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Segunda, 14 Junho 2021 00:23

Os contentores de dinheiro e a figura de João Lourenço na estratégia do poder

Hoje, segunda-feira, 14 de Junho de 2021, às 10h00, terá lugar na 14ª Secção dos Crimes Comuns do Tribunal Provincial de Luanda (Benfica), a audiência de leitura de sentença do julgamento em que é réu Francisco Yoba Capita, sendo queixoso José Tchiwana, no quadro do processo nº 185/C1-2020.

O curioso no referido processo é que o queixoso, o coronel José Tchiwana, é o antigo director financeiro da UGP (Unidade da Guarda Presidencial), a mesma figura sinistra que se locupletou de 2 (dois) contentores de dólares que guardou na sua fazenda, conforme revelou Pedro Lussati ao SINSE (Serviço de Inteligência e Segurança do Estado). Os dois contentores faziam parte de um conjunto de dezenas da Casa de Segurança do Presidente da República. O coronel foi notificado pela PGR a 3 de Junho do ano em curso. Em consequência, procedeu à devolução dos contentores e foi expulso da Casa de Segurança sem ter sido constituído arguido.

As investigações que fiz no primeiro semestre de 2020 levaram-me a identificar toda uma região do País onde estão localizadas diversas fazendas que albergam diversos bens – incluindo contentores de dinheiro – subtraídos principalmente da Casa de Segurança. Caso a Procuradoria-Geral da República faça uma extensa, rigorosa e implacável investigação, descobrirá seguramente a existência de biliões escondidos em fazendas de coronéis e generais, em províncias como Luanda, Bengo e Kwanza Sul, para citar apenas alguns exemplos.

Um facto especialmente chocante é que a Presidência da República é o próprio epicentro do saque, da corrupção e da impunidade. A par da Casa de Segurança, a Casa Civil do Presidente da República está cheia de larápios e corruptos, sendo um deles o Chefe do Gabinete do Presidente do Presidente da República. Basicamente, em linguagem bélica, o próprio quartel-general do comandante superior da guerra declarada contra o saque, a corrupção e a impunidade está minado, incluindo a cadeira na qual ele se senta.

Os sucessivos escândalos de saque e corrupção não demonstram apenas que Angola tem sido governada por bandidos. Demonstram também que é ingenuidade esperar que o mesmo grupo que transformou Angola numa caricatura civilizacional seja o que vai realizar as reformas profundas de que o País precisa para ter futuro.

Os Angolanos e as Angolanas de todas as gerações precisam de entender de uma vez por todas que:

1 - O saque, a corrupção, o nepotismo, o tráfico de influências, a impunidade e outros males não são apenas crimes contra a economia – são crimes contra o Povo angolano;

2 - Ao MPLA interessa acima de tudo a manutenção do poder a todo o custo;

3 -João Lourenço não é o Reformador de Angola – é essencialmente a figura do grupo hegemónico ao serviço da estratégia de mudar tudo para que nada mude e, assim, garantir a manutenção no poder do MPLA nas próximas décadas;

4 - João Lourenço não precisa de fazer nenhuma mudança real para ser reconduzido – ele simplesmente só tem precisado de fingir que está a reformar Angola, ao passo que mantém intacta a mesma estrutura eleitoral que permite ao grupo hegemónico precisar dos eleitores, mas sem precisar deles. Ou seja, os cidadãos e cidadãs adultos apenas votam para que o mundo saiba que há eleições em Angola, mas a vontade expressa nas urnas não é a dos eleitores e eleitoras – é do MPLA.

Ademais, no quadro da revisão constitucional em curso, o partido do poder (não no poder, porque nunca houve alternância em Angola) é contra a proposta de haver um círculo eleitoral da diáspora, ou seja, mais do que votar, que Angolanos e Angolanas residentes no estrangeiro possam concorrer também às eleições legislativas e, por conseguinte, termos deputados e deputadas representando a diáspora.

Entrementes, o Ministério da Administração do Território não realiza o registo eleitoral oficioso desde o segundo semestre de 2017, quando a lei estabelece que o faça regularmente. Consequentemente, a CNE não sabe precisamente quantos eleitores tem Angola no presente momento. Mais do que isto, apesar das evidências contra, o regime mantém na presidência da CNE a figura tóxica chamada Manuel Pereira da Silva «Manico». Todas as anomalias em referências enquadram-se na estratégia geral da fraude eleitoral.

João Lourenço sabe de tudo isso e mais alguma coisa, mas não usa os seus poderes (de proporções imperiais) para que a lei seja cumprida escrupulosamente, situação semelhante ao quadro já conhecido em que apenas alguns são realmente punidos, ao passo que a maioria dos larápios continua à solta, muitos dos quais envolvidos em novos esquemas para tomar do dinheiro pública e realizar outras atrocidades.

Por Nuno Álvaro Dala

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