que os venerandos juízes faziam comentários, tentavam fazer sugestões”.

Segundo António Gentil, foi preciso usar uma passagem de Camões, n’ Os Lusíadas - “Os olhos da real dignidade, ponde no chão”- no sentido de “amenizar” os ânimos.

Sobre o interrogatório do seu constituinte, o advogado disse que correspondeu às suas expetativas, apesar de no início ter estado “um pouco nervoso”, tendo o juiz recorrido à defesa e ao coarguido Jorge Gaudens Pontes Sebastião, seu amigo de infância, para avaliar o estado de espírito de “Zenu”.

“Correu bem, embora no início o arguido estivesse um pouco nervoso, como é natural, mas depois conseguiu recompor-se e (…), pessoalmente estou satisfeito, correspondeu à minha expectativa. Se bem que as condições climatéricas da sala de audiência não são muito favoráveis, também contribuiu um pouco para o nervosismo de todos os participantes”, disse, aludindo ao calor que se tem feito sentir no tribunal devido à falta de ar condicionado.

Em cerca de seis horas de interrogatório, com uma pausa de meia hora, José Filomeno dos Santos respondeu a perguntas do coletivo de juízes, do Ministério Público e de apenas um dos advogados.

“Zenu” dos Santos confirmou que é amigo do coarguido Jorge Gaudens, estando ambos acusados dos crimes de burla por defraudação, branqueamento de capitais e tráfico de influência, no julgamento que teve início esta segunda-feira, na câmara criminal do Tribunal Supremo de Angola.

Segundo o réu, foi Jorge Gaudens, 41 anos, empresário angolano e sócio maioritário da Mais Financial Services, que o contactou para apresentar uma proposta de financiamento captada no exterior para investimentos em Angola, a qual encaminhou para o executivo, por o projeto estar fora do pelouro do Fundo Soberano de Angola.

José Filomeno dos Santos disse que foi informado que se tratava de um financiamento que serviria para apoiar a resolução da escassez de divisas que Angola enfrentava e para investimentos públicos.

O réu contou ainda que, passado algum tempo, Jorge Gaudens lhe fez chegar correspondência proveniente do BNP Paribas, um dos maiores bancos da Europa e com presença em 75 países, para ser entregue ao então Presidente, José Eduardo dos Santos, tendo assim procedido.

De acordo com José Filomeno dos Santos, algum tempo depois foi constituída uma delegação, chefiada pelo então ministro das Finanças, Archer Mangueira, e integrada pelo ex-governador do BNA, Walter Filipe, igualmente arguido neste processo, e por si, que se deslocou, em junho de 2017, a Lisboa, para com a Mais Financial, representada por Jorge Gaudens, e com a Resources Conversion, representada por Hugo Onderwater, tratar das questões de financiamento.

Questionado pelo juiz sobre a razão que o levou a participar em todos os encontros, que disse terem sido pelo menos dez, não sendo o negócio do pelouro do fundo soberano, José Filomeno dos Santos respondeu que foi sempre convocado pelo executivo, de forma verbal e escrita, e por isso comparecia às reuniões.

O réu explicou que levava para as reuniões a sua experiência, já que conhecia a tipologia de um dos contratos assinados entre o BNA e os investidores, bastante comuns na atividade do fundo, nomeadamente a gestão de ativos, reconhecendo que sobre a angariação de fundos não tinha nenhuma contribuição a dar.

Instado a responder se, pelo volume do financiamento, de 30 mil milhões de dólares (27 mil milhões de euros), através de um fundo de investimento estratégico para Angola, não achava que deveria ter sido criada uma comissão oficial para tratar do assunto, o réu respondeu que a questão devia ser direcionada ao titular do poder executivo na altura.

Por duas vezes, foi colocada a questão ao réu se a operação teria tido êxito caso não fosse presidente do Fundo Soberano de Angola e filho do ex-Presidente da República, mas a defesa protestou, considerando a pergunta “capciosa, ardilosa, tendenciosa”.

Valter Filipe recupera satisfatoriamente

Na sessão de hoje, a terceira deste mediático julgamento, o réu Valter Filipe voltou a estar ausente, por questões de saúde, motivo que levou o juiz da causa a questionar a sua evolução médica.

Em resposta, o seu advogado, Sérgio Raimundo, disse que Valter Filipe está estável. “A fraqueza está a diminuir e aguarda apenas os resultados dos exames de urina e de sangue”.

Admitiu o seu regresso ao tribunal sexta ou segunda-feira próxima.

A quarta sessão de julgamento prossegue na quinta-feira, com a audição do coarguido António Samalia Bule Manuel, à altura dos factos diretor da área de gestão de reservas do banco central angolano, estando ainda por definir a data para ouvir o corréu Walter Filipe, devido ao seu estado de saúde. Ambos são acusados dos crimes de burla por defraudação, branqueamento de capitais e peculato.

Em abril do ano passado, o Governo angolano anunciou a recuperação dos 500 milhões de dólares transferidos do BNA para uma conta bancária em Londres, para fins de custódia dos fundos a estruturar.

Além dos 500 milhões de dólares, o Governo de Angola reclamava também a devolução de 24,8 milhões de euros pagos à Mais Financial Services, para a montagem da operação de financiamento, que o coarguido Jorge Gaudens disse, terça-feira em tribunal, já ter pagado, bem como outros dois milhões de euros, de custas judiciais pagas pelas autoridades angolanas, com a abertura do processo em Londres.

Segundo Jorge Gaudens, teve de recorrer ao seu património pessoal para proceder ao pagamento de 26,850 milhões de euros, porque a conta da Mais Financial Services se encontra bloqueada.

O empresário declarou também no tribunal que o contrato de consultoria técnica e financeira assinado entre a empresa Mais Financial Service e o Banco Nacional de Angola foi autorizado pelo ex-Presidente da República, José Eduardo dos Santos. NJ/LUSA

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