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Sexta, 20 Março 2020 13:35

Coronavírus, arma biológica? A ciência mostra que não

Ainda não se sabe ao certo exatamente como é que o novo coronavírus nasceu, mas os principais estudos de especialistas indicam que se originou por meio de uma mutação desenvolvida em morcegos, vendidos como alimentos em um mercado de Wuhan, na China.

Mas algumas pessoas, incluindo políticos estadunidenses e chineses, "juram de pé junto" que o patógeno é uma arma biológica criada em laboratório.

Nos Estados Unidos, uma parcela da opinião pública acredita que a China é quem produziu o vírus. O senador republicano Tom Cotton, do estado de Arkansas, tuitou no dia 30 de janeiro o seguinte: “Ainda não sabemos onde o coronavírus se originou. Pode ter sido em um mercado, em uma fazenda, em uma companhia de processamento de alimentos. Eu observaria que Wuhan possui o único super laboratório de nível quatro de biossegurança da China que trabalha com os patógenos mais mortais do mundo, incluindo, sim, o coronavírus.”

Em seguida, no dia 22 de fevereiro, foi a vez do cientista social Steve Mosher escrever um artigo no New York Post, intitulado "Não compre a história da China: o coronavírus pode ter vazado de um laboratório". Vale destacar que ele é autor do livro Bully of Asia: Why China’s ‘Dream’ Is the New Threat to World Order, que, resumidamente, trata a ascensão dos chineses como uma ameaça ao mundo — ou seja, ele é um pouco suspeito para dizer, afinal, como dá para notar, o escritor não vê a China com bons olhos.

E daí fica a pergunta: quais são as evidências ou provas dessas alegações? Bem, sim, Wuhan realmente possui um laboratório de nível de biossegurança quatro, onde ficam vários patógenos, incluindo o coronavírus e outros agentes potencialmente mais perigosos, como o Ebola, a febre de Lassa e os vírus de Marburg. A unidade serve justamente para estudar essas ameaças e, para se eleger como BSL-4, que é a sigla para esse tipo de instalação, a estrutura precisa ter sistemas de ventilação, paredes reforçadas, sistemas de segurança e construção apropriados para conter isso tudo.

Vale destacar que existem pelo menos seis prédios BSL-4 nos Estados Unidos e, segundo o site da Federação Americana de Cientistas, outros sete estão em pré-produção, em construção ou quase finalizados — e todos eles também abrigam os mesmo tipos de patógenos ou semelhantes. Ou seja, ter uma unidade dessa em seu país não significa, necessariamente, que você esteja criando armas biológicas, certo?

Teoria na China diz que estadunidenses “plantaram” arma biológica

Não bastassem essas especulações, alguns chineses acreditam que foram os Estados Unidos que levaram a “arma biológica” para a China. Zhao Lijian, porta-voz e vice-diretor geral do Departamento de Informação do Ministério das Relações Exteriores da China escreveu o seguinte, em uma série de três tweets no dia 12 de março:

“O diretor do Centro de Controle de Doenças (CDC, na sigla em inglês), Robert Redfield, admitiu que alguns americanos aparentemente mortos por gripe foram testados positivos para o novo coronavírus no diagnóstico póstumo, durante o Comitê de Supervisão da Câmara, na quarta-feira (11).”

“O CDC foi pego no flagra. Quando o paciente zero começou nos Estados Unidos? Quantas pessoas estão infectadas? Quais são os nomes dos hospitais? Pode ser o exército dos Estados Unidos que trouxe a epidemia para Wuhan. Seja transparente! Torne públicos seus dados! Vocês nos devem explicações!”

“Este artigo é muito importante para todos e cada um de nós. Por favor, leia e compartilhe. COVID-19: Mais evidências de que o vírus se originou nos Estados Unidos.”

Mais uma vez, faltam apenas… provas e evidências de que isso realmente tenha acontecido. Não há coisa alguma que indique o envolvimento de militares ianques no desenvolvimento do novo coronavírus. Para alimentar ainda mais essa teoria de arma biológica, o presidente Donald Trump passou a chamar a ameaça de “vírus chinês”:

Quando questionado por que ele estava usando esse rótulo em vez do nome científico real, Trump afirmou que foi em resposta à alegação de que os militares estadunidenses criaram o vírus, como dá para ver no vídeo abaixo:

Ou seja, toda essa teoria vem sendo sustentada até agora somente por… trocas de acusações, sem comprovação alguma.

Cientistas é que têm pistas plausíveis

Bem, enquanto China e Estados Unidos elaboram essa teoria maluca, os pesquisadores é que realmente têm coletado evidências para descobrir como o novo coronavírus nasceu. Eles têm realizado análises genéticas para descobrir a “árvore genealógica” do agente viral. Um relatório publicado no dia 26 de fevereiro no New England Journal of Medicine, assinado pelos cientistas David M. Morens e Peter Daszak, do Instituto Nacional de Saúde, e por Jeffery K. Taubenberger diz o seguinte:

“Certamente, os cientistas nos dizem que o novo coronavírus não escapou de um frasco: as sequências de RNA se assemelham às dos vírus que circulam silenciosamente nos morcegos, e as informações epidemiológicas implicam que um vírus de origem do morcego infecte espécies animais não identificadas vendidas em mercados de animais vivos da China.”

Vale lembrar que, de acordo com estudos, o primeiro vírus da SARS, que causou um preocupante surto entre 2002 e 2003, teve sua origem rastreada em morcegos e civetas (um mamífero africano). Os bichos transmitiram o patógeno para humanos e… bem, o resto você já sabe.

Mais evidências de origem natural do novo coronavírus

Uma recente pesquisa publicada na Nature Medicine também corrobora o desenvolvimento do novo coronavírus na natureza. O estudo foi realizado por Kristian G. Andersen, do Instituto de Pesquisa Scripps; Andrew Rambaut, da Universidade de Edimburgo; W. Ian Lipkin da Escola de Saúde Pública Mailman da Universidade de Columbia; Edward C. Holmes, da Universidade de Sydney; e Robert F. Garry, da Universidade de Tulane.

A equipe descreveu uma análise das seqüências genéticas que codificam os picos de proteína na superfície do novo coronavírus. O vírus parece uma maçã medieval com vários espinhos saindo de sua forma esférica — você provavelmente já deve ter visto uma ilustração sobre isso por aí e é justamente por isso que ele se chama “coronavírus”, devido ao formato de uma coroa. Essa estrutura permite ao patógeno se prender à célula que pretende invadir.

Esses componentes das proteínas são tão eficazes no direcionamento de receptores específicos nas células humanas que é difícil imaginar humanos fabricando-os, mesmo com a mais avançada tecnologia disponível atualmente. O levantamento concluiu que isso só pôde ser desenvolvido a partir de uma evolução natural ao longo de muito tempo.

Além disso, o grupo descobriu que a estrutura do novo coronavírus em geral é bem diferente do que os humanos provavelmente inventariam, pois, no caso da criação de uma arma viral, o autor teria começado a partir de algo popularmente capaz de causar doenças nas pessoas. Em vez disso, a estrutura do novo coronavírus é bastante semelhante à dos vírus conhecidos por infectar morcegos e pangolins. Tudo isso apoia a teoria de que o vírus pulou de morcegos para humanos por meio de algum hospedeiro animal intermediário. Uma outra possibilidade, menos provável, indica que o novo coronavírus estaria entre nós já há algum tempo e eventualmente teria evoluído até o problema atual.

E aí, de que lado você está?

Por Claudio Yuge | Forbes

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