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Terça, 17 Abril 2018 18:48

CPJ "chocado" com decisões no julgamento de jornalistas angolanos

A continuação do julgamento dos jornalistas angolanos Rafael Marques e Mariano Bras à porta fechada é um "choque" e uma "surpresa", disse hoje à Lusa a coordenadora do programa para África do Comité para a Proteção dos Jornalistas, Angela Quintal.

A decisão de prosseguir o julgamento foi tomada na segunda-feira pela juíza Josina Ferreira Falcão, que também não viu "inconveniente" em ouvir o ex-procurador-geral, João Maria de Sousa - que acusa os jornalistas de crimes de injúria e ultraje ao órgão de soberania - fora do tribunal, nas instalações da Procuradoria-Geral da República (PGR).

"Ficámos muito surpreendidos, mas mais do que isso ficámos chocados, até porque o CPJ [Comité para a Proteção dos Jornalistas] desde o início considerou que nem o Rafael Marques nem o Mariano Brás deveriam ter sido julgados em primeiro lugar. Todo este caso tem sido na nossa opinião uma farsa de justiça", disse Angela Quintal à agência Lusa, acrescentando esperar que os jornalistas apelem da decisão.

Em causa está uma notícia de novembro de 2016, divulgada no portal de investigação jornalística Maka Angola, de Rafael Marques, com o título "Procurador-Geral da República envolvido em corrupção", que denunciava o negócio alegadamente ilícito realizado por João Maria de Sousa, envolvendo a aquisição de um terreno de três hectares em Porto Amboim, província angolana do Cuanza Sul, para construção de condomínio residencial.

A responsável do CPJ, uma organização de defesa da liberdade de imprensa sediada em Nova Iorque, admitiu que ficou "desapontada" quando, no início do ano, o novo procurador-geral, Hélder Pitta Grós, decidiu avançar com o caso contra os dois jornalistas.

"Esperava que as coisas mudassem" havendo um novo Presidente da República [João Lourenço] e um novo procurador-geral [Hélder Pitta Grós], considerou.

"Não nos parece que isto seja uma decisão tomada no interesse da justiça", lamentou, descrevendo a situação como "bizarra".

"Ver a juíza que preside ao tribunal decidir ter um julgamento à porta fechada no gabinete do procurador-geral, onde o anterior procurador-geral não pode ser questionado pela Defesa e o facto de tudo isto se passar à porta fechada é totalmente contrário aos interesses da justiça", criticou.

Para Angela Quintal, esta é uma "mensagem errada" face ao discurso do novo Presidente angolano, que prometeu combater a corrupção.

"Se assim é, porque é que os mesmos jornalistas que estão a expor a corrupção estão a ser julgados por fazer o seu trabalho e os que são acusados de corrupção recebem tratamento preferencial", questionou.

Na segunda-feira, Rafael Marques considerou "bizarra" a audição do ex-PGR angolano nas instalações da Procuradoria, classificando-a como "um ato de cobardia" da parte de João Maria de Sousa.

"Está confirmado nos autos e é bizarra uma audiência de julgamento na PGR. O Ministério Público é a instituição que promove a acusação e o julgamento será nesta mesma instituição que está a promover a acusação. Quer dizer, nós estamos a inovar em termos de matéria judicial, em termos de criatividade", ironizou.

Mas tudo isso, sublinhou, "tem o objetivo de impedir que as pessoas estejam presentes quando o general João Maria de Sousa fizer o seu depoimento. Mas é bizarro que a PGR se preste a este papel de servir de sede para uma audiência de julgamento. É ridículo".

"Como o ex-procurador teve tanta coragem de proceder com esta acusação, deveria ter tanta coragem de vir a tribunal. É um ato de cobardia agora pedir que o julgamento seja na PGR. É cobarde", disse, em declarações à imprensa, após o adiamento da sessão do julgamento, por ausência do ofendido.

João Maria de Sousa deve ser ouvido no próximo dia 24, nas instalações da Procuradoria, a requerimento dos seus advogados.

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