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Quinta, 30 Janeiro 2020 10:31

Com que armas João Lourenço elimina focos de oposição no MPLA?

A tática: Destruir alicerces para que o resto caia sem fazer muito esforço. A arma: combate "implacável" à corrupção. Com astúcia, João Lourenço estaria a eliminar focos de oposição no MPLA, consolidando-se no poder.

A percepção de que o Presidente de Angola ainda não se firmou totalmente no MPLA, partido no poder, é generalizada. Supõe-se que persiste uma ala forte no partido que ainda é fiel ao ex-Presidente José Eduardo dos Santos.

Tal fidelidade representaria uma ameaça ao poder político de João Lourenço, particularmente para a conquista de um segundo mandato presidencial em 2022. Por isso há quem acredite que a mediatização das ações contra a corrupção visa acobertar as falhas governativas de João Lourenço e conquistar também mais popularidade.

O sociólogo Paulo Inglês é um dos que comunga desta teoria: "Em parte partilho porque o Presidente está à procura de uma certa legitimidade como líder político. E uma das suas promessas, de facto, foi a de combater a corrupção e ele precisa desse estandarte como uma espécie de trunfo político a partir do qual ele poderá depois capitalizar como bandeira nas próximas eleições."

Matar vários coelhos de uma cajadada só parece ser o propósito de João Lourenço com uma das principais bandeiras do seu Governo: o combate à corrupção.

Demolir a estrutura primeiro para o corpo cair sem muito esforço?

É que, com a demonstração de força contra o núcleo duro da ala resistente no MPLA, o Presidente estaria a fragilizar o "peixe miúdo", sem precisar de empreender esforços adicionais. Reduzir a família dos Santos a zero é uma estratégia de consolidação política de João Lourenço no MPLA?

Aslak Orre é especialista em governação e corrupção no CMI, Christian Michelsen Institute, um Instituto de Pesquisa da Noruega, entende que "pode ser que o objetivo seja reduzir-lhes a influência política a zero, mas resta saber o que isso implica em termos de redução da influência económica que a família dos Santos ainda mantém no país, em particular os investimentos de Isabel dos Santos nas telecomunicações, propriedades e vários outros setores. E deve haver muitos que querem se apropriar destes investimentos.

E o cientista político descarta qualquer preponderância do ex-Presidente: "Mas não acredito que JES ainda mantenha muita influência política."

Reduzir primeiro a influência económica do clã dos Santos

Portanto, reduzir a influência política deste grupo passa primeiro por reduzir a sua influência económica e financeira, o que já é facto no contexto da campanha contra a corrupção. Isabel dos Santos, a "herdeira política" de José Eduardo dos Santos e membro do MPLA, já viu parte dos seus bens arrestados em Angola e foi também pressionada a desfazer-se das suas participações internacionais no âmbito do "Luanda Leaks".

O especialista lembra que quando Isabel dos Santos "abriu a porta para a sua candidatura à Presidência de Angola, na semana passada numa entrevista, foi um sinal de que ela, e não o pai, constitui um desafio para João Lourenço a partir de agora.

Embora essa pareça a estratégia mais óbvia do Presidente angolano, há aspetos que são relativizados pelo cientista político na relação entre João Lourenço e os próximos de José Eduardo dos Santos.

Orre recorda que "esta elite dos Santos ainda está aí e é muito vasta e uma parte desta elite agora aliou-se ao João Lourenço, pertencem ao mesmo partido político, o MPLA".

Porquê do duplo critério de João Lourenço?

E é justamente o fato de haver aliados considerados intocáveis que faz determinadas correntes interrogarem-se se a campanha contra a corrupção de João Lourenço é genuína. Para além de que as mudanças estruturais necessárias para uma melhor governação nunca estiveram dentro do escopo do Presidente, alerta o sociólogo Paulo Inglês.

"Mas por outro lado, há muito erros que o Presidente comete a nível político porque o Presidente não pode combater as consequências de um mal sem ir para aquilo que permitiu que esse mal acontecesse. Portanto, há aí uma espécie de ambiguidade, duplo critério. Se o Presidente quisesse fazer reformas profundas isso iria implicar mexer na Constituição e no seu próprio poder, limitar o seu poder", avalia Inglês. DW Africa

 
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