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Terça, 13 Agosto 2019 23:14

Carta da academia para o ministério do Ensino Superior Ciência, Tecnologia e Inovação (MESCTI)

Prezada senhora ministra do Ensino superior e excelentíssimos secretários de estado e dirigentes do ministério. Queiram antes aceitar as mais cordiais saudações.

Escrevo como cidadão e como académico essa humilde carta para contestar alguns dos critérios que estão sendo levados em conta nos requisitos para bolsa externa.

O primeiro é a média de 16 valores para candidatar-se. Eu vou explicar porquê:

Na maioria das instituições de ensino onde impera o rigor académico no processo de ensino e aprendizagem, que passo a citar entre elas algumas unidades orgânicas da Universidade Agostinho Neto, Universidade Católica de Angola e outras instituições públicas e privadas, principalmente aquelas que tem maior número de docentes Angolano, ter média 16 é tanto difícil quanto quase impossível devido o rigor dos docentes ou mesmo a vida cara que alguns docentes impõem aos estudantes, sem falar da fraca qualidade dos estudantes a nível do ensino de base. Sei que a maioria dos dirigentes do MESCTI é docente e sabe do que me refiro, a média por disciplina depende dos desempenhos nas notas da 1ª e 2ª prova parcelar, que são somadas ao exame, e quando esse aluno não vai a recurso a média final da disciplina dificilmente é superior a 14 valores, na maioria dos casos quem acaba tendo nota 16 é aquele aluno que reprovou e teve acesso a um recurso e ou a um ou vários exames especiais e tem nota seca de tanta experiência em fazer a mesma prova. Me perdoem se estiver errado mais um aluno de recursos com média 16, nunca será melhor que um aluno de média 12 sem ter feito nenhum recurso.

O outro motivo para contestar esse requisito é que todos os Angolanos estão conscientes que estudantes das universidades onde os professores são maioritariamente expatriados, em especial professores de nacionalidade cubana, os alunos têm notas de médias superiores que estudantes de universidades onde a maioria dos professores são de nacionalidade Angolana, isso todos sabemos, que professores expatriados são muito mais propensos a atribuir notas acima de 15 que docentes angolanos e creio para comprovar meu argumento é só dentro do próprio ministério, fazer-se um estudo de correlação entre média final do estudante universitário e numero de docentes expatriados.

Meu último ponto em relação a esse assunto (média), é que o facto de ter média superior a 16 não significa que o estudante seja academicamente capaz ou mais inteligente, já que a academia tem nos provado que além da avaliação somática é necessário a avaliação classificativa, e a prova não prova nada.

Por isso proponho que se reveja a média de candidatura, talvez que seja de 14 em diante, para abrir essa oportunidade para mais jovens do nosso país. Proponho ainda que a média seja apenas um dos pré-requisitos, mas que todos os candidatos fossem avaliados também em termos de currículo para podermos avaliar aspectos de contribuição para a ciência, a investigação, para o ensino e para a vida profissional. Eu acho que candidatos que já leccionam no ensino superior ou médio deviam ter prioridade em relação a outros candidatos, candidatos que publicaram artigos científicos, participaram e apresentaram trabalhos em eventos científicos ao longo da graduação deviam ter prioridades em relação a outros, creio que devíamos pensar em critérios mais passiveis de meritocracia, do que apenas a média final de 16 valores.

Um outro assunto de contestação é a formação nas especialidades médicas. Vou explicar porquê:

Fiquei completamente confusos, e perdido nesse item, não consegui entender se esse requisito faz menção a exclusividade na formação para médicos ou também para outros profissionais de saúde, já que a medicina está entre as ciências de saúde e as ciências médicas são apenas para os sub-ramos da medicina. Formar médicos especialistas, mestres e doutores é de extrema importância, mas num país como o nosso, destinar dinheiro público apenas para a formação do médico em detrimento de outros profissionais de saúde é desfasar o sistema de saúde, contribuir para a péssima qualidade do sistema nacional se saúde e criar guerras profissionais como as que já vem acontecendo aos poucos em todo o país, aliás a muito tempo que se tem feito uma exclusão das outras carreiras de saúde em privilegio da primazia na formação apenas de médicos e isso matará o nosso sistema de saúde. Sabemos todos que para que um bom médico faça seu trabalho com qualidade ele tem que contar com uma equipa de saúde profissionalmente capacitada, revestida de conhecimento técnico cientifico para dar cobro ao diagnostico, tratamento, cuidados, medidas preventivas, curativas e de reabilitação do paciente, investir no médico sem investir em outros profissionais é matar a qualidade de assistência em saúde, é só olhar a qualidade dos profissionais de saúde que tem sido formados na maiorias das instituições de ensino superior, para prevermos o que será do nosso sistema de saúde no futuro, se uma escola não está capacitada para formar médicos, ela não está também capacitada para formar outros profissionais de saúde.

