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Domingo, 22 Fevereiro 2015 14:49

Jonas Savimbi, herói ou vilão angolano - Treze anos depois da sua morte

Jonas Savimbi morreu há treze anos. O líder fundador da UNITA é uma figura controversa. Houve paz em Angola após a sua morte. Mas há quem afirme que ela enfraqueceu a oposição do país, uma má notícia para a democracia.

Passaram Treze anos desde a morte de Jonas Malheiro Savimbi. O líder fundador da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) morreu em combate nas matas do Moxico, no leste do país, a 22 de fevereiro de 2002. As forças governamentais mataram Savimbi numa operação militar denominada "Kissonda".

A morte de Jonas Savimbi significou para Angola o fim da guerra fratricida de cerca de 30 anos, que começara em 1961 ainda durante a luta contra o colonialismo português. Trouxe também um futuro difícil e incerto para a UNITA, um movimento que já chegou a ocupar cerca de 70 por cento do território angolano.

Fundada por Jonas Savimbi e António da Costa Fernandes no ano de 1966, a UNITA contava inicialmente com o apoio da República Popular da China. Mais tarde reposicionou-se durante a Guerra Fria como aliado dos Estados Unidos da América e do regime do "Apartheid" da África do Sul na luta contra o Governo do MPLA de orientação marxista-leninista.

Hoje, as opiniões dividem-se sobre o ex-líder da UNITA, antigo movimento de libertação nacional que continuou a sua luta depois da independência de Portugal e da instalação do Governo do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) em Luanda no ano de 1975. Se, para alguns, Jonas Savimbi foi um herói, para outros, foi um vilão.

22 de fevereiro de 2002: a morte de Savimbi

O dia começou como outro qualquer, era uma sexta-feira normal. Mas para as Forças Armadas Angolanas (FAA) e o regime do Presidente José Eduardo dos Santos, do MPLA, aproximava-se uma viragem na história político-militar do país, que vivia em guerra há cerca de três décadas.

Ao fim da tarde, anunciou-se a morte em combate do líder da então rebelião armada, a UNITA, em três comunicados: um do Governo de Angola, o segundo do Estado-Maior das FAA e o terceiro do Comando da Polícia Nacional, endossados com as declarações do brigadeiro Simão Carlitos Wala, responsável pelo destacamento militar que liquidou Jonas Savimbi.

"Quando, de manhã, por volta das sete horas, os nossos combatentes descobriram o rasto do grupo, ele sentiu isso e fugiu", contou o brigadeiro. "Às 15 horas, [Savimbi] entrou em confronto com os nossos destacamentos, foi atacado e morreu no tiroteio com sete tiros."

A notícia da morte de Jonas Savimbi foi largamente difundida pelos órgãos de comunicação nacionais e internacionais. A população saiu à rua. Em Luanda, por exemplo, ouviram-se disparos para o ar de metralhadora, além de gritos de júbilo "Savimbi morreu! Savimbi morreu!".

Foi um golpe profundo para a luta militar da UNITA.

Apesar da morte do líder do movimento, a guerra ainda continuou em alguns pontos do país. Mas, sem capacidade militar para responder com a mesma intensidade aos ataques das FAA, a 13 de março, a Comissão de Gestão da UNITA, dirigida pelo general Paulo Lukamba "Gato", então secretário-geral, anunciou unilateralmente o fim das hostilidades.

Sequelas para a UNITA

Na altura, Alcides Sakala, hoje deputado e porta-voz da UNITA, não acreditou quando recebeu a notícia da morte de Jonas Savimbi.

"Nós já estávamos habituados a informações sobre a morte do dr. Savimbi, veiculadas pelo Governo de Luanda. Primeiro, ficámos incrédulos, mas com o evoluir da situação, na base de informações que fomos recebendo, concluímos efetivamente que algo de mal tinha acontecido", lembra hoje o brigadeiro na reserva.

Era preciso fazer algo urgentemente, lembra Sakala, "era preciso tomarmos alguma decisão perante o novo quadro que se apresentava à luz da morte em combate do dr. Savimbi."

Treze anos depois da sua morte, como estará a UNITA sem Jonas Savimbi?

Para o sociólogo, jornalista e analista político, João Paulo Ganga, há duas verdades que não se podem encobrir: se por um lado, houve um "enfraquecimento da UNITA" como força da oposição ao regime de Luanda, por outro lado, a morte de Savimbi trouxe a paz.

"A paz trouxe benefícios incomensuráveis para o país e só foi possível com o desaparecimento físico de Savimbi", comenta o analista.

Alcides Sakala tem uma opinião diferente. O porta-voz da UNITA garante que o partido continua a ser uma alternativa ao MPLA, no poder.

