Por Octaviano Correia
E há os homens, os zungueiros que vendem de tudo. Até o inimaginável. Vendem na estrada. No meio da estrada. No meio do trânsito. Entre o caos caótico, passe a redundância, do trânsito luandense. Caos caótico do trânsito, disse? Será antes o engarrafamento caótico do trânsito. Vendem de tudo. Cintos. Correntes. Baralhos de cartas. Peças de automóveis. Telemóveis. Bolas de futebol. Roupas. Tecidos. Óculos. Chapéus. Bonés. E “saldos” para carregar telemóveis que é uma coisa que nenhum europeu consegue imaginar ou entender do que se trata.
E quando a fila de carros se move o zungueiro move-se. Se o trânsito flui um pouco mais o zungueiro corre. E corre quilómetros durante o dia. Todos os dias, que o zungueiro não tem folgas nem goza férias. Tem lugar marcado de sábado a sábado. Aos domingos. Aos feriados. Ao lado dos carros. Para lá, para cá. Fintando. Esquivando. Exibindo a mercadoria. Gritando o preço. Em kwanzas, está bem de ver. Depois deixa o produto no carro do cliente e corre em busca de outro comprador. E volta para receber o pagamento. Zungueiro nunca se engana no troco. Nunca engana quem compra. Nunca se esquece a quem vendeu.
É por tudo isto que Luanda é mais, muito mais do que musseque. Lixo. Bairro de lata. Desordem. Buracos. Rios secos quando a chuva tarda ou catadupas de água quando a chuva se zanga. Luanda é muito mais do que prédios. Cimento. Condomínios. Muito mais do que hotéis modernos ou restaurantes para todas as bolsas. Para bolsos cheios ou assim e assim. Isso é outra Luanda. Luanda é mil cheiros. Cheiro de mar. De terra e até o azul do céu parece baixar os seus odores. Luanda é muamba. Kitaba. Jinguba. Jaka. Bombó. Luanda é cheiro de manga. De maboque. Sabor de marisco, de peixe acabado de pescar. Luanda é ritmo. É musicalidade. Mil sonoridades. É semba, samba, rebita, kuduru. Luanda é cidade em movimento. É cidade vida mal o sol desponta até que a noite se fecha e pela noite dentro. Luanda não se explica. Vive-se.
JM