Assim como precisamos de médicos especialistas, mestres e doutores, precisamos também de psicólogos, enfermeiros, farmacêuticos, odontologistas, profissionais de análises clínicas, fisioterapeutas, nutricionistas e muitos outros profissionais de saúde, especialistas, mestres e doutores, o país só vai progredir se todos caminharmos juntos, e os hospitais não funcionam só com médicos. Se o termo ciências médicas é uma referência englobando as ciências de saúde, proponho que seja mudado e se descreva as áreas como estão descritas as outras áreas de investimento, ex: especialidades médicas, de enfermagem, de diagnóstico e terapêutica, etc.

Se as especialidades médicas não englobam outras ciências de saúde, proponho que se incorporem as outras ciências de saúde para que se observe senso de justiça, equidade e oportunidades iguais entre os candidatos que queiram se especializar nos diferentes ramos da saúde.

A minha última contestação está nas formas de pagamentos das bolsas. Vou explicar porquê:

Mas antes gostaria de parabenizar a nova direcção do nosso ministério do Ensino Superior Ciência, Tecnologia e Inovação (MESCTI) pelo excelente trabalhos que tem vindo a desenvolver em prol do pagamento das bolsas dos estudantes no estrangeiro, recebi informações de diferentes estudantes em diferentes países e todos alegam que os pagamentos de bolsas tem sido feitos entre 28 de um mês e 5 e outros, de forma eficiente e sem atrasos, essa noticia é sinal de que o país quer andar e aos poucos as pessoas certas tem sido chamadas a fazer a coisa certa, por uma Angola melhor para todos, onde a meritocracia é a melhor aposta.

Mas ainda assim contesto porque acredito que seja necessário reformular o modelo existente, já que muitos dos antigos responsáveis pelo pagamento de bolsas se mantém no poder e são os que tem vindo a ser denominados socialmente por marimbondos, ou sejas, os saqueadores dos bens públicos e inimigos da boa imagem do país no estrangeiro, em qualquer momento, as má práticas podem voltar a tona e os danos a formação do homem novo serão visíveis.

O modelo até hoje usado para fazer chegar as bolsas aos estudantes é fracassado, corrupto e externamente promotor da não formação do estudante. As bolsas levam entre 3 a 6 meses para serem pagas ao estudante levando muitos estudantes a desistirem dos cursos e conhecemos até história de pessoas que tiveram que se prostituir no estrangeiro para poderem comer, história de estudantes despejados das casas onde viviam e muitas outras histórias. Precisamos acreditar que desta vez a situação será diferente e que os estudantes terão condição de se dedicar única e exclusivamente na formação, assim como termos certeza que esses estudantes serão supervisionados e os que brincarem com o nosso dinheiro sejam obrigados a voltar e pagar pelo que gastaram. Eu tive a experiência de ser estudante do INAGBE e foi uma das piores vivências que tive, as bolsas não eram pagas por mais de 6 meses, por último foi graças ao governo do país de formação que me concedeu a bolsa para que pudesse concluir os estudos, mas tarde descobri que o governo Angolano depositava regularmente os valores para pagamento dos estudantes, o que tem acontecia é que os responsáveis pelo repasse dos pagamentos da bolsa no país em que o estudante se encontrava retinham os valores depositados pelo governo para o pagamentos das bolsas por mais de 3 meses, um amigo que trabalhava em um banco no estrangeiro uma vez me explicou o que realmente acontece e vou tentar resumir... Esse senhores retém o valor das bolsas dos estudantes e colocam esse dinheiro em uma conta poupança ou a prazo conforme a linguagem bancária que fornece rendimentos mensais em 3 meses, esse lucros são de 5% adiante. Imaginemos que 300 estudantes façam mestrado em um país e recebam 1.500 dólares por mês de bolsa, o valor pago para as bolsas seria de 450.000 dólares, retido em um conta bancária renderia a prazo rendendo apenas 5% daria de lucro 22.500 dólares mensais, imaginemos que os estudantes ficassem sem bolsa por 3 meses, estaríamos a falar em cerca de 67.500 dólares. Precisamos criar mecanismos para acabar com essas práticas, esses males que enfermam nosso país, mancha nossa imagem no estrangeiro, e acaba com o sonho de nossos jovens que vão para se formar no estrangeiro e voltam de lá frustrados por não ter conseguido concluir os estudos, ou não voltam porque enveredaram para outras práticas.

Prezados dirigentes e leitores, essas são opiniões únicas e exclusivas de um Angolano exercendo apenas sua liberdade de expressão, de ouvir e ser ouvido, sem cores partidárias e sem opinião política, os contextos descritos nessa carta são meramente académicas e sociais.
Obrigado

Por: Euclides Sacomboio (Ph.D em Ciências de Saúde)

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