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Quinta, 29 Novembro 2018 11:05

Marimbondo e matrindinde, mas cuidado com o kissonde

A locução “ninho de marimbondo”, usada, desde sempre, entre nós, para mencionarmos algo de muito mau,  proferida pelo Presidente João Lourenço, em Lisboa, como exemplo de corrupção no nosso país, ecoou pelo mundo.

Por Luciano Rocha

A oportunidade de uma frase tem muitas vezes este condão. Não tenho dúvidas, por isso, de que em vários países, mesmo naqueles onde a Língua Portuguesa não passa de emaranhado de palavras estranhas, sem sentido, passa a ser dita em vez de corrupção. Que não é exclusividade nossa, como se sabe, grassa por esse mundo, a todos os níveis que envolvem dinheiro, ganância, desonestidade.

Mais, pela palavra “marimbondo”, vulgar entre nós, que se tornou mágica por uma intervenção do Chefe de Estado no estrangeiro, muitos dos que lá fora, por motivos muitas vezes inconfessos e tentando esconder os ninhos de vespas dos seus próprios países, ficaram sem tema para calúnias. E a saber que, nesta parcela africana, os cultores da corrupção, bem como de todos os males que a sustentam, como peculato, nepotismo, roubo, em suma, os saqueadores de uma Pátria que continua em construção, não têm a vida facilitada. Por serem  egoístas, insensíveis à dor alheia, tal como aquele insecto, nas picadas que distribuiu a bel-prazer e que a única coisa que produz é um mel aguado que não beneficia ninguém.

Ele é tão mau que, Ernesto Lara Filho, com o humor mordaz que lhe era peculiar e a vontade permanente de provocar que também o caracterizava, escreveu, num poema curto, uma linha  elucidativa: “picada de marimbondo/ foi branco quem inventou”.

O poeta, que foi, igualmente, dos maiores cronistas deste país, ao contrário do que alguns possam pensar, insinuar, acusar, tinha defeitos, como qualquer ser humano, mas jamais foi estúpido, pelo que, como é evidente, nunca racista. O poema foi escrito já depois de iniciada a Luta Armada de Libertação Nacional. Com combatentes de epidermes de todos os tons, alguns dos quais companheiros de sonhos dele, até parentes. Ernesto Lara Filho, ao escrever, referiu-se ao ocupante, ao colono, acima de tudo aos colonialistas, maioritariamente brancos. Que representavam o instrumento de opressão de um povo. Talvez houvesse também uma nesga de provocação, porventura para dizer de que lado estava.

O marimbondo, para os angolanos, sempre foi sinónimo do que era mau, a abater. Mas havia, e há, outros bichos que dispensamos bem e que devem merecer a nossa atenção, como alertou Osvaldo Gonçalves, numa crónica publicada no nosso jornal de terça-feira, cuja leitura sugiro.

Aquele meu camarada lembra que, além dos marimbondos, há os matrindindes, que “parecem inofensivos, bonacheirões e até cantam bem - e como cantam! - mas, a seguir às chuvas grandes de Março e Maio, na região litoral do país e no deserto do Namibe, invadem as colheitas e em princípio de Junho  já pouco resta para colher”. Aqueles bonitos passarinhos, de várias cores, recorda igualmente o cronista, têm tal apetite que lutam entre si, até chegam a matar-se, pela paparoca e quando falta comem-se uns aos outros.

Com o devido respeito pelas opiniões de João Lourenço, o mais alto Magistrado da Nação, e do meu camarada Osvaldo Gonçalves, com as quais estou de acordo, permito-me acrescentar mais um inimigo, que urge exterminar: o kissonde. Anda em grupo de milhões, com o rei e a rainha à frente, a comandarem, cobrindo os caminhos de vermelho, que é a cor deles. Apenas se separam estrategicamente para atacar as vítimas quando as pressentem. Vê-los, diz o povo, dá azar e atacá-los é procurar desgraças. Se entram em casa, é melhor fugir. A única forma de impedir esta visita indesejada é fazer à volta da habitação um risco de cal ou cinza. O problema é que os malvados já estão dentro da nossa casa comum, esta Angola que desejamos asseada. Fazemos, então como?

Damo-nos as mãos uma vez mais. 

JA

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