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Quinta, 20 Janeiro 2022 13:56

O motor está a babar óleo - Graça Campos

O Executivo e o MPLA pretendiam ver rapidamente detidos e ou capturados, julgados e condenados a pesadas penas os autores de actos de violência que perturbaram Luanda no pretérito dia 10.

Tanto o primeiro secretário provincial do MPLA de Luanda, Bento Bento, quanto o Presidente da República, quase associaram explicitamente a UNITA aos violentos actos.

Numa mensagem à Nação, o Presidente sugeriu que a captura dos autores seria facilitada pelo facto de eles haverem deixado no "teatro das operações" impressões digitais indeléveis.

Pressionada pela necessidade de mostrar serviço, a Polícia deitou as mãos até em cidadãos que, muito possivelmente, estavam há milhares de quilómetros de distância quando a sede distrital do MPLA do Benfica ardia ou pneus de autocarros eram furados.

Muitos dos suspeitos presentes a julgamento evidenciavam sinais de violência, o que sugere que a Polícia usou de todos os meios e artimanhas para vinculá-los à violência, mas, sobretudo, ao seu mentor – de quem quer Bento Bento quanto João Lourenço já não parecem duvidar a identidade.

Mas, no respeito à lei, à sua consciência e em nome do povo – como eles sempre dizem – os juízes que conduziram os primeiros julgamentos dos pretensos vândalos produziram sentenças que contrariam muitas expectativas, sobretudo daqueles que garantiram que as impressões digitais deixadas pelo "inimigo" não se prestavam a mais dúvidas.

Até segunda-feira e no que foi um grande revés para o MPLA, dos 32 indivíduos que a Polícia apresentou como suspeitos da prática dos actos do dia 10, 11 foram absolvidos e 21 condenados a penas de 30 dias, todas elas convertidas em multa. Falta, agora, saber se os indivíduos absolvidos exigirão do Estado reparação pelos danos físicos e morais sofridos.

Mas como o azar é inimigo da solidão, ao revés sofrido em Luanda junta-se, agora, um outro, ocorrido em Benguela.

O Novo Jornal noticiou quarta-feira, que o Ministério Público junto do Serviço de Investigação Criminal (SIC) "colocou em liberdade os cinco indivíduos que se encontravam em prisão preventiva por suspeita do desvio de 30 toneladas de milho destinadas à Reserva Estratégica Alimentar do Estado, no bairro Damba Maria, em Benguela".

A decisão do Ministério Público é um balde de água gelada sobre aqueles que juravam não apenas ter a certeza sobre a quem pertencem as impressões digitais, mas também terem visto as próprias mãos dos autores do colossal desvio ocorrido em Benguela.

Há pouco mais de uma semana, as autoridades anunciaram que as primeiras 30 toneladas de milho comprado à Argentina para compor a Reserva Alimentar do Estado desapareceram sem deixar rasto.

Os camiões que carregavam o cereal desapareceram no trajecto entre o porto do Lobito e os armazéns do Grupo Leonor Carrinho, a empresa a quem o Estado confiou a gestão da sua reserva alimentar, ao abrigo de um contrato que rendeu à empresa benguelense acima de 200 milhões de dólares.

Aos 5 jornalistas que o entrevistaram no dia 6 de Janeiro, o Presidente da República deu da Leonor Carrinho a imagem de uma empresa modelo de organização e de disciplina.

São essas virtudes, aparentemente únicas, que fizeram da Leonor Carrinho o única, pelo menos até agora, beneficiária de parte da linha de crédito que o Governo angolano negociou com o Banco da Alemanha.

O roubo, até agora não explicado, das 30 toneladas de milho arranha, com muita severidade, a organização da empresa Leonor Carrinho, que o Presidente da República tanto gabou.

Não explicada publicamente, a "vox populi" atribui a inesperada demissão de Paulo de Almeida, do comando da Polícia, em parte ao fracasso da corporação em prender os verdadeiros autores dos actos do dia 10 de Janeiro.

Como, aparentemente, o conhecido "inimigo" não deixou no terreno "impressões digitais" visíveis, a expectativa agora é saber sobre quem recairá a mão pesada do Presidente da República por causa do embaraçoso "percalço" da Leonor Carrinho.

Somados, os casos de Luanda e de Benguela configuram verdadeiros reveses. O músico Cristo compararia a situação actual do Executivo com a do motor que baba óleo.

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