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Sexta, 14 Novembro 2014 07:42

Tribunal Provincial de Luanda retoma julgamento do ‘Caso Kamulingue’

O Tribunal Supremo deplorou a perda de tempo e a falta de economia processual. Mandou prosseguir o julgamento com a mesma equipa de juízes e magistrados do Ministério Público.

O Tribunal Provincial de Luanda (TPL) vai retomar no dia 17 de Novembro, do ano em curso, o julgamento do “Caso Kamulingue e Cassule”, interrompido a 3 de Setembro por esta instância jurisdicional, ter-se julgado, na altura, sem competência para dar continuidade ao julgamento, porquanto um dos réus era oficial-general das Forças Armadas Angolanas (FAA).

O oficial em questão responde pelo nome de António Manuel Gamboa Vieira Lopes e sobre ele impede a acusaçao de autoria moral de crime de homicídio. À data em que o homicídio se consumou, aquele militar ostentava o posto de brigadeiro. Porem, ao ser promovido a um grau acima no dia 27 de Maio do ano em curso, ingressou na classe de oficiais generais . E como tal, ao abrigo da ordem nº 12/14 do Comandante em Chefe das Forças Armadas Angolanas, e Presidente da República, José Eduardo dos Santos,não estava sob alçada dos tribunais civis a tarefa de julgar um oficial-general.

Alias este argumento foi invocado pelo meritíssimo juiz, Carlos Baptista, da 6ª secção da sala dos crimes comuns, quando decorria a terceira sessão de julgamento, tendo declarado o Tribunal Provincial de Luanda como incompetente para dar seguimento ao julgamento, remetendo-o ao Tribunal Supremo (TS), com base no artigo 56º do Código do Processo Penal (CPP). Depois de o Tribunal Supremo ter analisado minuciosamente o aludido processo enviado à Câmara Criminal (CC), este concluiu que compete ao Tribunal Provincial de Luanda dar continuidade ao julgamento que vinha decorrendo desde o pretérito 1 de Setembro, contando com a mesma equipa de juízes e com os mesmos membros do Ministério Público (MP).

Segundo apurou O PAÍS junto de uma fonte familiarizada com o assunto, o Tribunal Supremo (TS) argumentou que o Tribunal Provincial de Luanda (TPL) é competente para julgar o presente processo, porque “o réu já não é oficial general”, aliás, até à sua promoção era apenas um oficial superior de Serviços de Informação e Segurança de Estado (SINSE) e não oficial general das Forças Armadas Angolanas.

Este mesmo Tribunal reforçou ainda que o réu foi promovido a brigadeiro em Maio, numa altura em que o processo-crime já estava instaurado desde o dia 10 de Fevereiro de 2014, sendo a acusação no dia 6 de Março e posteriormente o despacho de pronúncia foi feito a 11 de Junho do ano em curso.

A fonte reforçou ainda que os oficiais superiores das Forças Armadas Angolanas, não são julgados na Câmara Criminal do Tribunal Supremo, nos termos do artigo 34º da Lei nº13/11, explicando adiante que “ é a qualidade pessoal que o agente possui no momento da prática da infracção que determina o Tribunal em que deve ocorrer a causa”.

Perdeu-se muito tempo

Face ao ocorrido, o TS considerou ter havido perda de tempo, em termos de economia processual, situação que deplorou por não se compadecer com a celeridade que deve ser imprimida na prática de actos processuais, sobretudo naqueles em que existam réus presos, refere um despacho enviado ao Tribunal Provincial de Luanda.

O documento, a que OPAÍS teve acesso, adverte ser necessário que “as questões penais sejam decididas pelo Tribunal competente”, para se evitar prazos dilatórios que, às vezes, surgem em função de eventuais obstáculos criados pelas partes, que, segundo ainda o documento, devem ser prontamente removidos pelos julgadores, com base nos artigos 400 e 140 ambos do Código do Processo Penal.

Rapto

De acordo com o processo nº 180/13- 02, Isaías Cassule e Alves Kamulingue foram raptados na via pública nos dias 27 e 29 de Maio de 2012, quando tentavam organizar uma manifestação contra o Governo de Angola, exigindo que o Presidente da República, José Eduardo dos Santos, abandonasse o poder.

Segundo informação oficial tornada pública pela Procuradoria Geral da República (PGR), os manifestantes utilizavam cartazes, panfletos e camisolas para expressar o seu descontentamento com a gestão governativa do poder instituído.

Os dois jovens activistas que faziam parte do Movimento Revolucionário (MR) terão alegadamente sido raptados por elementos supostamente ligados à Polícia Nacional (PN) e aos Serviços de Informação e Segurança de Estado (SINSE), conforme o comunicado emitido pela PGR na altura.

Advogados satisfeitos

Entretanto, os advogados dos familiares de Alves Kamulingue e Isaías Cassule, da Associação Mãos Livres(AML) saudaram a decisão do Tribunal Supremo por ter ordenado o Tribunal Provincial de Luanda(TPL) a retomar as sessões de julgamento deste polémico caso que tem como arguidos membros do SINSE e da Polícia Nacional(PN).

Zola Bambi, um dos três causídicos que, com David Mendes e Afonso Mbinda constituem a equipa, em declarações prestadas a O PAÍS disse que o Tribunal Supremo “fez um belo trabalho” ao autorizar o reinicio das sessões, numa altura em que se aproximam as férias judiciais.

Com esta decisão, reforçou a fonte, o julgamento poderá não se prolongar como aconteceu com o caso do ex-comandante provincial da Polícia Nacional, Joaquim Ribeiro, embora diga serem casos diferentes, mas em função da dimensão do caso em que foram mortos violentamente dois cidadãos.

Zola Bambi entende que com mais este passo, nota-se haver vontade dos órgãos de justiça em ver resolvido o caso o mais breve possível, e que já se arrasta há quase dois anos, pese embora o julgamento ter iniciado no dia 1 de Setembro do ano em curso.

Para o advogado, este gesto do Tribunal Supremo devia ser seguido por outros órgãos de justiça ou outros sectores concorrentes para verem dirimidos vários casos encalhados, alguns dos quais, “ que nem devia levar o tempo que levam para serem resolvidos”.

Refira-se que, com base num entendimento havido entre esta equipa de advogados e a Procuradoria Geral da República(PGR), esta última ofereceu duas residências às viúvas de Cassule e Kamulingue.

Durante a recepção das casas, o advogado Zola Bambi havia dito que a entregue das mesmas não se enquadrava no processo em causa, explicando que o julgamento decorreria “ normalmente porque as casas não constam no processo”.

OPAÍS

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