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Quinta, 17 Outubro 2013 20:12

Rafael Marques: “A parceria estratégica consistia no saque de Angola”

Foi ele o jornalista que avançou com queixas-crime contra os generais e gestores da ITM Mining – entidade que extrai os diamantes na região angolana do Cuango. No livro ‘Diamantes de Sangue’, publicado em 2011, Rafael Marques (na fotografia) denunciou a corrupção que marca o negócio e acusou generais angolanos de crimes contra a Humanidade.

Tanto ele como a editora Bárbara Bulhosa, da ‘Tinta da China’, foram processados por difamação, mas o processo acabou por ser arquivado no início deste ano. Agora, na sequência da polémica entre Portugal e Angola, o jornalista afirmou à SÁBADO que o ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros “também ofendeu os angolanos” e que José Eduardo dos Santos “fala à toa”.

Esta terça-feira, dia 15, o presidente angolano, José Eduardo dos Santos, anunciou o fim da parceria estratégica com Portugal. A razão? O facto de vários elementos do governo angolano estarem a ser investigados pelo DCIAP (Departamento Central de Investigação e Acção Penal), entre os quais Manuel Vicente, o vice-presidente de Angola e Helder Vieira Dias "Kopelipa", que é ministro de Estado.

Ambos foram denunciados pelo ex-embaixador Adriano Parreira e isso motivou um pedido de informação do DCIAP à Procuradoria-Geral de Angola, em Outubro de 2012. Estes nomes foram revelados pela SÁBADO em Dezembro do mesmo ano. 

Estes casos levaram a que o ministro Rui Machete pedisse desculpa a Angola, numa entrevista dada à Rádio Nacional de Angola. Não foi suficiente: poucos dias depois, o presidente angolano pôs fim à “parceria estratégica entre Angola e Portugal”. Disse que “com Portugal, as coisas não estão bem”.

Para Rafael Marques, é com o governo angolano que as coisas estão realmente mal. Actualmente uma das vozes mais críticas do governo de José Eduardo dos Santos, principalmente através do site MakaAngola, o jornalista falou com a SÁBADO sobre toda esta polémica.

O que é que se fala em Angola sobre os processos colocados a governantes angolanos em Portugal?

Os angolanos esclarecidos acham os processos como oportunos e próprios de um Estado de direito e democrático. Também reconhecem que afectam profundamente os egos e a arrogância dos dirigentes angolanos que se julgam conquistadores de um país europeu.

Estes processos são do conhecimento geral?

São do conhecimento geral, na medida em que o acesso à informação, em todo o país, é bastante condicionado.Qual é a sua opinião sobre como é que esses processos vão decorrer na justiça portuguesa?

Sou assistente em alguns desses processos. Por dever de segredo de justiça, digo apenas que Portugal é um país democrático, com separação de poderes. Deixemos que a justiça faça o seu trabalho.

Qual é a informação que o governo angolano veicula sobre esses mesmos processos?

O governo de Angola é o presidente José Eduardo dos Santos, que não distingue um problema pessoal, causado pelas investigações que afectam a sua família e alguns fiéis seus, com políticas de estado.

Qual é a sua opinião sobre como é que esses processos vão decorrer na justiça portuguesa?

Sou assistente em alguns desses processos. Por dever de segredo de justiça, digo apenas que Portugal é um país democrático, com separação de poderes. Deixemos que a justiça faça o seu trabalho.

Qual é a informação que o governo angolano veicula sobre esses mesmos processos?

O governo de Angola é o presidente José Eduardo dos Santos, que não distingue um problema pessoal, causado pelas investigações que afectam a sua família e alguns fiéis seus, com políticas de estado.

O pedido de desculpas do ministro dos Negócios Estrangeiros Rui Machete foi visto de forma positiva ou negativa em Angola?

O pedido de desculpas de Rui Machete foi visto como um desastre a todos os níveis e uma grande humilhação para os portugueses. Criou mais confusão e expôs ainda mais o regime angolano. A teimosia de Passos Coelho em mantê-lo apenas agrava a confusão.

Acha que o ministro devia ter sido despedido?

Juntei à minha voz à dos portugueses de bom-senso que pediram a sua demissão. Fui solidário. Ele também ofendeu os angolanos. A relação entre os dois povos dispensa esse tipo de vassalagem bacoca. O oportunismo económico tem cegado dirigentes e empresários portugueses. Há mais ganho na solidariedade mútua entre os povos, do que na cumplicidade do saque com a cleptocracia do presidente Dos Santos.

As declarações de José Eduardo dos Santos, quando disse que "o clima político actual não aconselha à construção da parceria estratégica antes anunciada" são reflexo do pedido de desculpa do ministro português?

O presidente atacou Portugal para desviar a atenção da sua cada vez mais manifesta incapacidade de governar o país. Submeteu a Conta Geral do Estado de 2011, com um ano e quatro meses de atraso e sem relatórios de execução para mais de 70 % dos gastos do Orçamento Geral do Estado. Nem sequer conseguiu apresentar o relatório de execução da presidência e da maioria dos ministérios que dirige.

Como é que os portugueses são vistos por Angola?

Os angolanos, de um modo geral, nada têm contra os portugueses.

E em que medida é que o fim da relação estratégica entre Angola e Portugal pode prejudicar os países?

A parceria estratégica consistia no saque do país por grupos claramente identificados de portugueses e angolanos. Isso não vai acabar. O resto é um estrebuchar de um líder que se contradiz a si próprio e, às vezes, fala à toa.

Parece-lhe que Portugal está atento à realidade angolana?

O governo português tenta sempre escamotear a realidade angolana, o sofrimento do povo angolano, em nome dos interesses de Portugal. Isso é má política. O governo português não pode continuar a apostar na desgraça dos angolanos como um benefício para Portugal. Os povos entendem-se sempre melhor do que os políticos.

Revista Sábado

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