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Sexta, 07 Mai 2021 11:34

"Deslocados da fome": milhares de angolanos estão a fugir para a Namíbia

A seca e as pragas de gafanhotos estão a agravar o problema da fome no sul de Angola. Várias ONGs da região renovaram hoje um grito de alerta e pedem a Luanda a declaração do estado de calamidade.

A fome provocada pela seca extrema na província de Cunene, no sul de Angola, está a levar milhares de pessoas a fugir para a Namíbia. O padre Pio Wakussanga, das ONGs Construindo Comunidades e Ame Naame Omunu, conta à TSF que esta região e algumas regiões vizinhas enfrentam enfrentam períodos quase interruptos de seca desde 2012.

"A estiagem provocou a rutura de stocks alimentares das comunidades e a rutura de sementes. Criou um grande fosso, um grande buraco, na segurança alimentar das comunidades do chamado semiárido de Angola", constituído por quatro províncias - Huíla, Namibe, Cunene, e Benguela, as mais atingidas pela falta de chuva.

Depois de um encontro no Lubango, nos últimos dias, várias ONG's angolanas lançaram hoje um apelo dirigido a Luanda e ao mundo, pedindo uma intervenção rápida e urgente na região. As várias ONGs pedem ao presidente angolano a declaração de "estado de calamidade" para que a ajuda internacional possa ser acionada.

"O nível de má nutrição subiu exponencialmente na região", lamenta o padre Jacinto Pio Wakussanga. Não há dados atualizados, mas quem anda no terreno vê muita gente malnutrida, incluindo muitas crianças.

Outro grande problema que está a "piorar o que já está muito mal": pragas de gafanhotos. Com a falta de alimentos e as alterações climáticas, os gafanhotos procuram pousar onde existe alimento verde, explica o sacerdote. "Onde houve possibilidade de cultivar alguma coisa, os gafanhotos estão a dar cabo" das culturas.

As dificuldades de subsistência estão a criar dois tipos de movimentos: um interno, os chamados "deslocados da fome" - pessoas que saem do interior para ir para as vilas e cidades "à procura de subsistência, para ver se conseguem alimentar-se", e outro movimento para o exterior, os "refugiados climáticos".

Em março, o número de refugiados angolanos na Namíbia rondava os sete mil, mas o balanço mais recente indica que pode ter subido para 10 ou 15 mil, aponta o padre Pio Wakussanga.

"Todos os dias há jovens, homens e mulheres, que estão a atravessar a fronteira e deixam para trás os que não podem andar, os idosos, o que torna a situação ainda mais dramática, infelizmente", lamenta.

A travessia é ilegal. Os angolanos que se vêm forçados a abandonar o país fazem-no pelos caminhos que já conhecem porque os usavam para fazer trocas comerciais com a Namíbia, uma vez que a fronteira não está completamente controlada.

"Com esta crise, aproveitam-se dos pontos que conhecem, fora do controlo das autoridades fronteiriças, para atravessar" a fronteira para o país vizinho, revela o padre Pio Wakussanga.

"A Namíbia tem um sistema social muito organizado", explica. "Organizou o chamado Direito à Alimentação Adequada", que prevê a distribuição de cabazes básicos para famílias vulneráveis, com proteção alimentar de pessoas em função de fatores como a idade, doença ou deficiência.

Nada disto existe em Angola. "Os angolanos aperceberam-se disto e estão a debandar-se, com esperança de sobreviver lá, do outro lado." TSF

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