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Segunda, 01 Fevereiro 2021 23:41

Legitimidade dos lunda tchokwe é semelhante à dos cabindas - investigadores

A legitimidade das reivindicações autonomistas da população lunda tchokwe em Angola, violentamente reprimidas este sábado, “é semelhante à dos cabindas” e “a exploração de diamantes na região acentuou” essas reivindicações, disseram à Lusa investigadores.

“Tal como Cabinda, a Lunda - atualmente dividida em Lunda-Norte e Lunda-Sul - também se congregou na Angola colonial portuguesa através de tratados de protetorado, assinados em 1885 e anos seguintes pelas autoridades locais, e por Henrique Carvalho, um militar português, que representou Portugal”, e enquadram-se na estratégia de ocupação territorial decorrente da Conferência de Berlim nesse mesmo ano, explica Alberto Oliveira Pinto, professor e investigador do Centro de História da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e do CEsA – Centro de Estudos sobre África e América Latina do ISEG (Instituto Superior de Economia e Gestão).

“A legitimidade destes tratados é semelhante à do Tratado de Simulambuco, de Cabinda”, cujo aniversário da sua assinatura em 1885 se assinala hoje, 1 de fevereiro, diz igualmente Eugénio Costa Almeida, investigador do Centro de Estudos Internacionais do Instituto Universitário de Lisboa (CEI-IUL).

O especialista reforça: “A legitimidade das Lundas reivindicarem uma independência ou autonomia em relação a Angola é idêntica à dos cabindas".

Mas, desde sempre, a exploração de diamantes na região é o principal combustível das pretensões autonómicas na região, que “é um barril de pólvora”, considera Oliveira Pinto, assim como o petróleo estimula os ímpetos nacionalistas em Cabinda.

Há um “historial antigo de descontentamento em relação ao poder político do MPLA [Movimento Popular de Libertação de Angola], assim como em relação à própria UNITA [União Nacional para a Independência Total de Angola], que, como se sabe, no tempo de Jonas Savimbi, também tinha interesse no garimpo de diamantes nas Lundas”, diz o historiador. Desde o início do século XX que há exploração de diamantes na região e “evidentemente, isso sempre acentuou a vontade de autonomia das populações locais”, acrescenta.

Henrique Carvalho, explica o professor da Faculdade de Letras, chegou à Lunda, onde ficou bastante tempo, com a incumbência de assinar um tratado de protetorado com o Reino de Muatiânvua, que congregava uma série de unidades estaduais denominadas pelo militar português como “Império Lunda”. Esse império abrangia não só as atuais Lundas, Norte e Sul, em Angola, como também o Alto Catanga, na República Democrática do Congo (RDCongo), e estendia-se ainda a uma parte da Zâmbia.

Oliveira Pinto assinala, por outro lado, que a Lunda Tchokwe é representada por um partido político, pelo menos desde as eleições de setembro de 1992, no Parlamento angolano, o Partido de Renovação Social (PRS), que “era praticamente um partido étnico, digamos assim, constituído por deputados lunda tchokwe, ou lunda kioko, que é o mesmo, que foi, de resto, o terceiro partido mais votado nessas eleições, logo a seguir ao MPLA e à UNITA”.

A polícia angolana reprimiu violentamente no passado sábado uma manifestação convocada pelo Movimento do Protetorado Português da Lunda Tchokwe (MPPLT), na vila de Cafunfo, município de Cuango, na província angolana de Lunda-Norte, para assinalar o 127º do reconhecimento internacional do tratado de protetorado português da Lunda.

A polícia acusa elementos do MPPLT de terem tentado invadir uma esquadra policial de Cafunfo, incidente que foi reprimido resultando em seis mortes e vários feridos. O MPPLT contraria a versão policial, alegando que as forças de segurança angolanas dispararam indiscriminadamente contra manifestantes desarmados, provocando 15 mortos e dez feridos, entre os quais uma criança.

O nível da violência da polícia surpreendeu Eugénio Almeida, que chama a atenção para o facto de o MPPLT reclamar ser reconhecido politicamente pelo próprio Estado angolano. “Eles próprios assinalam que foram recebidos em cerimónia no Palácio da Cidade Alta, em Luanda, em dezembro de 2017”, aponta.

O MPPLT sublinha, num texto a que a Lusa teve acesso, ter sido fundado em 2006 e em 2007 produziu o seu manifesto político, que terá “entregue ao Governo do MPLA e aos demais partidos políticos angolanos, comunidade internacional e a Santa Sé, em Roma”, e reclama ter sido “aceite e registado” pela Secretaria de Estado norte-americana.

“Eles convocaram a manifestação ainda em novembro, de acordo com os preceitos constitucionais, artigo 47.º, e denunciam há muito tempo detenções arbitrárias dos seus membros”, acrescentou o investigador.

A autonomia da região das Lundas (Lunda Norte e Lunda Sul, no leste angolano), rica em diamantes, é reivindicada por este movimento que se baseia num Acordo de Protetorado celebrado entre nativos Lunda-Tchokwe e Portugal nos anos 1885 e 1894, que daria ao território um estatuto internacionalmente reconhecido.

Portugal teria ignorado a condição do reino quando negociou a independência de Angola entre 1974/1975 apenas com os movimentos de libertação, segundo o movimento.

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