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Sexta, 12 Setembro 2014 11:10

Acerca da estabilidade - João Melo

Desde que os angolanos deram por terminada a guerra que os dividia pelo menos desde a independência do país, para não falar nos conflitos entre os movimentos de libertação durante a luta pela independência nacional, Angola tornou-se um incontestável exemplo de estabilidade no continente africano.

O autêntico rodopio de líderes africanos que têm ido a Luanda, sobretudo nos últimos tempos, em busca de conselhos para a estabilização das suas diferentes regiões comprova-o à saciedade, dispensando maiores comentários. O mesmo deve ser dito em relação ao reconhecimento do papel regional e continental de Angola feito pelos principais países do mundo e também pelas organizações multilaterais.

O mérito principal tem de ser assacado à política externa do atual Executivo angolano e à liderança do Presidente José Eduardo dos Santos. Na verdade, a política externa angolana é herdeira das melhores tradições da diplomacia do MPLA, caracterizada, mesmo nos períodos mais tensos da guerra fria, por um esforço de diversificação e independência de que a manutenção das petrolíferas americanas após a independência do país, em 1975, e sua proteção pelas tropas angolano-cubanas é um dos exemplos mais notáveis.

Quanto ao papel de José Eduardo dos Santos, a sua atitude em relação ao pós-27 de Maio, a abolição da pena de morte, os seus esforços para lograr uma solução «angolana» para a guerra civil e, last but not least, a benevolência que demonstrou em relação à direção político-militar da UNITA, em 2008, atesta que, mau grado os seus eventuais erros, ele nada tem a ver, em absoluto, com o epiteto de «ditador sanguinário», aplicado com justiça a outros líderes africanos, cada vez mais em desuso, felizmente.

Em rigor, a ação «pacificadora» regional que as autoridades angolanas e o Presidente José Eduardo dos Santos passaram a assumir abertamente de há uns tempos a esta parte, como componente essencial da política externa do país, corresponde exatamente à sua estratégia interna: trata-se, afinal, de priorizar a estabilidade político-militar, assim como a estabilidade social, entendidas como condições sine qua non para a reconstrução, o crescimento e o desenvolvimento económico-social de cada país africano, de cada região do continente e deste último como um todo.

Naturalmente, não há uma receita única para criar e manter a estabilidade em todos os casos. Por exemplo, se neste momento parece necessário, na República Centro Africana, constituir um governo inclusivo, onde estejam representados todos os partidos e todas as forças vivas da nação, o mesmo não se passa em outros países, onde o processo de pacificação está mais adiantado. É claramente o caso de Angola, onde esse tipo de governos não faz hoje qualquer sentido.

De facto, os acordos entre as principais forças políticas e sociais são imprescindíveis para criar e manter a estabilidade na sequência de períodos ou episódios de profunda convulsão social, de que os conflitos armados e as guerras civis são a expressão máxima, mas não esgotam aquele conceito e muito menos o conjunto de exigências necessárias para torná-la efetivamente sustentada e duradoura. Esta ressalva vale tanto para os partidos no poder (cujas responsabilidades aumentam) como para as diferentes oposições (que não se devem limitar a uma visão da estabilidade como uma simples «divisão do bolo», mediante acordos ou conchavos).

A estabilidade duradoura implica existência de leis, regras e normas assentes na confiança mútua entre os cidadãos e as instituições, a qual só pode ser construída na base de valores e crenças partilhados por todos. Doze anos depois do fim da guerra, Angola está nesse limiar. Voltarei ao tema na próxima crónica.

João Melo

Revista África21

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