"O partido está preparado, consolidou as bases ao nível das aldeias, das comunas, dos municípios e das capitais provinciais", afirma Sakala. "Portanto, a UNITA é efetivamente um partido nacional, presente no quotidiano de todos os angolanos como força de alternância."

Corpo de Savimbi sob custódia governamental

Doze anos depois, os restos mortais de Jonas Savimbi continuam sob custódia das autoridades governamentais, apesar da propalada reconciliação nacional. Até agora, o regime do Presidente José Eduardo dos Santos não respondeu favoravelmente aos vários apelos e esforços que a família e a direção da UNITA têm feito para se realizar um funeral condigno.

Mas o ex-secretário-geral da UNITA, o general Abílio Kamalata Numa, culpa igualmente o atual presidente do partido, Isaías Samakuva. Até aqui o funeral não se realizou também por alegada letargia na oposição contra o regime de Luanda, diz.

"Nós precisamos de uma liderança firme na UNITA. A liderança do meu presidente Samakuva é uma liderança que vai fazendo o que pode, mas não pode pressionar o MPLA para fazer as alterações que Angola precisa", comenta.

Mas o alto dirigente do maior partido da oposição garante que não vai morrer sem antes assistir ao funeral condigno de Savimbi: "Ainda tenho força para ver um funeral condigno de Jonas Savimbi, estou a ser franco! Ainda vou ver esse funeral…"

Herói ou vilão

Considerado, por alguns, como herói, para outros, Jonas Savimbi não passou de um vilão. A figura de Savimbi foi sempre controversa antes mesmo da criação do seu movimento, a UNITA, em 1966. A sua passagem pela Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), o terceiro e mais antigo movimento de libertação de Angola, e a posterior tentativa de filiar-se ao MPLA foram igualmente assombradas por desconfianças e lutas de poder.

Mas para Kamalata Numa, seja quais forem os adjetivos atribuídos ao fundador do seu partido, muito mais do que um herói, Savimbi é o arauto da democracia angolana.

"Digam-me só quem é que lutou pela democracia neste país? Agora, se vocês quiserem branquear isso tudo, vai aparecer um outro", refere. "E digo mais. Se isto não mudar, o MPLA vai ficar sozinho porque vai proclamar a ditadura. Isso não vai demorar muito tempo, se os angolanos não tiverem consciência."

Uma tese contrariada pelo jornalista e diretor do jornal AGORA, Ramiro Aleixo. "Savimbi não pode ter sido o arauto da democracia em Angola, porque a UNITA nunca foi democrática", afirma. "Agora, podemos ter em conta o seguinte: a pressão da própria UNITA, armada e política, permitiu que se criassem de forma mais rápida as condições para a democratização de Angola."

Savimbi e a família

Para além do plano politico e militar, quem era Jonas Malheiro Savimbi no plano familiar? Os relatos apontam para um homem extremamente tenaz, que terá chegado ao ponto de eliminar esposas, mães de alguns dos seus filhos.

Porém, Rafael Massanga Savimbi, um dos herdeiros do fundador da UNITA, afirma que Savimbi foi um pai carinhoso e que amava bastante os seus filhos.

"Costumo sempre dizer que Jonas Savimbi foi um pai como outros pais são. Embora com um calendário bastante apertado, sempre tivemos momentos de partilha", recorda. "E foi um homem que esteve muito atento à educação dos seus filhos”.

Entre várias recordações, Rafael Massanga guarda consigo um relógio que o pai lhe ofereceu no Natal de 1995, "um sinal de tempo e de trabalho". Massanga diz que "outro grande presente é mesmo o facto de me ter dado esta oportunidade de ter uma formação sólida."

Dinho Chingunji, antigo militante da UNITA, confirma o carinho que Jonas Savimbi nutria pelos filhos. No entanto, ressalva um pormenor. Savimbi não tinha qualquer apreço para com os filhos dos seus antigos colaboradores, alguns dos quais chegaram mesmo a ser assassinados ainda crianças por ordens de Savimbi. "Não tenho dúvidas nenhumas de que ele era um pai carinhoso. Disso não tenho mesmo dúvida! Mas, aos filhos dos outros, sejam adultos ou crianças de dois, soubemos o que fez com eles."

Nascido em 1934, na província do Bié, Jonas Malheiro Savimbi morreu aos 68 anos. Se hoje fosse vivo, completaria 80 anos. Apesar das diversas opiniões sobre o histórico da UNITA, os analistas coincidem num ponto: Jonas Savimbi é um dos símbolos da luta de libertação nacional e será sempre uma figura histórica e incontornável no passivo de Angola.

DW Africa

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