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Quinta, 02 Março 2023 14:46

Filha de PR do Congo beneficia de milhões por participações ocultas em petrolífera

Uma filha e um genro do Presidente da República do Congo, Denis Sassou Nguesso, beneficiam há anos de milhões em dividendos resultantes da extração de petróleo no "offshore" congolês, em resultado de participações empresariais até agora secretas.

De acordo com a Investigative Europe (IE), uma organização europeia de jornalistas de investigação, Julienne Sassou-Nguesso e Paul Kionga obtiveram secretamente 15% do capital de uma empresa não-cotada, subsidiária da Petronor, listada na Bolsa de Oslo, e "graças a um acordo de bastidores" tiveram direito a milhões em dividendos do campo petrolífero PNGF Sud, operado pela gigante da energia Perenco.

Os jornalistas de investigação tiveram acesso a vários documentos, entre os quais um email enviado por Kionga à administração da Hemla, na sequência de uma reunião em Paris em outubro de 2016, poucos meses antes desta companhia norueguesa e o gigante franco-britânico Perenco vencerem em janeiro de 2017 o concurso pela concessão de 40% do PNGF Sud.

"Foi um grande prazer reunir-me convosco e partilhar pontos de vista comuns sobre a oportunidade do PNGF. Confirmo aqui também a minha disponibilidade para vos apoiar neste projeto e proporcionar o melhor esforço para tornar este sonho uma realidade para todos nós", comprometeu-se então Paul Kionga.

O clã Sassou-Nguesso utilizou então "uma série de empresas e procuradores para adquirir secretamente 15% de uma filial da Hemla, que obteve uma participação de 20% na PNGF Sud", nesse concurso em janeiro de 2017, no qual foi atribuída à Perenco uma participação de 40% e o papel de operadora, segundo fontes e documentos partilhados com o IE.

O nome de Julienne Sassou-Nguesso nunca constou entre a lista de acionistas envolvidos na operação, mas "nos bastidores colheu dividendos durante anos. Só em 2018, tinha direito a, pelo menos, 3,3 milhões de dólares (3,11 milhões de euros, ao câmbio de hoje), graças às suas ações ocultas no bloco petrolífero", escrevem os investigadores.

Emails consultados pelo IE revelam também como Kionga, cunhado de Julienne Sassou-Nguesso, e Valentin Tchibota-Goma, um político congolês proeminente, fizeram lóbi junto do Governo em Brazzaville em nome da Hemla no final de 2016.

No final das negociações, a Hemla, a Perenco e os seus parceiros locais pagaram ao Estado congolês um bónus único de assinatura de 25 milhões de dólares (23,57 milhões de euros) por direitos de perfuração, com um compromisso adicional de investirem mais cinco milhões de dólares em projetos locais.

Este investimento demonstrou ser bastante lucrativo. Em 2021, o ativo de 20% da Hemla foi avaliado em 212 milhões de dólares (200 milhões de euros), o que sugere que a concessão do PNGF Sud poderá valer mais de mil milhões de dólares. Só em 2017, a empresa declarou um lucro de 8,8 milhões de dólares (8,3 milhões de euros) na República do Congo, de acordo com a investigação.

"Este tipo de escândalos deveria convencer as empresas europeias a ser mais vigilantes ou a absterem-se de entrar nessas relações comerciais", afirma Sara Brimbeuf, líder do programa de Fluxos Financeiros Ilícitos da organização Transparência Internacional, em reação às conclusões desta investigação, citada nas mesmas.

"O saque de recursos não pode ser explicado apenas pela corrupção dos países produtores de petróleo", acrescenta a ativista. "É a falha de cumprimento das `majors` [maiores petrolíferas do mundo] que permite que tais práticas floresçam", conclui.

A Hemla foi fundada em 2009 por dois noruegueses, Knut Søvold e Gerhard Ludvigsen. Entrou no mercado congolês em 2017, associada à Emirati Petromal, criado a Hepco, a filial local que conta Julienne Sassou-Nguesso como investidora sombra.

Entre 2019 e 2021, a dupla de empresários noruegueses e a Petromal transmitiram progressivamente as ações que detinham na Hepco à Petronor, outra empresa em que são acionistas maioritários.

A autoridade norueguesa para o combate aos crimes económicos, Økokrim, deteve Søvold e Ludvigsen em dezembro de 2021 por suspeita de corrupção em África. A Økokrim admitiu ao IE que a investigação ainda decorre, mas que não confirmou se está ligada à República do Congo.

Em abril de 2022, a Petronor anunciou que Eyas Alhomouz, o seu atual presidente, que dirige igualmente a Petromal, foi também considerado suspeito pela Økokrim, assim como pelo Departamento de Justiça (DoJ) dos Estados Unidos, uma vez que é cidadão norte-americano.

Consultado pelo EI, o DoJ recusou-se a comentar a investigação.

Søvold, Ludvigsen e Alhomouz também se escusaram a comentar a investigação da EI. Alhomouz alegou que não podia acrescentar nada, devido à investigação da Økokrim, e Søvold e Ludvigsen enviaram uma declaração conjunta através dos seus advogados, na qual não fizeram qualquer referência a Julienne Sassou-Nguesso, apesar de a IE os questionar especificamente sobre a filha do chefe de Estado congolês.

De igual modo, a Petronor, cotada na Bolsa de Valores de Oslo, recusou-se a comentar. O Estado congolês e Julienne Sassou-Nguesso não responderam aos emails enviados pela EI aos seus advogados e à equipa de comunicação do Presidente Denis Sassou-Nguesso, afirmam os investigadores

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